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A música conecta

Dos escritórios de advocacia para os melhores clubs do Brasil.

Por Alan Medeiros em Troally 11.03.2015

Devoção completa ao ofício é uma premissa fundamental para quem se atribui o título de artista. Ela é o índice inquestionável do compromisso com o público e o trabalho de Davis, sendo um dos pilares que sustentam sua relação com a música. Advogado de carreira e artista por vocação, Davis compartilha sua rotina de trabalho com dois ambientes bem distintos, os escritórios de advocacia e os palcos dos principais clubs do Brasil, sempre ao lado de grandes nomes internacionais. Mesmo assim, ainda sobra tempo para o estúdio e para projetos paralelos com o The Drone Lovers, que se apresenta na próxima noite do Warung Beach Club. Convidamos Davis para um bate papo sobre suas carreiras e outros assuntos interessantes, que você confere logo abaixo. O podcast, é um dos mais agradáveis que recebemos até hoje no canal.

1 – A sua música é reconhecidamente atemporal. Como foi seu processo de pesquisa e evolução para chegar no artista que é hoje?

No início da minha carreira, minha pesquisa acontecia nas lojas de discos no Centro de São Paulo e no Jardins. Eu passava horas, dois ou três dias por semana pesquisando discos nas lojas – não tinha essa de pedir discos na internet ainda.

Tínhamos algumas boas opções de lojas de discos e excelentes vendedores, aqueles amigos DJs que eu “invejava” seus discos, sabe?
Eu tocav pouquíssimo, mas pesquisava muito. Era muito bom ir para loja e conhecer pessoas, cruzar com artistas que eu admirava, entender como funcionava a noite de São Paulo, ouvir da boca daquelas pessoas que faziam a noite acontecer, seus relatos e experiências na cabine, e sonhar de um tocar em clubes e festas pelo Brasil. Estes fatos influenciam até hoje minha forma de pesquisar e tocar.

Lembro de encontrar o Mau Mau uma vez e ficar super feliz de saber que eu tinha comprado um disco igual ao dele. Os discos eram poucos e procura era muito grande. A galera se matava pelas novidades. Diversas conversas para saber qual seria o dia em que os discos novos chegariam, maior boataria, mentirinhas, era engraçado.

Mas enfim, minhas pesquisas tinham referência hipnótica e atemporal. Minha preocupação era não deixar meu som preso a um determinado período. O house sempre foi minha preferência e misturar com outros gêneros como techno e deep house (o verdadeiro), contar uma história era a viagem.
Alguns amigos DJs me apresentavam selos e artistas menos conhecidos (underground talvez). Mas com a chegada das lojas virtuais a pesquisa ficou mais ampla, rápida, mas menos divertida – ficar em casa ouvindo os discos na frente do computador é muito chato. Enfim, houve diferentes momentos de pesquisa, um período que a empolgação era estar com as novidades. Eu não tinha acesso aos promos, como tenho hoje, mas queria tocar as novidades primeiro que os outros, quem não queria, né. Hoje minha pesquisa está mais restrita no meu acervo do discos (velhos e novos), passei os últimos dias ouvindo algumas prateleiras de discos antigos e faixas de artistas nacionais.

2 – Você tem um histórico legal de lançamento por selos importantes. Incluindo o primeiro lançamento do D-Edge Records. Você enxerga que ainda hoje os selos desenvolvem uma importante função de identidade sonora? Quais as suas labels preferidas?

Sim, acredito que alguns selos desenvolvem muito bem uma identidade sonora, um exemplo que me vem a cabeça é o selo L.I.E.S. de techno e house mais cru. Quem ouve já logo reconhece sua identidade.

Sobre minhas preferências, nunca me apeguei a nenhum selo. As minhas buscas é pela música que me inspira independente da estampa que vem na capa do disco. Lógico que admiro uma porção de selos, mas o mais importante é mensagem que eu posso passar por meio daquela faixa. Quando eu puder ter meu selo vou me preocupar bastante em ter uma identidade.

3 – Como foi para você, advogado de carreira, encarar sua vocação dentro do ramo artístico?

Aconteceu de forma muito natural e orgânica. Quando pensei em tocar como DJ eu imaginava como poderia ser gratificante entregar minha mensagem, deixar um legado artístico por meio da música. Mas ao mesmo tempo eu tinha medo do preconceito, de algumas pessoas acharem que as atividades eram incompatíveis. Mas no decorrer dos anos fui recebendo cada vez mais o apoio e a aprovação.

Hoje os clientes me perguntam onde toquei no final de semana, eles se orgulham das minhas vocações e vice-versa, apreciadores da minha música ficam impressionados quando descobrem que sou advogado.

4 – Você esteve frequentemente envolvido com questões sociais. Seu último trabalho com o The Drone Lovers é o EP Silence, que foi lançado pelo selo Ganzá e tem como inspiração a atual seca que São Paulo vive. Como foi o processo de criação desse trabalho?

O TDL passou umas semanas trancados no estúdio do Dudu Marote com um monte de sintetizadores e Drum Machines com o objetivo de gravar um álbum. A questão da água ganhava cada vez mais destaque nos noticiários e a sensação de final dos tempos rondava as conversas.

A produção da faixa Silence estava rolando a mil por hora, faltava gravar os synths e no meio do trabalho lembramos que tínhamos que definir um local para a foto da capa. Daí surgiu a idéia de fotografar o volume morto, na Serra da Cantareira – região responsável por grande parte do abastecimento da cidade de São Paulo.

Daí pensamos que a foto que demonstrasse a falta d’agua poderia dar a imagem concreta de que esse volume morte significa a morte, o fim e o quê nos resta é o silêncio (como Shakespeare nos mostrou).

Estamos bastante satisfeitos com a mensagem que conseguimos entregar. Neste momento estamos finalizando nosso primeiro álbum com lançamento previsto para Abril/Maio 2015.

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