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O Desafio de Uma Geração | Parte 1: Como viveremos juntos?

CRISE: ‘O substantivo (nome) crise vem «lat[im] crĭsis, is, “momento de decisão, de mudança súbita, crise (us[ado] esp[ecialmente] ac[e]p[ção] med[icina])”, do gr[ego] krísis,eōs, “ação ou faculdade de distinguir, decisão”, p[or] ext[ensão], “momento decisivo, difícil”, der[ivação] do v[erbo] gr[ego] krínō, “separar, decidir, julgar”; já no lat[im] ocorre a ac[e]p[ção] “momento decisivo na doença”; a pal[avra] ganha curso em econ[omia] a partir do sXIX; fr[ancês] crise (1429), ing[lês] crisis (1543), al[emão] Krise (sXVI), it[aliano] crisi (sXVI-XVII), esp[anhol] crisis (1705), port[uguês] crise (sXVIII)».’

É difícil não pensar na fábula dos três porquinhos quando nos deparamos com nossa situação atual e percebemos não apenas como são limitadas as alternativas que se apresentam para que saiamos dela e mesmo como tentamos descobrir como acabamos chegando até ela. Vemos que muitas coisas poderiam ter sido feitas em praticamente todos os âmbitos de nossa vida coletiva para evitar que esta catástrofe tomasse as proporções que alcançou. Também percebemos que muitas outras poderiam ter sido evitadas. E notamos que ambas delineiam essa aporia na qual nos encontramos.

    Entretanto, é fácil chafurdar nesse raciocínio se não resistirmos a sua inércia, nos entregando ao desespero e não fazendo o que há de mais urgente para nossa sobrevivência: aprender com os erros, acertos e demais decisões que tomamos ou deixamos que fossem tomadas por nós por um motivo ou outro. E, para que este exercício valha à pena, cabe observarmos o que tanto o presente como o futuro próximo nos reservam, para que saibamos como lidar com cada surpresa sem que expectativas irreais turvem nossa visão. 

    A COVID-19 está aí e tanto sua letalidade quanto os níveis de contágio que seu agente, o SARS-CoV-2, materializam são sem precedentes. A epidemia teve início na cidade de Wuhan, capital da província chinesa de Hubei, uma metrópole tecnológica situada no coração daquele extenso e populoso país. Os primeiros alarmes que avisaram as autoridades de que se tratava de uma epidemia perigosa soaram de forma irresponsavelmente tardia pela região e ouvidos de maneira perigosamente indiferente pelo resto do mundo.

Agora nos encontramos isolados por um motivo de suma importância, ainda que visualizar sua eficácia seja um tanto complexo – e aqui expectativas e ansiedades operam um fator bastante angustiante. Achatar a curva foi o imperativo que guiou a decisão coletiva em torno primeiro do distanciamento social, para daí seguirmos em direção a seu modo mais eficaz e também mais doloroso: o isolamento social. Para a população em geral isto já implicou em imensos sacrifícios, como a camada usualmente mais vulnerável da sociedade. Mas para aqueles cujo sustento depende de acontecimentos festivos ou simplesmente do consumo cultural presencial em massa, o efeito foi similar ao de uma bomba de hidrogênio.

Festivais e temporadas esportivas cancelados, cinemas e clubs fechados,  … enfim, todo tipo de espaço cuja existência depende de aglomerações de indivíduos e atividades culturais coletivas estão sendo desencorajadas de ocorrerem ou simplesmente proibidas para que os níveis de disseminação do vírus e, consequentemente, de sua letalidade não sejam exacerbados. Isto se traduziu, do dia para a noite, em uma legião de pessoas não apenas desempregadas ou sem uma fonte imediata de renda, mas desprovida também de perspectivas para recuperar o que foi perdido em decorrência dessa freada abrupta no mercado em sua totalidade.

Assim, o que vemos agora é um imenso contingente de trabalhadores desse rico universo cultural do qual fazemos parte sem horizonte algum de possibilidades de incrementar sua renda ou mesmo receber quaisquer tipos de proventos, além de inúmeros estabelecimentos recorrendo à boa-vontade de seus antigos frequentadores pelas mais variadas campanhas de apoio. O panorama é desolador e o horizonte não é muito reconfortante, seja para nós ou para muitos outros que atuam na área de serviços, hospitalidade, entretenimento ou mesmo no comércio em geral.

Este cenário acabou por gerar uma cisão comportamental profunda na população brasileira. De um lado, aderentes de teorias de raso embasamento científico, mas com preocupações absolutamente pertinentes acerca das condições econômicas que nos encontrariam ao fim do processo de isolamento social, propondo que ele fosse desrespeitado ou ignorado; de outro, uma esmagadora maioria que se alinha com o consenso científico e político-econômico global sobre o caráter imprescindível de continuá-lo a fim de manter a curva achatada. 

Vale ressaltar que as preocupações que movem ambas posições são todas válidas, ainda que as informações que as alimentam tenham consistência e alcance distintos. Uma paralisação geral desta magnitude é algo insustentável no médio ou longo prazos numa economia altamente integrada como a nossa, mas os níveis de contaminação e letalidade desta nova doença são sem precedentes. E apenas uma dúvida persiste após ponderarmos sobre nossas opções atuais face a tudo isto: o quê vai sobrar afinal? Quanto daquilo que compõe o cerne de nosso modo de vida, tudo que prezamos e amamos, vai persistir ao fim de toda esta crise?

Qualquer resposta simples neste momento é completamente desonesta, já que sequer podemos avaliar o escopo dos danos presentes ou futuros que a COVID-19 trouxe para nossas vidas, direta ou indiretamente. Por ora, vale dizer que muito do estrago já está feito para a maior parte do que envolve os sonhos, planos e projetos de praticamente todos nós. E ele se torna cada vez mais profundo e extenso a cada dia. 

Neste ponto qualquer um poderia deixar tanto o desespero quanto a revolta tomarem conta de si, o que seria completamente justificável…  mas parar de ler aqui não é aconselhável, pois nosso objetivo é tanto desvelar a precariedade de nosso passado quanto a insustentabilidade de nosso presente para que possamos encontrar juntos um futuro comum a ser vislumbrado. Por ora, todos sabemos que muito pouco pode ser feito para mudar qualquer aspecto desta paisagem aterradora no curto prazo e, à medida em que novas informações chegam até nós com referência à duração deste estado de exceção, pouco muda com relação ao que podemos contribuir ou até mesmo esperar

Então, vamos fazer o que conseguimos desde já, especialmente com tanto tempo livre em nossas mãos, e começar a esboçar juntos os contornos de uma nova cena, delineando um novo horizonte que seja mais sustentável em todas as acepções da palavra e imaginando um novo universo de possibilidades para quem estiver apto e disposto a fazê-lo. Como um dos mais visionários investidores do Vale do Silício afirmou, o tempo agora é de construir

Contudo, só se constrói algo sólido sobre uma fundação confiável e, para tal, primeiro precisamos verificar como viemos parar aqui e agora, com tão poucas opções ao nosso dispor.

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A segunda parte de nossa série O Desafio de Uma Geração será lançada na próxima semana. Acompanhe.

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