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A música conecta

Alataj entrevista Be Morais

Por Manoel Cirilo em Entrevistas 12.06.2019

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A cena eletrônica brasileira, sem dúvidas, vive um de seus melhores momentos até hoje e cada vez mais artistas nacionais conquistam o fascínio do público, aqui e no âmbito internacional. Entre a nova safra de talentos do país, está o pernambucano Be Morais, com suas produções obscuras, melódicas e repletas de identidade.

Ao longo de seus 4 anos de carreira como produtor, o artista soma na bagagem colaborações com labels como Nin92wo, Timeless Moment e Prisma Techno, além do suporte de figurões como Richie Hawtin e Marco Faraone.

Be Morais lançou o primeiro álbum de sua carreira, Tapes From a Future’s Past, no mês passado pela sua label, a Not Another. Conversamos com ele sobre o novo trabalho e sua percepção sobre a cena eletrônica brasileira:

Alataj: Olá, Bernardo! Tudo bem? Obrigado por falar conosco. Você acaba de lançar Tapes From a Future’s Past, seu debut álbum. Profissionalmente e pessoalmente, o que esse trabalho representa pra você?

Be Morais: Opa, tudo ótimo! Eu que agradeço pelo espaço e por todo o apoio que vocês têm dado. Acho que Tapes From a Future’s Past é a realização de uma ambição pessoal. Eu sempre quis fazer um álbum com músicas que fugissem de uma experiência unicamente de pista e contassem uma história. Não que eu tivesse planejado isso, na realidade foi algo natural.

Ao contrário do que imaginávamos, algo mais voltado ao techno, este é um disco majoritariamente electro e experimental. Qual foi a fonte matriz de influências para composição deste álbum?

Eu acho que, em termos musicais, as referências são bastante claras pra mim, por mais que muitas vezes elas se mesclem tanto que se tornem irreconhecíveis – na minha opinião. Artistas como Monoloc, Nils Frahm, The Dale Cooper Quartet foram preponderantes, cada um com elementos muito específicos. Tematicamente, a grande influência foram as obras de David Lych, principalmente Twin Peaks. Daí saiu a ideia lúdica do disco, o mistério e a obscuridade.

Algo que me chamou bastante atenção na audição do disco foi a forma madura e consistente com que você utiliza elementos e atmosferas distintas ao longo das 10 faixas. Como foi possível chegar nesse nível de complexidade menos de 4 anos após o seu primeiro release como produtor?

Eu sou simplesmente apaixonado por atmosferas e por sound design. Isso é o que me instiga a sentar no estúdio e produzir. Grande parte desse disco foi concebida com base nessas atmosferas, em sons surreais, noisy e distorcidos. Demorou um tempo pra chegar no ponto certo, que nem eu sabia exatamente qual era, mas em algum momento ele foi se mostrando e foi assim que o álbum surgiu. Eu venho de um background melódico, então fazia bastante sentido juntar as duas coisas, experimentar bastante e ver o que acontecia.

A forma como o público consome música mudou muito nos últimos anos e ao meu ver parece que os álbuns que realmente contam uma história estão cada vez mais raros. De uma maneira geral, você vê o público interessado nesse tipo de lançamento?

Eu acho que existe um público interessado nesse tipo de lançamento, que talvez não seja exatamente o mesmo público que consumia minhas músicas. Eu digo isso porque eu me incluo nesse público. É muito legal saber que um de seus artistas favoritos lançou um álbum. Você separa aquele momento para ouvir com atenção, para imergir em uma experiência que o artista criou. Acho toda essa experiência incrível e por isso mesmo sempre tive uma grande vontade de fazer um disco. Então, eu não sei se minha visão acaba sendo um “wishfull thinking”, mas eu acho que há um grande público sedento por álbuns que contam histórias, que nos levam para uma outra realidade.

Você atualmente reside em uma região que está fora da rota principal da música eletrônica no Brasil. Ao seu modo de ver, quais são os efeitos positivos e negativos dessa questão geográfica?

Como você bem coloca, há efeitos positivos e negativos nisso. Pelo lado negativo, você acaba tendo menos contato com artistas que produzem na mesma linha que você… eu digo, contato direto, pessoal. Porque é bem diferente você conversar pessoalmente, trocar ideias sobre sons e sobre outras coisas que alimentam a nossa criatividade. Também dá a você menos oportunidade de assistir apresentações de artistas mais consolidados, o que é grande fonte de aprendizado e de inspiração.

Pelo lado positivo, isso tudo tira você um pouco da “homogeneização” da música eletrônica. Eu não quero nem entrar no mérito de se isso é bom ou ruim, mas eu nunca me vi com vontade de fazer músicas muito padronizadas. Isso faz parte da minha personalidade. Então, eu acho que você acaba absorvendo outras influências, trabalhando com o que tem – o que é muito bom! Se eu não consigo ouvir Monoloc tocar, eu posso assistir um show de uma banda local ou um grupo de maracatu.

+++ Prisma Techno e a cena eletrônica de Vitória.

Tapes From a Future’s Past saiu pela Not Another, gravadora que tem você entre os líderes. Lançar este álbum pelo seu próprio selo tem um gostinho especial? Como tem sido essa caminhada com a gravadora até aqui?

Com certeza, tem um gostinho especial. Eu tenho muito que agradecer a todos os meus parceiros na Not Another (GRG, Feemarx, Rodrigo Ilino e Vitor Moya), porque eles realmente me apoiaram tanto no processo de concepção, quanto de produção e de lançamento. De certa forma, Tapes From a Future’s Past foge de alguns dos lançamentos mais recentes, e, mesmo assim, eles abraçaram 100% o álbum. Isso mostra muito da essência do selo, que é buscar sons novos, independente de gêneros. Acaba que, para nós, não é tão relevante enquadrar em Techno, House ou qualquer outro gênero… o importante é não ser “just another”.

Para finalizar, uma pergunta pessoal. O que a música representa em sua vida?

A música representa uma interface para sentimentos infinitos. Ela é o canal de acesso para esses sentimentos que eu mais me identifico. O que eu amo na música é a capacidade que ela tem de fazer você sentir coisas que você não consegue nem descrever, mas pra isso a música tem que ser desafiadora. Quando eu falei sobre a experiência de ouvir um álbum, estava falando disso. Em uma experiência longa, a música pode ser uma imersão em um universo, com uma história própria. Isso é único e lindo.

+++ Confira nosso papo com Davi Leventhal, artista responsável pelas capas da Not Another.

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