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A música conecta

Papo de Estúdio | Marcelo Oriano desvenda segredos da Mixdown

Por Marcelo Oriano

O processo de mixdown é algo muito pessoal. Existem diversas técnicas e linhas estéticas que variam não apenas de produtor para produtor, mas também conforme o estilo musical em que se está trabalhando. Mesmo com tantas possibilidades, algumas diretrizes costumam ser comuns à maioria dos profissionais e muitos deles assumem seguir “receitas” pessoais, repetindo e aprimorando sua principal linha de trabalho a cada serviço. Hoje pretendo compartilhar essa parte “fixa” da minha metodologia de trabalho com vocês.

Objetivos da Mixdown

A mixdown bem feita deve buscar os três balanços:

— Balanço entre volumes: O quão baixo ou alto cada elemento deve soar na mistura.

— Balanço entre frequências: Onde cada elemento “senta” no espectro de frequências audíveis.

— Balanço de espaço: envolve panorama e profundidade, veja abaixo.

Panorama

M/S: Se um elemento soa mais ao centro ou mais às laterais da imagem estéreo;

R/L: Se um elemento soa mais à direita ou a esquerda da imagem estéreo;

Profundidade 

Se um elemento soa mais ao fundo ou mais à frente da mix.

Objetivos secundários 

— Coloração (saturators, overdrive, bitcrushers, etc.)

— Calor (pré-amps, tape emulators, etc.)

— “Punch” (compressor, EQ, transient designer)

— Movimento (autopan, flanger, phaser, chorus, automações, etc…)

— Espacialidade (chorus, reverb, echo, delay, etc…)

— “Cola” (compressor, reverbs, tape emulator, etc…)

— Definição (EQ, compressor, saturator, etc…)

Dicas fundamentais:

— Mixar em volume de conversação: eleve o volume de seus monitores até o ponto limite em que você poderia falar com alguém na sala sem precisar gritar. Se puder medir com um decibelímetro, mixe entre 82 e 85dB SPL. Mixar no volume correto é importante pois, se trabalhares em volume muito baixo podes acabar elevando demais o volume das ambiências e detalhes. Por outro lado, caso mixe em volume muito alto podes ser induzido a errar no volume dos elementos principais!

— Saiba a hora de parar: Costumo dizer que mix não se termina, se desiste! Evite o infame overmix!

— Use o som certo na composição: Em estúdios de música orgânica temos um ditado que diz: “1 minuto a mais de gravação significa 10 minutos a menos de mixagem”. Evite o velho pensamento: “Ah! Isso eu arrumo na mix”: Corrija o que puder ainda na síntese ou no uso do sample correto.

— Balancear os volumes de entrada e saída dos efeitos:  Muitos efeitos como saturadores, distorções, e obviamente equalização de ganho; aumentam o volume do canal como um todo. Nosso ouvido tende a achar que mais alto = melhor, de maneira que só podemos ter noção se uma saturação ou equalização REALMENTE melhorou um timbre, quando ouvimos o antes e depois no MESMO volume (repare que a maioria dos plugins tem um knob de “output gain”, use-o!).

— Tome grandes decisões de EQ em mono: Sempre que fizer um boost ou corte superior a 3dB, faça-o com o projeto em mono

— Preparar a track para o elemento principal: Se tudo brilha, então nada brilha! Contraste é fundamental para uma mix destacar os elementos mais impactantes (vocais e leads, por exemplo).

Regras que não são tão regras

Como eu sempre digo: não existem regras em áudio e a inovação deve ser encorajada mas, pela minha experiência, alguns velhos costumes devem ser observados.

— Manter o low end em mono: As ondas graves são mais longas e lentas, facilitando o acontecimento de problemas de fase. Mantendo-as em mono você garante um grave “sólido”, centrado e evita cancelamentos de fase não apenas na mix, mas também na reprodução da sua música em sistemas de som com mais de um subwoofer.

— Mixar em estéreo pensando em mono (mono compatibilidade): Sua música muitas vezes será reproduzida em sistemas mono. É de suma importância que nenhum elemento “suma” ao somar L e R.

— Limpar o grave de tudo o que não for Kick e Bass: Essa “regra” é polêmica, mas a grande maioria dos artistas que converso a respeito sabe que estes dois elementos são os mais importantes da música eletrônica e que, portanto, precisam de “espaço” sem competição para terem potência e definição. 

