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A música conecta

Alataj entrevista Victor Ruiz

Em maio de 2017, Victor Ruiz dava sua primeira entrevista para o Alataj, época em que vivenciava um dos períodos mais efervescentes da carreira após uma forte guinada sonora, que passou a acontecer de forma gradativa quando fez sua primeira viagem à Europa, no final de 2013. Passando por cima de críticas e acreditando verdadeiramente no caminho que traçava, tornou-se um expoente brasileiro em âmbito global e conquistou um espaço que talvez nem ele mesmo imaginasse.

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Alguns meses depois de estrear pela Drumcode, em setembro de 2018, Victor passou mais uma vez pelo Alataj para um novo bate-papo e de lá até aqui muitas novidades decoraram sua “estante de troféus”, com destaque para Nimbus, faixa que é um de seus grandes sucessos. Sua conexão com Adam Beyer e toda a equipe da Drumcode seguiu firme e deu a ele mais uma oportunidade de lançamento pela gravadora. Freedom EP chegou no finalzinho de maio com quatro faixas originais, traduzindo fielmente a estética de Victor nos últimos tempos. 

Nessa entrevista, claro, não perdemos a chance de falar sobre alguns detalhes deste trabalho, mas também aproveitamos para perguntar sobre sua primeira gig durante a pandemia — que rolou há algumas semanas — e arrancamos alguns detalhes da Masterclass que foi lançada recentemente. Confira.

Alataj: Victor, é uma prazer falar novamente com você! Esperamos que esteja bem e seguro por aí. Depois da collab com o Thomas Schumacher em Intuit, Freedom EP é seu primeiro lançamento oficial em 2020. Fale um pouco sobre ele… quando foi produzido, detalhes intrínsecos e o que ele representa para este momento? 

Victor Ruiz: O prazer é meu. Esse meu último release foi bem especial. Duas faixas (Illusions e Existence) são mais antigas, produções que fiz quando ainda morava no Brasil. A faixa-título foi a última que terminei e representa uma fase da minha vida pessoal — de autoconhecimento. Senses, que completa o  EP, também foi produzida em 2020, com muita influência nos anos 90. 

Honestamente, tem sido desafiador lançar nos dias de hoje, porque nunca se sabe como as pessoas vão reagir com o lançamento. Não tendo festa, fica imprevisível saber se as pessoas vão querer ouvir “som de pista”. Muitos colegas meus produtores passaram por um período onde não conseguiam ouvir música eletrônica de pista por meses, desde o começo da pandemia. 

Não tem sido fácil mesmo… mas ainda assim você e o time da Drumcode parecem estar mais próximos do que nunca. Quão importante eles foram na evolução de Victor Ruiz, tanto profissionalmente como pessoalmente? 

Verdade, e com certeza eles me ajudaram muito. É muito legal trabalhar com o Adam e todo o time da Drumcode, eles realmente fazem eu me sentir parte da “família” e estou cercado de artistas talentosíssimos. Uma das coisas que mais gosto são os eventos do label. Toda festa o time se reúne e é muito divertido, todo mundo muito gente fina, sem contar a sonzeira que rola. A estrutura e o alcance que a Drumcode tem é fora do comum e tem me ajudado muito e espero estar ajudando também com minha música.

Recentemente recebemos algumas dicas relacionadas à produção musical suas e do Thomas. Tem sido mais difícil ou mais tranquilo produzir em tempos de isolamento social? Longe das pistas, onde mais você busca e encontra inspiração para criar? Quais são suas “áreas de escape”?

Nas primeiras semanas eu finalizei umas cinco faixas, se não me engano. Depois disso mais nada. Talvez um edit ou outro, just for fun. A parte psicológica nesse momento pega bastante, pois a incerteza do amanhã fica sentada na sala olhando para nós, artistas. Tem sido muito desafiador. Mas sou muito grato por esse momento, tenho aprendido muita coisa nova que nunca antes tive tempo de fazer. Sobre buscar criatividade: viajar sempre me ajudou muito, assim como conhecer pessoas novas e ouvir sons novos em festas. Sem isso, tem sido mais difícil, então eu decidi não encanar e seguir o “flow” da vida.

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Não sabíamos que você tinha tocado em uma gig recentemente… onde foi e como foi pra você? Tinham restrições impostas? Deu pra sentir um pouco daquela energia das pistas que tanto sentimos falta?

Cara, essa foi uma história bem louca. Eu toquei em Belgrado, na Sérvia, e só posso dizer que tive muita sorte. O país foi o único da Europa que reabriu sem restrições de eventos e limitação de público. O venue que toquei era a céu aberto e acho que tinham umas 500 pessoas por lá, todas prontas para dançarem até o dia seguinte,  como nos — não tão — velhos tempos. 

Comecemos com a viagem. Ambos os aeroportos que passei estavam muito vazios. Isso foi a primeira coisa esquisita. Todo mundo de máscara, mas sem respeitar tanto assim o distanciamento. O vôo tava até que cheio, o que me surpreendeu bastante. Depois de viajar todos os finais de semana pelos últimos dez anos, ficar quase quatro meses sem voar foi muito estranho, quase esqueci a sensação. Mas na hora que o avião decola, veio aquela sensação gostosa… Até dormi no vôo. 

Chegando lá, a imigração foi tranquila, ninguém falou nada. Outra coisa estranha: ninguém, que não fosse passageiro, podia ficar dentro do aeroporto, então todo mundo esperando do lado de fora com cartazes e placas. Fomos para o hotel e foi tudo tranquilo. Até tinha um pouco de trânsito no caminho que me trouxe um certo senso de “normalidade”. Foi estranho. No hotel tudo certo, jantar no restaurante com o promoter também. Eis que chegou a hora da festa.

