Nicolas Jaar é um artista que traduz com maestria a multiplicidade de caminhos possíveis dentro da música eletrônica. Ele emergiu ao final da primeira década deste século com uma abordagem desacelerada e introspectiva para música de pista, em contraste direto com a estética EDM dominante da época. Seus primeiros lançamentos pela Wolf + Lamb e Circus Company já revelavam um produtor interessado em apresentar novos formatos de experimentação entre o House e o Techno, incorporando elementos do Jazz, da música clássica moderna, influências latinas e Ambient
Em 2011, seu álbum Space Is Only Noise o apresentou a um público mais amplo, estabelecendo um ponto de virada para as possibilidades convencionadas para o que se entendia tanto sobre álbuns tradicionais, quanto para o som apresentado nas pistas. Desde então, sua discografia se desenvolveu em diferentes frentes.
Neste processo ele criou o selo Other People, voltado à produção autoral e à curadoria de trabalhos experimentais; adotou o alias Against All Logic, canalizando faixas mais diretas e sampleadas com forte apelo dançante; e formou o trio Darkside com Dave Harrington e Tlacael Esparza, onde explora ambientações densas e psicodelia instrumental. Em vez de seguir uma linha evolutiva linear, Jaar opta por ramificações, alternando álbuns conceituais, composições experimentais, trilhas sonoras, EPs e mixtapes, numa obra que se constrói em torno do deslocamento e desenvolvimento constante, sempre com um senso claro de autoria e autonomia.
Jaar segue cultivando projetos com forte densidade artística. Em 2024, lançou as edições 1 e 2 da série Piedras, com apontamentos de sucesso pela crítica. Já em 2025, apresentou o projeto Archivo de Radio Piedras, espaço onde compartilha mixtapes e registros sonoros experimentais que expandem ainda mais sua linguagem. Também neste ano, retomou sua parceria no Darkside, lançando o álbum Nothing, obra que reafirma uma das facetas mais atmosféricas e intensas de seu repertório.
A seguir, destacamos algumas faixas que ajudam a traçar esse percurso sonoro, identificando diferentes prismas que formam a obra de Nicolas Jaar.
Nicolas Jaar – Love Teacher (2008)
Um de seus lançamentos pela Circus, a faixa revela o frescor experimental do início da carreira de Jaar, flertando com o Microhouse e o Downtempo, conduzida por vocais cortados que se tornam elementos percussivos tanto quanto narrativos. A track insinua uma sofisticação emocional e sonora que antecipa o refinamento de seus trabalhos posteriores.
Nicolas Jaar – El Bandido (2009)
Lançada pela Wolf + Lamb, a faixa, que é uma das mais icônicas de sua carreira, combina pianos elétricos com efeitos, cordas que abastecem o desenvolvimento, uma base rítmica que acompanha os vocais em espanhol e uma construção que se afasta de qualquer fórmula. Jaar já apontava para um caminho autoral, em que criação e sentimento caminham juntos, mesmo que isso signifique quebrar as regras.
Nicolas Jaar – Mi Mujer (2010)
Mi Mujer é um marco de suas raízes latinas com uma abordagem eletrônica minimalista e atmosférica. A faixa se constrói lentamente, com camadas de percussão, vocais em repetição e grooves sutis que criam uma tensão constante sem recorrer a clímax tradicionais. O uso de elementos de Jazz introduz uma textura que contrapõe a base eletrônica, dando à música uma sensação íntima e expansiva ao mesmo tempo.
Nicolas Jaar – Space Is Only Noise If You Can See (2011)
Parte de seu primeiro álbum, Space is Only Noise, que projetou Nicolas Jaar para o mundo. A track conta com uma abordagem introspectiva, linhas de baixo ácidas que se repetem gradualmente, bem como os vocais. É quase como se o ouvinte fosse, de fato, direcionado ao espaço. Essa faixa poderia facilmente lembrar parte do catálogo de LCD Soundsystem. No entanto, é indubitável a identificação da assinatura de seu criador.
Nicolas Jaar – Swim (2016)
Construída sobre um loop de bateria eletrônica com uma batida lenta, que se desenrola para o House em alguns momentos. A partir dessa base rítmica, Jaar introduz sintetizadores analógicos que se movimentam em camadas moduladas, criando variações sutis de timbre e intensidade, quase como ondas sonoras que sobem e descem. O piano aparece pontualmente, funcionando como um contraponto melódico suave que guia a ambientação, somando efeitos de delay e reverb o que gera uma sensação de imersão no som, como se o ouvinte estivesse submerso em um ambiente líquido e etéreo.
Against All Logic – Some Kind of Game (2018)
Some Kind Of Game, do projeto Against All Logic (A.A.L.), é uma faixa pulsante que mistura elementos de Deep House e até mesmo Tech House. A track é construída com uma batida sólida que vai se tornando progressivamente mais complexa, guiada por samples vocais e camadas de teclados dinâmicos que transmutam em elementos vibrantes. A produção une com finesse uma base House clássica a uma sensibilidade moderna, mostrando o talento de Jaar em reinventar gêneros com uma pegada pessoal e inovadora.
Nicolas Jaar – Rio de las tumbas (2024)
A faixa, que ocupa o centro do álbum Piedras 1, é sustentada por um contrabaixo abafado, percussões orgânicas, carregadas de texturas de campo que sugerem a ideia de navegar pelo Río Magdalena, tudo embalado pelo minimalismo típico de Jaar. Os vocais citam diretamente o Río Magdalena, amarrando a faixa a temas de violência histórica na Colômbia e a uma linhagem de trabalhos que Jaar começou no concerto-homenagem às vítimas da ditadura chilena.
DARKSIDE – American References (2025)
Um dos lançamentos mais recentes das contribuições de Jaar para a música eletrônica. American References traz arranjos de hand-drum, baixo e guitarras, apresentando a evolução rítmica da banda após a chegada do baterista Tlacael. Aqui, Jaar murmura versos em espanhol e espalha efeitos espaciais que englobam referências culturais norte-americanas até um breakdown que mantém a tradição do grupo de fundir psicodelia, dub e minimalismo.