Vou abrir os trabalhos desta coluna escrevendo em primeira pessoa porque trago aqui um dos artistas que mais admiro em todo o cenário da música eletrônica. Dito isso, conto pra vocês que sempre tive (e sigo tendo) medo de conhecer os meus ídolos artísticos pois rola um receio muito grande de me deparar com uma personalidade que, de alguma forma, me desaponte e aí as coisas também mudam na minha forma de ver seu trabalho. Alguém mais é assim?
Pois bem, DJ Koze é um desses caras que eu morria de receio de conhecer pois se tem algo que se sabe sobre ele é que trata-se de uma figura peculiar. Basta olhar para ele, olhar para a imagem que ele transmite, capas de álbuns e EPs peculiares, uma pluralidade musical ímpar e o trabalho consistente como label owner de uma das gravadoras mais imponentes do cenário da música para imaginar que trata-se de uma personalidade singular.
E foi exatamente a informação que me passaram quando descobri que iria conhecê-lo. Essa história eu conto mais pra frente, antes vou te fazer entender por que Stefan Kozella, um marroquino criado musicalmente na Alemanha, é essa figura tão singular e admirada pela comunidade da música eletrônica mundial.
Em primeiro lugar porque você pode tentar definir o som criado por Koze e, na minha opinião, jamais conseguirá. Não existe caixinha de estilo alguma a qual você consiga encaixá-la. Da suavidade do Deep House aos mergulhos mais inventivos do Techno, o artista é notadamente um apaixonado pela experimentação livre, que combinam com seu humor excêntrico e atrevido.
Isso acontece desde os seus primeiros passos dentro do estúdio, quando fazia parte, em 1994, de um grupo de Hip Hop de Hamburgo chamado Flashmob, e também em suas primeiras aparições enquanto produtor de música eletrônica no final dos anos 90, naquela época sob o pseudônimo de Adolf Noise. Dê o play na faixa abaixo e se pergunte junto comigo “em que mundo sonoro vive esse ser humano?”.
Ainda que fosse algo bem fora da curva, Stefan caiu nas graças dos artistas mais conceituais da época e já começou a estruturar sua carreira musical dentre figuras críticas dentro do cenário. A capacidade criativa ilimitada também o levou a formar um grupo de Pop Eletrônico no início dos anos 2000, o International Pony, que lançou dois álbuns. Ao mesmo tempo, ele já ia dando bons passos em seu projeto mais consagrado, DJ Koze.
O começo da carreira como DJ Koze já foi muito promissor, com uma parceria forte com a alemã Kompakt que lhe rendeu excelentes álbuns, EPs e singles. Mais do que um excelente produtor de faixas originais, Koze sempre foi notado por seus remixes, que vão de Moderat a Matthew Herbert. Quem conhece sua versão para Bad Kingdom sabe do que estou falando. Se você não conhece, segue mais um play indispensável nesse texto.
Koze também é autor de um super hit da House Music, Pick Up, lançado em 2018 e que domina as pistas de dança até hoje. A explosão e consistência no trabalho do artista cresceu ainda mais quando da fundação da Pampa Records, em 2009, gravadora que hoje detém uma posição entre as mais respeitadas no mercado da música eletrônica, lançando faixas de artistas consagrados e também alternativos, caminhando entre Disclosure, Isolée, Lawrence, Die Vögel, Stimming, Mano Le Tough, Axel Boman, Dave Dekay, &ME, entre outras figuras consagradas.
Para completar o pacote, vem o fator discotecagem. O artista, em 1988, com apenas 18 anos, já era reconhecidamente habilidoso como DJ de cut-and-scratch, dominando as primeiras posições de campeonatos de mixagem famosos como o DMC. Os anos de experiência e a mente criativa livre fizeram dele um DJ renomado e requisitado em todo o mundo. Ouvir Koze é como entrar num transe lento, faixa a faixa, em uma construção musical que te abraça e inebria. Disse o manager dele que ele é um “real artist”, pois fica nervoso toda vez que pisa em uma cabine até hoje.
Falando em manager, lá vem a história. Bom… estava eu trabalhando em um festival de música e o grande desafio era receber Koze no palco. Diziam que ele era de fato um cara muito excêntrico, atento aos detalhes, correto e de personalidade peculiar. Eu estava realmente nervosa. Ele chega, acende velas e incenso perto dos equipamentos, pede uma luz baixa para se acostumar com aquela pista imensa e começa uma viagem musical precisa e maravilhosa.
Eu, que geralmente sou extrovertida, me transformei na pessoa mais tímida do mundo e gaguejava pequenas palavras até ele mesmo me deixar confortável para brincar, fazer vídeos e mudar minha cara de apreensão. Ao final, bateu um belo papo, fez piadas e me abraçou enquanto eu chorava contando o quanto sou sua fã e acompanho seu trabalho. Momentão na minha vida dentro da música e um suspiro em meio aquele medo de conhecer grandes ídolos. E que ídolo!
A música conecta.