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A música conecta

90’S – “O foco era fazer as pessoas dançarem, sem rótulos”

Por Alan Medeiros em 90's 02.02.2016

Só é possível estabelecer uma carreira com dois dígitos de história através de muita dedicação e respeito pela arte. Marcio S é artista da D AGENCY e residente da noite Mothership, mas sua história na música eletrônica não se resume a isso. Ele não só viu de dentro o crescimento da dance music em São Paulo, como foi parte desse movimento. Além disso, estabeleceu projetos fora do eixo, trabalhando junto a uma produtora de eventos em Manaus. Discotecando house e techno, teve o privilégio de dividir a cabine com grandes nomes da música eletrônica mundial, entre eles Sharam, Dubfire, Jaime Jones, Guy Gerber, Robert Babicz e Solomun. Porém, o começo não foi tão cheio de glamour assim. O que você lerá abaixo é um depoimento emocionado e cheio de relatos históricos importantes de uma época em que status e hypes não se criavam, as pessoas queriam apenas dançar.

Com a palavra, Marcio S:

Comecei a sair em 1989 com meus primos Ricardo Marinho, Egbert e Junior, indo aos bailes de garagem. Eles já estava bem a frente no som, comprando discos e saindo para dançar e assistir os DJs. Minha primeira matinê foi na Over Night em 1990, clube situado na Moóca, Zona Leste de São Paulo, foi um marco para todos da minha geração. Batia cartão das 14h as 18h nos Domingos. O ônibus saía com uns 30 moleques e meninas das vilas próximas rumo a festa.

Posteriormente em 1992 fui para Toco Dance Club. Tomei um susto com a concentração da galera numa praça em frente ao club, e depois lá dentro com o soundsystem poderoso e 3000 pessoas dançando. No mesmo ano um amigo e hoje meu cunhado – Clayton – me falou de um club na Penha que tinha uma galera meio doida e rolava um som até então chamado underground, era a Sound Factory. Foi o primeiro lugar que vi uma Drag Queen e todos numa sintonia incrível. Tinha a hora da abertura que era de arrepiar e foi meu primeiro porre de bombeirinho [risos] e onde tive o prazer de ver de perto Julião, Marky e Grace Kelly Dum. Em 1993/94, eu batia cartão no Arena Music Hall em Interlagos. Longe, mas eu não estava nem aí. Ia de ônibus e muitas vezes sozinho. DJ Tibor era o residente tocava várias coisas fodas. Lá vi o Patife e DJ Acácio Moura pela primeira vez tocando. Ainda em 1994, Twists em São Caetano do Sul. Ricardo Quedes, residente, e Michel Noia sempre davam uma aula de boas músicas e mixagens. Em 1995 meu primeiro After Hour. Foi no lendário Hell’s Club, com o TON e o James, marcante. Mau Mau sempre tocando muito e lá pude ver vários DJs que admiro até hoje, entre eles Paula Chalup e Erik Caramelo. Entre 92 e 96 Frequentei vários clubs de black music também (Sunset, Club Da Cidade e Projeto Radial). Essa foi minha formação na adolescência na musica: hip house, rap, balanço, funky, house, hardcore techno, techno, jungle.

Tive o privilégio de ver vários dos DJs que movimentavam a cena paulistana. Tanto os mais novos na época – Marky, Julião, Grace K. Dum, DJ ANDY -, como os já em ascensão – Mau Mau, Renato Lopes, Luiz Pareto, Ricardo Guedes e Badinha.

Em 1992 no colégio conheci alguns amigos que já faziam as festas de garagem (muito fortes na época) e também os que participavam de equipes de som. Me aproximei e fui adotado pelos caras – James Anderson, Fernando e Flávio Paravamo e Marcelo Tubarão – pois tinha 14 anos. Me ensinaram tudo, desde soldar cabos até carregar caixas de som. Por diversas vezes só me deixavam tocar uma música por baile. Era um teste, com eles comecei a frequentar as lojas na Galeria 24 de Maio (Centro de SP), era office boy, passava lá pelo menos quatro vezes ao dia. No início só disco pirata. Na DJ Shopping na Paulista, eu comprava umas bolachas com o Batatinha, onde eu e o James compramos nosso primeiro par de Technics SL MK 1200 II em 10 cheques se não me engano [risos]. Depois fui pegando confiança dos vendedores – em especial do Ton Updance – para conseguir discos bons. Ele me dava várias dicas dos discos bons, raramente vinha um caroço [risos]. Gastava boa parte do salário em vinil naquela época.

Separei pra vocês alguns discos que me marcaram:
The Creator – Let There Be House – ZYX Music 1993
Lee Marrow – Pain – Discomagic Records 1989
Nomad Featuring MC Mikee Freedom – (I Wanna Give You) Devotion – ZYX Records – 1990
808 State / UB40 – One In Ten – ZTT – 1992
Altern 8 – E*Vapor*8 / Armageddon – Network Records – 1992
The Prodigy – Fire • Jericho – XL Recordings – 1992
Plus Staples – We Got 2 Be – ZYX Music 1993

Fiz quermesse, casamentos, baile de 15 anos, formatura, festa na escola, e toquei em alguns outro lugares também: Clubs de bairro, S.O.S (Vl. Das Mercês – 1992), Nine Club (Cursino – 1993), Structure Bar (Bexiga – 1993), 7000 Dance Club (Jabaquara – 1995), Studio 8 (Diadema – 1996) e Highlander (Praça da Árvore – 1996). Não me arrependo de ter passado por isso, discotecagem livre, o foco era fazer as pessoas dançarem, sem rótulos, do mais pop ao underground.

Depois desse laboratório de Clubs pequenos e eventos diversos, em 1998 após entregar uma fita cassete para o promoter – meu primo Ricardo Marinho – da Over Night, recebi uma ligação dizendo que tocaria numa noite chamada GROOVE CONNECTION. Quase não acreditei [risos]. Primeiro cachê profissional no club que frequentei durante vários anos. Não dormi durante uma semana [risos] e ainda mais sendo headliner, tocando entre Grace K. Dum e DJ Andy. Tremedeira forte na primeira mixagem, mas foi uma experiência incrível, vários amigos lojistas foram, fora a metade da minha vila [risos].

A partir daí coloquei na cabeça que poderia, viver e ou sobreviver de música. Fui ajudado por muita gente, seja na indicação de uma gig, crew de gravadora, promoters, DJs, brands, amigos com contatos e as vezes aquela sorte de ter alguém da noite na hora do seu set que te convida pra outras noites, mas principalmente por meus familiares por sempre me apoiarem, em especial meus pais Geraldo e Ignes que me ajudaram a comparar meu primeiro toca-disco CCE (fogãozinho).

A música conecta as pessoas! 

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