No dia 30 de maio, a gravadora DFTD lançou um EP com oito remixes de faixas do emblemático duo Groove Armada. Entre os destaques está o remix de My Friend, em uma versão assinada pelos brasileiros DOT, Evokings e Simo Not Simon. Na última semana, a releitura conquistou o topo do chart de Organic House do Beatport.
A conquista é significativa sob diversos aspectos. Além de se tratar de um remix oficial de um dos projetos mais influentes da música eletrônica do Reino Unido, a faixa foi lançada pela DFTD, sublabel criada pela Defected Records em 2013, com intuito de explorar uma curadoria de tracks mais enérgicas, pensadas diretamente para a pista de dança. Conhecida por sua seleção refinada e por impulsionar artistas com propostas autorais, a DFTD se consolidou como uma das gravadoras mais respeitadas do circuito internacional.
O início da colaboração entre DOT, Evokings e Simo Not Simon foi tão inesperado quanto certeiro. Foi de um encontro informal entre amigos que eles decidiram, em apenas uma semana, levar suas ideias ao estúdio. Apesar das trajetórias distintas, os três produtores rapidamente perceberam que estavam na mesma página, onde cada um trouxe à mesa suas estéticas, vivências e referências.
Uma criação em conjunto, dada a diversidade de experiências entre cada produtor, pode ser um desafio, mas este não foi o caso, já que ambos encontraram um denominador comum, desenvolvendo o processo artístico com naturalidade, o que se tornou um dos pontos fortes da produção. A construção e finalização da faixa aconteceu com fluidez e em tempo recorde: em apenas duas sessões.
A ideia de utilizar o vocal original de My Friend surgiu ainda durante a produção, e sua incorporação à nova estrutura melódica demonstrou sintonia entre o material original e a nova proposta. O resultado foi uma releitura respeitosa, mas esteticamente contemporânea, com percussões detalhadas e progressões harmônicas.
Embora a track tenha sido criada em tempo recorde, o caminho até o lançamento oficial não foi tão rápido. Com a faixa finalizada em duas sessões, o trio chegou a enviar a demo para uma gravadora considerada ideal, mas não obteve resposta. Foi apenas um ano depois da criação que a Defected entrou na equação, uma virada de jogo, considerando o volume de demos que o selo recebe semanalmente. O tempo de espera entre a criação e o lançamento reflete uma dinâmica conhecida, mas não tão debatida quanto deveria: a discrepância entre o ritmo dos artistas e dos trâmites da indústria, que muitas vezes podem minar o timing de uma obra.
A burocracia que envolve lançamentos, aprovações e estratégias de distribuição costuma seguir uma lógica mais lenta, muitas vezes desalinhada do estado emocional e criativo de quem produz. Durante esse hiato, paira a incerteza. A dúvida sobre se a música ainda será relevante quando (e se) for lançada. A frustração de ver uma criação potente parada, à espera de uma validação. Nesse sentido, a resposta positiva da Defected contrariou uma estatística muitas vezes desanimadora. Foi uma vitória que mostra que insistir nas próprias abordagens criativas ainda é um caminho possível.
Talvez o segredo para a potência desse trabalho esteja justamente na forma como ele nasceu: de maneira despretensiosa, pautada na amizade. A leveza do encontro entre DOT, Evokings e Simo Not Simon deu o tom do processo criativo: sem pressões externas, sem expectativas infladas, o trio levou para o estúdio a vontade experimentar e conectar seus trabalhos em conjunto e essa atmosfera descontraída acabou sendo uma aliada valiosa, criando uma faixa coesa, com uma soma de identidades diversas que se encaixaram com fluidez.
Para além de uma conquista comercial ou um marco de visibilidade, o remix de My Friend entregue pelos brasileiros é uma prova do que pode surgir quando a criação nasce do desejo, e não da demanda. A ausência de pressões externas possibilitou que o trio operasse em um estado de liberdade, onde a escuta mútua e o prazer da experimentação guiaram o processo mais do que qualquer expectativa de resultado — ele foi uma consequência, dezenas de meses depois.
Na contramão de uma indústria que frequentemente exige formatos, prazos e fórmulas, DOT, Evokings e Simo Not Simon acessaram um espaço criativo onde a colaboração não precisou ser uma performance forçada. E talvez seja justamente aí que reside a força da faixa: em ter sido construída como um devir conjunto, impulsionado por afinidade artística e confiança, não por obrigações estratégicas, embora ela também seja eficiente nesse sentido.