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Editorial | O fracasso da guerra às drogas em números fáceis de entender

Por Marllon Eduardo Gauche em Editorial 29.01.2021

Conteúdo co-assinado pela Pornograffiti e Senta

Esse é um papo antigo. Enquanto de um lado existe uma minoria que acredita que a legalização das drogas em paralelo com planos para redução de danos seria uma estratégia muito mais eficiente para minimizar os efeitos negativos do consumo ilegal, de outro estão aqueles que discriminam e são a favor da proibição do uso de qualquer substância tida como ilícita. A real é que, independente do lado que você esteja, os números mostram que as ações que estão sendo tomadas atualmente não estão ajudando em nada.

A treta foi instaurada quando um relatório publicado em outubro de 2018 pela ONU foi denunciado por diversas organizações não governamentais (ONGs) por mostrar que a guerra contra drogas era um fracasso. Segundo o Consórcio Internacional de Políticas de Drogas (IDPC), estavam acontecendo mais mortes por overdose, aumento do tráfico e do consumo e abusos dos direitos humanos, sem revelar qualquer redução em escala mundial no cultivo de ópio, coca e maconha entre 2009 e 2018. Muito bom! Só que não. 

Outros dados mostram que, na última década, o cultivo da papoula para a extração do ópio — substância que provoca efeitos analgésicos, narcóticos e hipnóticos, encontrada na morfina, codeína, heroína — saltou 130% e a produção mundial de cocaína aumentou 44%. O mesmo documento mostrou que 275 milhões de pessoas consumiram drogas ao menos uma vez em 2016, um crescimento de 31% em relação a um dado de 2011.

Outro número assustador cresceu: as mortes relacionadas às drogas aumentaram 145% entre 2011 e 2015, ano em que morreram 450 mil pessoas de overdose no planeta. Então, a pergunta que fica é: está certo continuar com este enfoque ineficaz, lutando contra as drogas “usando a força” ao invés de abrir mais espaço para a redução dos riscos e atuar com estratégias mais inteligentes?

Gustavo de Greiff, procurador-geral responsável pela missão da captura do Pablo Escobar — que terminou com a sua morte — sempre foi um forte defensor da legalização das drogas e, mesmo tanto tempo depois, ele mantém a mesma opinião. Em uma entrevista à BBC, afirmou que “o narcotráfico seguirá sendo um problema enquanto os países produtores e/ou consumidores de drogas não regularizarem a produção e o comércio das drogas hoje proibidas. Ou seja, é necessária a legalização das drogas, mas seguida de uma adoção de novas medidas de saúde pública dirigidas aos consumidores”.

Um exemplo perfeito: o estado do Colorado legalizou a maconha. Ela é agora vendida em locais licenciados e traficantes da erva perderam seu espaço pouco a pouco. Quer outro? A Suíça legalizou a heroína e agora não há traficantes violentos relacionados à droga no país (e houve um total de zero mortes relacionadas à heroína legal em quinze anos desde que ela foi legalizada).

Pegando um pouco da nossa realidade. Maria Lucia Karam, importante juíza brasileira, calcula que 30 mil dos assassinatos no Brasil todos os anos são um resultado direto desta guerra pelas drogas criada pela proibição. Lendo sobre o assunto, nos deparamos com outra uma frase bastante sensata: “A melhor maneira de reduzir o vício seria diminuir a dor profunda que os dependentes químicos sentem. Quanto mais pessoas puderem ser ajudadas a viver vidas significativas, conectadas e seguras, mais sairão do vício”.

Essa foi uma reflexão feita pela ONG brasileira De Braços Abertos que, na sequência, fez um experimento para comprovar isso. Compraram alguns hotéis baratos e forneceram às pessoas da Cracolândia um lar seguro, comida e emprego — em vários casos, pela primeira vez em suas vidas. A melhor pesquisa sobre isso mostrou que, como resultado, 65% deles reduziram o seu uso geral de drogas. Tempos depois, Doria foi eleito e decidiu acabar com tudo. 

O programa De Braços Abertos foi avaliado pela Plataforma Brasileira de Política de Droga, que é totalmente apartidária e financiada por uma entidade privada chamada Open Society. Segundo os dados analisados, 95% dos entrevistados consideram o programa positivo e 88% reduziram o uso de crack após ingressarem no programa.

Se você quer ir mais a fundo no assunto, recomendamos a leitura de “Na fissura: uma história do fracasso no combate às drogas”, livro com mais de 400 páginas, abraçando oito anos de estudo, publicado em setembro de 2018, autoria de Hermano Brandes de Freitas e Johann Hari. Johann, inclusive, afirmou em uma entrevista ao UOL que a “droga já é descriminalizada para os ricos. Imagine um tanque em Ipanema”.

Será que algum dia seguiremos o exemplo de um país que tem obtido sucesso na política de controle e não de guerra contra as drogas?

Fontes:

Estado de Minas Internacional
The Intercept por Johann Hari
Catraca Livre

*Pornograffiti e Senta, que a todo momento abordam o assunto, lançam em breve uma collab venenosa pra você ficar na beca.

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