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A música conecta

Afro House antes do Hype: um olhar para artistas e gravadoras que ajudaram a moldar o estilo

Por Ágatha Prado em Trend 29.08.2024

Percussões, ancestralidade, batidas orgânicas e um tipo de gingado de raiz cultural tem contagiado a energia de qualquer pista de dança, em qualquer canto do mundo. De origem sul africana, o Afro House hoje é considerado um dos estilos mais requisitados nos grandes festivais de música eletrônica do globo, celebrando raízes ancestrais através da fusão com as linhas da House Music. Para os sul-africanos, o Afro House não é apenas um estilo musical para as pistas de dança, e sim um estilo de vida, uma trilha sonora para liberdade.

O lendário DJ e produtor sul africano Black Coffee foi um dos grandes responsáveis pela evolução e popularização do estilo para além de sua terra natal, rompendo as barreiras geográficas e penetrando no circuito dos prestigiados palcos da Europa, a partir de uma ótica sonora que celebrava uma perspectiva cultural diferenciada e até então incomum no cenário da e-music.

Para alcançar o hype a nível global que o Afro House hoje possui, celebrado por nomes como Keinemusik – em especial com os trabalhos de Rampa -, Hugel, FNX Omar, Francis Mercier, Themba, e pelos brasileiros Curol, MAZ e ANTDOT, o estilo passou por algumas etapas cruciais em sua jornada de expansão, marcado pelos trabalhos de artistas e gravadoras que fizeram e ainda fazem história dentro do gênero. Vamos mergulhar brevemente nesta linha do tempo e resgatar trabalhos que foram fundamentais para o desenvolvimento e consolidação do Afro House. Um passeio histórico através de personagens e catálogos, que remonta às influências que ajudaram a construir a sólida base que permitiu ao Afro House alcançar os palcos mais renomados ao redor do mundo na atualidade. 

Black Coffee

Não podemos falar de Afro House, sem citar a real importância de Black Coffee para a popularização mundial do estilo. Nascido em Durban, na África do Sul, Black Coffee surpreendeu as noites de Ibiza com seu vasto domínio musical a partir de uma assinatura única, que vibrava as atmosferas do House com batidas percussivas e fortes características dos Afro Beats, iniciando assim a tendência de um estilo que se tornou presente nos principais festivais eletrônicos mundiais, caracterizado como Afro House. A partir de collabs e versões remixadas para grandes nomes da música africana, como o lendário Hugh Masekela, Zonke, Ringo Madlingozi, Black Coffee foi levando a magia de suas batidas tribais para os círculos de DJs sul-africanos, furando a bolha geográfica com os lançamentos de Home Brewed e Africa Rising que foram fundamentais para o sucesso do estilo em grandes palcos da música eletrônica mundial.

Dele Sosimi

Dele Sosimi é considerado o grande embaixador do Afrobeat e um dos mestres  imortais do gênero que é uma das raízes que formaram a base do Afro House que conhecemos hoje. Tecladista da icônica banda de Fela Kuti, Egypt 80 nos começo dos anos 80, Sosimi possui um legado indiscutível na difusão dos ritmos afros para além de seu continente natal. Com sua Afrobeat Orchestra, o artista assinou a histórica compilação Essential Afrobeat lançada em 2004 pela UniversalCalabash Volume 1: Afrobeat Poems (Afrobeat Poet), além de diversos hinos que influenciaram os trabalhos de Black Coffee e de muitos outros artistas que integraram a fusão do estilo com as bases da House Music. Dele Sosimi segue sendo reverenciado e amplamente relevante não somente para o Afrobeat, como também para o cenário do Afro House inspirando coletâneas remixes em gravadoras como Moblack, Get Physical, Madorasindahouse e Keinemusik.

Fela Kuti

Voltando ainda mais para as raízes, com foco no Afrobeat como um dos pilares que formaram a base rítmica, cultural e estética do Afro House, não podemos deixar de citar a lenda Fela Kuti, que não só é o criador do Afrobeat, como também é a maior referência mundial da música africana. Com uma obra imensa que continua a inspirar diversas gerações de músicos, Kuti liderou a banda Egypt 80 e disseminou um trabalho complexo recheado de sofisticada interação de notas, melodias, harmonias, ritmos e mensagens a favor da liberdade popular, fazendo de sua música uma ferramenta de revolução.  O legado de Fela Kuti está essencialmente presente na nova geração da música africana como um todo, e nas esferas do Afro House, Kuti é sempre homenageado através de inúmeros remixes assinados por nomes como Armonica, Themba, Blond:Ish, Oscar P e muito mais. 

Floyd Lavine

Considerado um nômade africano, Floyd Lavine é uma figura central na evolução e popularização do Afro House, trazendo uma visão inovadora e vibrante para o gênero. Com suas raízes sul-africanas e uma profunda compreensão da cultura local, Lavine consegue criar uma fusão única de ritmos africanos com a estética moderna da House Music. Seus lançamentos clássicos, como Masala e Kusimama são alguns exemplos marcantes de sua capacidade de combinar batidas hipnóticas com melodias envolventes, redefinindo o Afro House e expandindo suas fronteiras. Lavine não só celebra a herança cultural africana, mas também a projeta para uma nova geração de ouvintes, consolidando ainda mais a influência do Afro House na música eletrônica contemporânea.