Chegando lá, todo o staff usando máscaras e uma certa inquietude e estranheza em passar perto do público, que estava super animado e dançando. Eu esqueci como era a sensação de ver bastante gente junta e tenho certeza que, quando vocês reverem isso, vão estranhar também. Atrás do palco tinha um espaço para os DJs que no momento só tinha eu e minha namorada. Teve um momento que foi engraçado: eu olhei pro meu rider de hospitalidade (que são as bebidas que os DJs pedem quando vão tocar) e vi que ao lado das bebidas havia também um álcool em gel e toalhas sanitárias. Muito doido [risos].

A gig foi insana, toquei duas horas e meia e não queria parar. O repertório foi praticamente sons novos meus e de amigos meus. Cheguei a me emocionar durante o set, pois não sabia quando seria a próxima vez que eu subiria num palco novamente para tocar, só senti gratidão a Deus por isso. Esse set eu toquei em homenagem a todos vocês, sejam DJs ou apenas amantes da música eletrônica, que não estão podendo ir a uma festa e se divertir.

Foi uma baita experiência. Quando eu digo que tive sorte é porque, uma semana depois, a Sérvia fechou o país por conta de todos os protestos que estão acontecendo por lá. 

Esse período mais off, devido a pandemia, tem estimulado artistas a explorarem novos campos. Você inclusive estruturou uma Masterclass que acabou de sair e aposto que tem muita gente interessada em ter aulas particulares com Victor Ruiz. Conta mais sobre isso? 

Esse projeto vem crescendo há muito tempo no meu coração e na minha mente. Eu sempre quis, de alguma maneira, passar meu conhecimento para outras pessoas, mas nunca tive tempo, nem sabia como. Alguma vezes fiz workshops em alguns lugares, mas sempre muito curtos ou não tão bem planejados. 

Todos os dias, quando acordo, eu agradeço por tudo que tenho na vida, rezo e faço meus pedidos a Deus. Desde o começo da pandemia, como estava com muito tempo e sem trabalho fixo, pedia todos os dias — e ainda peço — formas de trabalho onde eu possa ajudar outras pessoas. Junto com minhas managers surgiu a ideia de finalmente fazer a minha Masterclass e, cara, só posso dizer que tem sido aprendizado atrás de aprendizado. Foi a maior bênção, eu acho, desde que essa pandemia começou.

A Masterclass está dividida em duas partes: diferentes módulos online sobre bateria, basslines, synths, arranjo, mix e outros — que são vendidos à parte ou em pacote — e as aulas particulares “one-on-one”. Eu criei todo o conteúdo dos módulos do zero: gravei, editei, mixei e legendei sozinho. Nessa parte, o mestre Andre Salata me inspirou muito. Vou lançar ainda módulos mostrando como eu faço meus bootlegs e, também, sobre o music business.

Quem tiver interesse, é só acessar victor-ruiz.com que lá tem todas as informações e uma aula gratuita pra quem quiser ver como é. Ah, e o curso todo está legendado em português. 

Essa tem sido uma experiência muito gratificante, pois eu não fazia ideia do tanto que essas aulas ajudam os produtores. Cada pessoa absorve e aprende coisas diferentes, às vezes em mínimos detalhes, então estou muito feliz com isso e só tenho vontade de expandir mais e mais.

Uma coisa que sempre tento focar também é falar um pouquinho de espiritualidade, coisa tão importante em minha vida. Eu passo dicas curtas, mas que fazem uma diferença gigante na vida das pessoas. Assim espero! =)

Acreditamos que muitos objetivos que você traçou já foram alcançados até aqui. O que Victor Ruiz ainda vislumbra pela frente? Há alguma meta sonhadora a cumprir?

O projeto da Masterclass só tem me dado mais gás para eu visualizar um sonho que tenho há anos: montar minha escola de música para pessoas que não tem condição financeira de estudar música. E ela será no Brasil. A missão é simples: tirar os jovens das ruas e dar oportunidades a eles, através da música. Esse é um grande sonho que sei que irei realizar. Espero que em breve.

Fora isso, sonho em ter meu label. Também com cunho social, para ajudar pessoas. Mas essa ideia ainda não desenvolvi. Quem sabe não junto as duas coisas…

Muitos artistas e admiradores do seu trabalho estão lendo essa entrevista agora, especialmente aqueles que estão no início de suas carreiras. Se você pudesse dar a eles um conselho, qual seria? 

Seja você mesmo e trabalhe duro para isso. Não tente se adequar a opiniões alheias ou se moldar para agradar pessoas. Isso não dá certo. Acredite, falo por experiência própria. Seja autêntico e siga seu coração, sua intuição. Sei que é desafiador, mas erga a cabeça e siga em frente. Acredite em si!

Para finalizar, vamos mudar um pouco nossa clássica pergunta, visto que esta já é sua terceira entrevista por aqui: depois de tudo que você já viveu na música e com o momento que atravessamos agora, você ainda enxerga a música da mesma forma ou ela ganhou uma ressignificação? Obrigado!

A música ganhou mais significado ainda durante esse momento todo, pois através dela, tenho encontrado novos caminhos pessoais e profissionais. A música foi, é e sempre será a minha vida. Eu nasci pra fazer música e música farei até o último dia que eu viver. E espero ajudar muita gente nessa trajetória.

A música conecta.

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