Além disso, muitos samples que estão a venda na internet são carregados com sub-harmônicos para soarem mais “corpulentos” quando ouvidos individualmente, porém podem perfeitamente ser filtrados ao tocar com o conjunto completo de canais de uma música sem prejudicar sua qualidade. 

DICA 1 | Use filtros com slopes suaves (no max 36dB/oct) ou lowshelf (Soam mais musicais)

DICA 2 | Experimente utilizar equalizadores que emulam equipamentos analógicos famosos: Já que filtrar é uma coisa simples de fazer sem ajuda de visualização gráfica, porque não aproveitar e já colocar uma “cor” na sua mix?

DICA 3 | Não sabe até onde levar o filtro? Faça o seguinte: feche os olhos e vá subindo o cuttoff até sentir que o elemento está perdendo algo. Nesse ponto pare e volte um pouquinho!

Já nos elementos em que você realmente precisa do sub (kick e bass, por exemplo) coloque o filtro em 30Hz.

— Elementos mais graves no centro da mix e mais agudos aos “sides”: Como eu já falei: não é uma regra, mas essa forma de organizar têm se demonstrado mais agradável ao ouvinte na maioria dos casos.

— Quanto mais elementos num bus/grupo, mais sutis devem ser os efeitos: Pela minha experiência isso mantém o conjunto mais musical e “limpo”.

— Descanse os ouvidos: Sempre que possível dê um intervalo de pelo menos 1 dia entre a produção e a mixdown, a fim de começar com os ouvidos “limpos”. Muitas vezes nosso cérebro nos engana que um elemento está claro e presente na mix simplesmente porque nosso inconsciente sabe como ele deveria soar. Se a mix for de muitos canais, faça intervalos também!

— Faça o “teste do carro”: Escute sua mix em diversos soundsystem diferentes, em especial carros e fones simples de iPod. Sua música obviamente não vai ser reproduzida sempre em monitores e sistemas hi-fi. É importante que ela tenha nitidez e equilíbrio mesmo em caixas simples.

+++  Ágatha Prado indica 5 sintetizadores digitais para quem está começando no mundo dos DAW

Começando a Mixdown

Primeiro passo | Sempre recomendo passar tudo para áudio. Além de economizar muita CPU para dezenas de plugins que serão carregados, o ato faz com que você mude de mindset, saindo da estágio de criação e indo para um de finalização. Com todas as pistas em áudio você não cai na tentação de mudar algo em um sintetizador ou testar um novo sample de pratos, por exemplo.

A maioria das DAWS permite renderizar o projeto pista-a-pista.  Use no mínimo a resolução de 44.1kHZ, 24bits, SEM DITHER. Se você for mixar o projeto de alguém, peça para a pessoa não normalizar os volumes, a fim de manter mais-ou-menos a proporção que ela havia imaginado entre os canais.

Segundo passo | Preparar a chain do masterbus: cada engenheiro tem suas preferências, mas eu gosto de mixar com apenas 2 ou 3 plugins no master: 

— Um emulador do SSL4000 Masterbus Comp (Waves SSL Comp ou Cytomic the Glue)

— Threshold = -8

— Ratio = 4

— Attack = 3

— Release = A (auto)

— Makeup =3

— Um emulador da distorção harmônica da mesa analógica SSL4000G (Slate Virtual Mixbus) 

— Drive = 6

— Em alguns casos coloco também um emulador de gravador de fita (Waves J37 ou Slate VTM).

— Valores conforme o estilo da track

Obs.: Mixar sem nada no master também é perfeitamente aceitável.

Terceiro passo | A grande maioria dos produtores obtêm resultados melhores quando começam pelo Kick, seguem para o bass e demais elementos de subgrave, então fazem toda a bateria e depois seguem pros demais canais em ordem de importância na música (vocal, lead, harmonia, ambiência e FX’s, respectivamente  na maioria dos casos).

Por que essa ordem? A vantagem de mixar por ordem de importância é que você naturalmente fará a mudança de posição no estéreo ou “limpeza” em frequências que estejam conflitantes no elemento menos importante. Dessa maneira manterá mais íntegro, brilhante e bem posicionado aquilo que tem que se destacar na mix.

Quarto passo | Em mix digital eu sempre sugiro após carregar o áudio em todas as pistas: baixar o volume de todos os canais juntos até o kick tocar em -10dBFS e então começar.

Por que partir de kick a -10dB? Além de garantir que vai ter headroom (espaço pro volume subir sem clipar) até o final da mix, geralmente a mix acaba fechando “sozinha” próxima de -6dBFS, que é o volume que a maioria dos engenheiros de master pede!

