Que saudade de uma pista de dança! Não importa se você prefere fechadinha, mais arejada, gigante e aberta, o sentimento é unânime, já que há um ano não nos encontramos em qualquer uma dessas. O Around The World é uma coluna dedicada a espaços ou festas que cultivam o amor pela dança e bons encontros, musicais e interpessoais, e mesmo que ainda não possamos viver tudo isso, a gente segue te apresentando novos lugares por esse mundão e, neste momento, principalmente quem segue ativo, proporcionando entretenimento da forma que puder.
É o caso desse club veterano de Portugal, situado em Lisboa, considerado um dos melhores do país. Lux Frágil abriu suas portas em 1998 e tem em seu conceito ser muito mais que um club de música eletrônica, o que é uma grande verdade. Além da pista de dança, eles apresentam shows de outros estilos, performances, exposições, apresentações de livros e discos, bar, e até mesmo set de filmagem para programas de televisão.
Manter um estabelecimento cultural dessa abrangência por quase 23 anos e com excelência não é uma tarefa fácil e, sendo assim, não poderia ser fundado e administrado por inexperientes. O Lux Frágil é fruto do trabalho longínquo do empresário ligado às artes Manuel Reis, que antes da abertura do club comandava o primogênito Frágil, um espaço relativamente exclusivo, pequeno, frequentado por uma certa elite cultural. O Frágil iniciou seus trabalhos em 1982, ou seja,16 anos antes do Lux.
Na época, a turma que se interessava por cinema, música, artes plásticas ou trabalhava nessa área eram os frequentadores do Frágil e, considerando que em seus primeiros anos vivia-se em um período onde a cultura do DJ era completamente diferente e a música eletrônica para pista de dança sequer havia iniciado seu processo de disseminação global, o som era outro e o público muito menor.
Dez anos se passaram e um evento em comemoração ao aniversário do Frágil fora do club foi organizado sem saber o que viria depois. A festa aconteceu em um edifício industrial que foi completamente transformado para uma noite histórica no cenário musical de Lisboa, afirmando alguns veteranos da música local que este provavelmente foi o primeiro evento em lugar inusitado na cidade. O que era pra ser uma comemoração deu início a uma série de outras festas e, depois de um tempo, surgiu o convite para que o Frágil transferisse sua localização para aquela região. Eis que nasce o Lux Frágil.
Sem perder seus princípios enquanto club e disseminador de cultura, o Lux Frágil se estabeleceu em uma área pouco frequentada da cidade, o que por alguns períodos gerou um certo medo na equipe de administradores e curadores do local – que permaneceram intactos, mesmo após a transferência de local – mas foi justamente por conta desses princípios que o local jamais morreu.
A começar pelos DJs residentes, que se mantém desde a existência do Frágil até hoje. Rui Vargas, Yen Sung, Tiago e Zé Pedro Moura não apenas foram responsáveis por encaminhar o conceito sonoro de ambos os estabelecimentos como DJs, mas também como seus curadores e, neste sentido, o club foi agraciado com mentes e ouvidos vanguardistas e de qualidade inegável. Dentre os artistas que passaram nos primeiros anos de Lux Frágil estão Kruder & Dorfmeister, St. Germain e Dixon, que se apresentou no club pela primeira vez há 20 anos.
Anos passaram e a curadoria segue implacável, com convidados como Caribou e festas promovidas por labels como Fuse, LXM, Bloop, além de sua abertura para outros estilos. Para se ter ideia, antes de virar pista de dança eletrônica, o club abre suas portas para shows de Rock e prepara o público para uma noite intensa de música. Ele também tem noites dedicadas ao Hip Hop, tudo acompanhado de um soundsystem de última geração e um ambiente espaçoso e moderno, que fecham com chave de ouro a experiência audiovisual do local.
Em 2018, o aniversário de 20 anos do Lux Frágil, que contou com uma comemoração intensa o ano todo, foi, infelizmente, acompanhado pelo falecimento de seu idealizador Manuel Reis. O mentor do Lux, contudo, segue vivo através do que deixou para toda a equipe que o gerencia hoje. Além disso, Reis deixa outro legado importantíssimo como o responsável por um dos 25 melhores clubs da Europa (título concedido pelo The Guardian) e por dar vida a uma área de Lisboa inimaginável, eis que, com a abertura do club na região industrial, abriram também restaurantes, uma loja de discos e galeria de arte.
A pandemia chegou e, assim como aconteceu em todo o mundo, o Lux fechou suas portas temporariamente, porém não o espírito. Realizou lives de diferentes estilos musicais, apresentações e, na metade de 2020, abriu suas portas como restaurante, com capacidade de público reduzida e cumprimento de todas as medidas de restrições necessárias para manter a segurança do público, artistas e staff.
Com dezenas de outros clubs e festivais em Portugal e Lisboa abrindo ao longo dos anos, o Lux continua como o maior bastião da cultura clubber no país, influenciando todo o cenário com sua inquietação permanente, que estimula a sua inovação e evolução constante, sem estagnar no tempo.
A música conecta.