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A música conecta

Alataj entrevista Amanda Chang

Por Isabela Junqueira em Entrevistas 09.09.2022

Amanda Chang é uma potência que há mais de uma década despontou no cenário musical alternativo nacional propondo uma abordagem que foge à regra. Hoje ela atesta o ápice de uma maturidade artística que floresce em um novo projeto: Chang Rodrigues. Batizado a partir de uma fusão do sobrenome chinês herdado da mãe com o brasileiro, advindo do pai, Amanda mergulha na possibilidade da evacuação dos mais diversos sentimentos através da música e com o projeto cuja abordagem mantém-se neutra em relação a gêneros, adentra também em uma viagem de autoconhecimento.

Inquieta e criativa, a artista estreou Chang Rodrigues (sua performance live baseada em sintetizadores analógicos modulares), na sexta-feira passada, dia 02 de setembro, no palco New Dance Order no Rock in Rio — considerado um dos momentos mais significativos de sua jornada. Reverberando o Techno Peak Time, com boas referências que passeiam pelo Ambient, Acid, Funk e eletrônica experimental, o clichê faz-se necessário e é tranquilo afirmar que o projeto foi estreado com o pé direito.

+++ Relembre o storytelling sobre o palco New Dance Order

Em meio a euforia da estreia, Amanda tirou um tempinho para conversar conosco e responder algumas de nossas perguntas, que vão desde a estreia do projeto até os próximos passos da artista com ele. Confira a conversa com Amanda:

Alataj: Olá Amanda, que prazer imenso conversar com você logo após a estreia do seu live act Chang Rodrigues no RiR! São 14 anos de estrada e um caminho que parece ter te conduzido organicamente ao que você vive atualmente, mas sem falsas modéstias, quais plantios você tem plena certeza que foram fundamentais para o que você colhe profissionalmente hoje, Amanda?

Amanda Chang: Olá Alataj, o prazer é meu de conversar com vcs. A colheita sem dúvidas é fruto de estudo, dedicação e coragem para seguir  o caminho do coração, que nem sempre será o mais fácil ou rápido, é até mais longo e difícil, mas preenche de uma forma única. 

Conta um pouquinho mais sobre a escolha em trabalhar só com sintetizadores analógicos também.

Tenho um hardware digital, que é a Digitakt, ele faz o papel do computador no meu live. A maior parte do meu setup são sintetizadores modulares analógicos. Adoro, pois estou sempre aprendendo algo novo de síntese sonora. Busco novos patchs, novas formas de sintetizar um som, costumo ir para o estúdio Siesta del Fauno na Argentina estudar com Ernesto Romeo, saio energizada de lá.  Faço e refaço várias vezes o mesmo patch até entender o que realmente está se passando no som. 

Você estreou o seu projeto no Rock in Rio, mas você já trabalha com sintetizadores modulares há um bom tempo, não é mesmo? Como foi o despertar do seu interesse?

Comecei a trabalhar com sintetizadores modulares analógicos em 2016. Até então, eu só discotecava, mas sentia que precisava me aprofundar na música e na arte. Quando tive as primeiras aulas de produção musical, passando pelos conceitos básicos de síntese sonora, confesso que achei incrível o fato de criar os próprios timbres, eu tinha zero conhecimento na daw para produzir música. Daí fui aprendendo a usar a daw e os modulares simultaneamente. 

É nítido que o seu trabalho tem um respaldo muito grande em relação aos sentimentos e explorá-los através da sua música. É isso o que torna ele tão singular?

Traduzindo sentimentos em sons, eu acho que consegui transmitir isso no Live Ruínas. Eu queria contextualizar o som que eu criava no sintetizador, que não é nada convencional, mas que é um instrumento como qualquer outro. 

Impossível não te questionar sobre isso, mas você é uma das poucas mulheres (principalmente no Brasil) que temos a chance de acompanhar trabalhando com sintetizadores modulares e há muita representatividade aí, né? Como você interpreta isso?

Assim como em todos setores, as mulheres estão conquistando seu espaço, depois de milhares de anos sendo podadas, sofrendo discriminação e preconceito. E na música, isso não foi e é diferente. Não vemos tantas mulheres em várias áreas, mas isso está mudando, pouco a pouco vamos conquistando nosso espaço.  

Espero que essa representatividade de tocar com sintetizadores modulares na nossa cena eletrônica,  possa abrir portas para outras e várias manas, lgbts, passarem. 

Quando falamos de pioneirismo na música eletrônica de vanguarda no Brasil, gosto de citar Jocy de Oliveira, sempre à frente de nosso tempo, pioneira da música eletrônica no Brasil, é a primeira compositora brasileira a usar várias linguagens artísticas em uma mesma obra. Primeira mulher no Brasil a usar um sintetizador EMS em suas composições, a ter obras escritas especialmente para ela por e/ou ter sido intérprete de John Cage, Stockhausen, Messiaen, dentre outros. 

Em um mundo onde nós, mulheres, precisamos sempre nos provar e comprovar, às vezes muitas de nós sentem que são obrigadas a abandonar aspectos e/ou traços da sua própria personalidade para serem levadas à sério, mas você não abre mão dessa personalidade que mescla profissionalismo e a montagem, a maquiagem… muito pelo contrário, acho que você usa isso a seu favor para mostrar, afinal, quem é Amanda Chang. Há quem diga que o artista veste um personagem, mas é muito interessante como seu projeto parece ser uma extensão artística exata de você. É assim que você se sente?

Tenho várias facetas, faço discotecagem, tenho projeto que une yoga, instrumento ancestral e sintetizadores chamado Frequências Sonoras.  Atualmente sou pesquisadora/aluna de mestrado da Unicamp sobre espacialidade sonora – áudio imersivos. Faço workshops, Q&A sobre processos criativos usando sintetizadores modulares na plataforma francesa Echio. 

No projeto Chang Rodrigues apresento uma faceta mais conceitual, voltada para o live act. A imagem é comunicação e expressão, e uso sim ao meu favor, conto com um time de profissionais de ponta. 

E o que te nutre criativamente, Amanda?

A arte de viver, de aprender, superar….

Vejo que minhas maiores limitações e medo, é aonde eu tenho que ir, pois dessa forma, me supero e me torno um ser humano melhor. 

Boatos de que há EP com o projeto novo chegando por aí, rola dar um spoilerzinho pra gente [risos]?

O EP que vai rolar é do Ruínas, que é um dos projetos que mais me orgulho. Não tinha como não rolar um EP, tem 2 tracks de Techno e 1 experimental, lançando nesse mês ainda. 

O Ruínas é nascer, renascer, desconstruir, aceitar, desapegar e construir sonhos.  E é com esse sentimentos, que vou lançar de forma independente pela ACR Records, colocando as minhas músicas a serviço do outro, enfim, mostrando pro mundo minhas primeiras produções, depois de 1 ano do lançamento do projeto.

Caminhando para o fim, contextualiza pra gente a escolha do nome do seu projeto também.

O nome Chang Rodrigues dispensa rótulos, e não se limita a quaisquer estereótipos. Extrapola a polaridade masculino e feminino, agregando os dois. Chang é um nome oriental, a parte chinesa herdada de minha mãe. Já Rodrigues, de origem portuguesa, é da parte latina, carioca do meu pai. 

E também foi uma forma de reverenciar a minha ancestralidade. 

Finalmente, nossa tradicional pergunta: o que a música representa pra você? Sucesso, Amanda! 

A música representa o estado da alma, é comunicação, conexão e evolução. Obrigada Alataj, foi um imenso prazer compartilhar um pouco da minha jornada musical com vocês. 

A música conecta.

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