ISSO NÃO É UMA REGRA, mas muitas vezes um bom sinal de balanço saudável entre as frequências e volumes de uma track de techno ou house é o master = -6dBFS com Kick = -10dBFS na parte cheia da música.

Quinto passo | Coloquei o Kick em -10dB e agora? Alguns artistas e engenheiros gostam de fazer a mix desde o começo com todos os canais ligados. Eu prefiro desligar todos e ir ligando um a um na ordem mencionada no passo três. Dessa maneira vou achando o volume ideal, a equalização e posição de cada elemento sempre em função do seu predecessor. 

Sexto passo | Para cada canal que eu vou ligando faço o seguinte processo:

Timbragem: primeiro arrumo o timbre pra ficar perfeito. Pode ser uma saturação, distorção, equalização ESTÉTICA (mais agudo ou menos grave, por exemplo), compressão estética (mais punch, por exemplo), etc…

Limpeza: em seguida eu limpo as frequências desnecessárias ou que estejam conflitando com canais ligados anteriormente.

DICA: Use equalizador linear nos elementos mais graves, pois os filtros causam phase-shifting e isso pode ser especialmente prejudicial em kicks e bass.

DICA 2: Use analisadores de espectro sempre pra ter uma noção visual das frequências e comportamento do seu áudio, mas vá criando o hábito de CONFIAR NOS SEUS OUVIDOS e não em seu olho.

Obs.: Nada te impede de voltar e fazer ajustes também em canais que já foram ligados! Em caso de conflitos de “frequency masking”, muitas vezes coloco um EQ em ambos os canais e faço equalização “Ying Yang” ou saturo áreas diferentes de ambos os elementos.

Estéreo: Após a limpeza eu determino a largura e a posição do elemento no estéreo, sempre verificando com algum plugin sua correlação (se tem cancelamento de fase). Alguns engenheiros mixam primeiro todos os canais em mono e deixam essa etapa para o final. Muitas vezes neste ponto eu, além de simplesmente “alargar” ou dar panning num canal, posso lhe conferir movimento com plugins como: autopan, flanger, chorus ou phaser.
DICA: Deixa um plugin que passa o som para mono no canal master e crie um “hotkey” pra ativa-lo e desativá-lo a todo momento.

Reverb/Delay: Se o canal não tiver vindo da pré-mix com reverb ou delay, e eu sentir durante a mix que ele PRECISA, deixo esses 2 efeitos pro final da chain.

Sétimo passo | Após mixar todos os canais eu faço alguns grupos (ou bus, dependendo da sua DAW) e trabalho alguns processamentos de conjuntos, como por exemplo:

— Gosto especialmente de fazer o Pultec Trick no conjunto Kick+bass (vide meu canal no YouTube) e algumas vezes tenho resultados melhores usando um tape emulator com rotação lenta.

— Faço compressão paralela no grupo de bateria pra fazer ela saltar

— Uso um saturator comum pro conjunto de synths

— Uso um reverb comum com pre-delay alto pra todas as ambiencias e FX

Use seus ouvidos e seja criativo.

Oitavo passo | Coloco emulador de mesa analógica em todos os canais (Waves NLS ou Slate Virtual Mix Channel). Para economizar CPU eu deixo esta etapa para o final, mas se você confia na sua máquina já pode começar a mix com os plugins em todos os canais. Para saber melhor como usar esse plugins, você pode ver o vídeo no meu canal no YouTube: Emulando uma mix mais analógica.

Nono passo | Renderizar. Dê play na sua mix na parte mais “cheia”e observe se o master passa de -6dBFS. Caso passe — e você confia que está soando bem — não tem problema! Basta selecionar todos os canais e baixar os volumes igualmente até obter o headroom desejado pelo seu masterizador. Confira o formato de saída e exporte SEM DITHER. Geralmente a ditherização fica pro final da master.

Mixar é um processo divertido e interessante, onde você melhora com a EXPERIÊNCIA e EXPERIMENTAÇÃO. Com o tempo você vai criando suas próprias técnicas para problemas recorrentes, leque de plugins preferidos para cada tipo de situação enfrentada e uma metodologia de trabalho!

Para mais dicas legais como dar cola de bateria com reverbs, mixar arpeggios em camadas e muito mais, visite o meu canal no Youtube!

+++ Confira muito mais dicas de produção aqui

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