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A música conecta

“Festa, festa, festa!”: há 30 anos dançamos com Andrea Gram

Por Rodrigo Airaf em Storytelling 19.10.2022

A história da música eletrônica no Brasil estará para sempre vinculada a este nome: Andrea Gram. Apesar de levar o carinhoso apelido de Rainha do Underground, não pense que esta calorosa discotecária é uma figura inacessível. Pelo contrário; seu lifestyle é cumprido com amor por e para as pistas de dança, e Andrea é assumidamente uma habitué de festa, de pista, de after, de pré, de longos papos e de diversão que só mesmo nosso universo clubber pode proporcionar.  

Por falar em after, foi no primeiro after do Brasil, no Hell’s Club, que Andrea Gram pôde, como residente, fazer inúmeras pistas se esbaldarem em suas referências, estas que acumulou como atenta frequentadora de raves e colecionadora de discos. Morando entre Londres e Paris no fim dos anos 80 e início dos 90, Andrea viu de perto o crescimento de movimentos icônicos que influenciam artistas até hoje, como o Acid House, o Jungle Hardcore, UK Garage, Breakbeat e toda a infusão comunal do Segundo Verão do Amor. 

Andrea completou três décadas de carreira em fevereiro de 2022 / Imagem: Catarina Briz

“Presenciei a migração de bandas do eletrônico para os galpões. Definitivamente impactante também foi a Rave LM, em São Paulo, com shows do Moby, Altern 8 e Mau Mau, uma amostra do que estava acontecendo na música eletrônica em Londres, que eu já lançava como novidade com a minha residência nas domingueiras no porão do Túnel do Tempo, eternizando os hinos da época”, conta Andrea, revivendo memórias de um período em que praticamente não se ouvia falar as palavras “mulher” e “DJ” em uma mesma frase. 

Foi também em meados da década de 90 que Andrea começou a produzir a faixa Efeito Colateral, traduzindo todas as vivências artísticas e sociais que a moldaram. High BPM, recheio de House, cobertura de Breakbeat e uma atmosfera raver introspectiva, simultaneamente, elegante, a faixa deu o ar das graças este ano, finalmente; em NFT na Pianity e posteriormente demais plataformas digitais, assinada pela gravadora DSRPTV Rec. É uma raridade que Andrea resgatou de seu arsenal criativo, recuperada digitalmente em um trabalho impecável de masterização pelo produtor RHR e que tivemos o prazer de apresentar por aqui como premiere. 

2022 marcou 30 anos de uma carreira agitada para ela, incluindo o seu próprio coletivo, a DSVIANTE, refúgio dance imponente em SP. “Fiz esse cálculo através de um flyer da minha primeira aparição, ao lado dos grandes Renato Lopes e Marquinhos MS. Lembro que toquei com fita K7 e compactos importados. Como produtora, desde meados de 94 eu já testava gravações em softwares e bancos de samples da época – não tinha internet ainda, então me informava e recebia CDs que vinham nas revistas, tais como Future Music e Musik, relembra. O rolê em questão foi na extinta Columbia, quando o termo usado para os clubs era apenas “casa noturna” e os flyers seguiam a estética de discos de vinil. 

Esse time frame de décadas gerou um histórico festivo suntuoso para Andrea e seu trabalho está referido na exposição “60 Anos de Discotecagem em SP”, no Centro Cultural Olido. Entretanto, o arrebatamento que a música lhe ofereceu vem de antes da maioridade. “Na minha pré-adolescência já colecionava discos e frequentava as matinês de Disco Music da Banana Power e da Cave. Luzes piscantes à la Travolta, passinhos… me fascinei pela música e pela pista, adorava a sensação  de ouvir os discos que eu colecionava tocados num volume bem mais alto do que em casa”, comenta. 

Uma Andrea Gram em meados da década de 90’s imersa nos softwares da época. 

Nas cabines, a personalidade atrevida de Andrea reflete-se em sua discotecagem, que vira um passeio entre muitos moods, do ácido ao melancólico, do som chiclete oldschool às ambiências techneiras soturnas. “Toco muito para o público. Meus sets são completamente intuitivos. Monto uma pasta com tudo que quero mostrar em determinada festa e às vezes fujo um pouco para ver a reação do público. Atualmente estou nos BPMs mais rápidos, mas depende muito da festa que vou tocar. Predomina o 4×4 mais Chicago e Detroit, e sou bem houseira também, tipo Hard House holandês e Tech House sueco”. 

Se os sapatos de Andrea precisam ser trocados com frequência, há razão para isso. Não somente viajou o mundo tocando e festejando – em clubs famigerados na Alemanha, festas raras na Turquia e festivais pitorescos na Romênia, país com o qual compartilha ascendência – ela segue imperando diante de fronts atuais queridos, como o da Blum, Capslock, SP Na Rua e Vai No House. “Sempre tive um fascínio de saber o que está por vir. Isso me fomenta, o futuro da música. Adoro ouvir djs novos e suas referências, é isso que me move!”, conta.

Todo esse misto de atitude, pioneirismo, amor pela música, espírito de pista e muita sede pelo novo que Andrea Gram leva consigo firma uma herança incomparável na história da música eletrônica no Brasil. E quando perguntamos a ela sobre o que deseja que sua persona siga transmitindo para o público, uma resposta melhor que esta seria impossível: “festa, festa, festa!”. Obrigado, Andrea! 

A música conecta.

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