Enoo Napa

Enoo Napa, iniciou sua trajetória na produção musical em 2013, e seu remix para Conqueror de Jackie Queen, que mistura um som afro ambient com sintetizadores techy, chamou a atenção de Black Coffee no início de 2015. Em pouco tempo, suas produções ganharam destaque nas setlists de DJs renomados ao redor do mundo, garantindo-lhe bons resultados em charts de Afro House de plataformas como a Traxsource. A ascensão rápida de Enoo Napa não foi por acaso. Ele abandonou seu emprego como operador de telefonia para se dedicar à música em tempo integral, desafiando-se a produzir 15 remixes e 12 faixas originais em apenas 18 meses. Entre esses trabalhos, destacam-se High in Your Love, com a vocalista de Durban Zipho, incluído na compilação Phezulu Selection Vol 4 de DJ Mbuso, e Uprising, uma colaboração com DJ Shimza lançada no EP One Man Show por meio da Soulistic Records. Atualmente, Enoo Napa é um dos produtores mais prolíficos do Afro House, com remixes realizados para artistas como Black Coffee, N’dinga Gaba, Mi Casa, Oscar P, King Sfiso e DJ Merlon.

Soulistic Music

A Soulistic Music certamente foi uma das gravadoras pioneiras a desempenhar um papel crucial na promoção e expansão do Afro House, consolidando sua influência tanto local quanto internacionalmente. Fundada em 2005 por Black Coffee, a Soulistic Music rapidamente se estabeleceu como uma força inovadora na cena musical seguindo os passos de selos lendários como Yoruba e Innervisions, mas trazendo uma energia diferenciada ao mercado com sua abordagem vibrante. Com uma trajetória marcada pela introdução de talentos emergentes, como o jovem produtor Culoe De Song, e pela colaboração com artistas sul africanos influentes como Shimza, Thakzin e Enoo Napa, a Soulistic Music foi fundamental para moldar o Afro House como conhecemos hoje, reforçando sua posição como uma das gravadoras mais queridas e respeitadas da era digital. 

Moblack Records

A Moblack Records desempenha um papel fundamental na ascensão e consolidação do Afro House, destacando-se como um dos principais protagonistas desde os primórdios do gênero. Fundada por Mimmo Falcone, conhecido como MoBlack, a gravadora italiana tem sido um pilar na inovação e expansão do Afro House, chancelando trabalhos dos principais expoentes do estilo como Dele Sosimi, Armonica, Sobek, David Morales, Sparrow & Barbossa, além do próprio MoBlack e dos já citados Floyd Lavine e Enoo Napa. A experiência de Falcone, adquirida durante seus dez anos vividos em Gana, trouxe uma perspectiva única e autêntica para a gravadora, permitindo-lhe criar lançamentos que se destacavam no cenário e que garantiam suportes dos grandes medalhões da música eletrônica como Black Coffee, Ame, Dixon, Solomun e Pete Tong.

Yoruba

Comandada por um dos grandes nomes da música africana, Osunlade, a Yoruba Records foi fundada em 1999 e se estabeleceu como uma referência na cena da Dance Music sobretudo através das esferas do Deep House ao Soulful Jazz. Porém o catálogo sempre evidenciou a riqueza dos ritmos africanos que contornam a essência do Afro House, o que apesar de não se posicionar como uma referência do estilo propriamente dito, chancelou trabalhos que moldaram o aspecto do gênero antes mesmo de se tornar popular no cenário eletrônico. Além de boa parte dos clássicos lendários de Osunlade, a Yoruba também assinou trabalhos de artistas como Afefe Iku, Kiko Navarro, Kevin Reynolds, Sunlightsquare e Toto Chiavetta.

Menções honrosas

A lista acima não é um ranking ou verdade absoluta. Outros nomes também tiveram o mesmo nível de importância e poderiam estar presentes com um maior detalhamento, mas atendendo a ideia original do texto, tais escolhas traçam muito bem o caminho. Em paralelo, é válido mencionar Pablo Fierro, produtor absolutamente respeitado dentro da comunidade e que ainda segue impactando nomes da nova geração. Hyenah, que com sua identidade visual e sonora expandiu as possibilidades de alcance do Afro House e foi um dos primeiros nomes a realizar turnês mundiais com a bandeira do estilo. AMEMÉ e Francis Mercier, que mais recentemente despontaram com um trabalho de lançamentos de sucesso e presença dominante nas redes sociais. Nitefreak, que a partir do Zimbabwe embarcou em uma bela trajetória e hoje é um dos artistas mais promissores do estilo. Além de uma ampla camada de produtores que ainda não tiveram um super desempenho em shows pelo mundo, mas tem projetos e gravadoras ativas que são protagonistas nesse contexto, entre eles Emanuele Esposito (Switch Records), Enzo Siffredi (Wired), e Simone Vitullo (Go Deeva)

A música conecta. 

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