2002 já faz muito tempo, não parece, mas faz. 22 anos se passaram desde uma época onde a música eletrônica no Brasil engatinhava, com quase nenhum artista em destaque — salvo algumas poucas exceções. Tudo ainda era muito embrionário por aqui, no entanto, mesmo com este panorama, já havia um grupo de entusiastas engajados, ousados e determinados a fazer diferente, movimentar e literalmente transformar parte da cena e a forma com que as gravadoras atuavam: era a Underground Records Brasil, ou apenas URBR.
Sob a liderança de Michel Palazzo, Eduardo Ferreira e VJSpetto, o objetivo inicial estava bem claro: dar mais visibilidade aos DJs e produtores nacionais, suas produções e compilações, colocando a imagem do artista na capa, algo inédito até então. A ideia era desenvolver o cenário artístico nacional a partir de uma nova perspectiva, com artistas brasileiros ocupando as principais prateleiras das lojas de discos. E foi assim, na raça e na coragem, que a URBR conseguiu bater de frente com as majors labels, mesmo sem todo o financiamento que as gigantes da indústria tinham por trás.
Apoiada principalmente em três vertentes principais — house, techno e drum n’ bass —, a URBR começou então a lançar seus primeiros EPs, na época produzidos em CDs e vinis. Outubro de 2002 marcou o lançamento do URBR001, intitulado First Level, um disco com quatro faixas assinadas pelo próprio Michel Palazzo junto de Diego Logic, Oliver Ferrer e DJ Murphy, trabalho que meses depois chegaria às mãos de Carl Cox durante o Winter Music Miami Conference de 2003.
Em seguida, vieram as primeiras compilações. A primeira, focada em house, foi assinada por Julio Torres, um artista pra lá de experiente que representava muito bem a house music nacional. Depois, uma compilação de techno com curadoria de Grace Kelly Dum, e por fim, uma de drum n’ bass, com a seleção minuciosa de Marnel. Tudo foi feito de forma 100% independente, através de amizades, ligações e muita força de vontade. “Era tudo muito novo. Pra prensar o disco, tínhamos que enviar pra Londres. Para prensar os CDs, tínhamos que bolar até código de barras, entender como funcionava… só queríamos ser DJs e produtores, mas acabamos virando uma empresa com gestão e visão à frente do tempo”, relembra Michel.
Fato é que a história começava a ser escrita e não pararia tão cedo. Com o barulho que estava causando, a URBR conseguiu a atenção de muita gente, desde espaço em publicações importantes como a Folha Ilustrada, clipes na MTV, até features em revistas estrangeiras como a DJ Mag britânica e colaborações com grandes marcas como a Colcci. Ao longo dessa história, a label conseguiu comercializar mais de 100 mil cópias entre CDs e vinis, algo quase impensável para a época, já que nem mesmo as principais distribuidoras do mundo chegavam perto desse número.
A URBR quebrou paradigmas e lançou muitos dos principais nomes que contribuíram ativamente para a evolução do cenário brasileiro e internacional. Além dos já citados anteriormente, a gravadora lançou trabalhos de artistas como Renato Lopes, DJ Mimi, DJ Mau Mau, Fabrício Peçanha, Laurent Garnier, DJ Sneak, Trentemøller, Paco Osuna, Davide Squillace, entre muitos outros que poderiam preencher mais alguns parágrafos de citações. Mas o sentimento de saudosismo agora dá lugar ao de emoção e animação, já que a URBR retornou recentemente com suas atividades e já possui um cronograma sólido de lançamento para os próximos meses.
Os releases foram retomados em maio com o EP Makes My Body Dance, de PYERRE com Roland Clark, seguido por Feelin It, de Ditex, Ubuntu, de Wilson Timba, Love Your Fkn Life, de LaMooc, e Overcome, de Bumpz. Entre estes cinco trabalhos, menção especial para a faixa entregue por Wilson Timba, artista moçambicano que começou seu projeto em 2020 e tem mostrado muita sensibilidade na construção de faixas atmosféricas em torno do Afro House. Ubuntu, segundo o próprio artista, é “uma jornada sonora que reflete o espírito comunitário e a interconexão humana”.
O catálogo seguirá bastante movimentado com pelo menos mais 12 lançamentos até o final deste ano, mantendo os princípios que fizeram a URBR cravar seu nome na história da música eletrônica nacional: uma curadoria de ponta, um olhar atento para novidades e tendências, além de muito amor e compromisso com a boa música, sem espaço para qualquer tipo de preconceito sonoro. Seguiremos acompanhando de perto por aqui.
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