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A música conecta

9 tópicos sombrios relacionados ao Spotify

Por Alan Medeiros em Artigos 10.12.2025

A cada fim de ano, o lançamento do Spotify Wrapped transforma o consumo musical em um evento social, reforçando a ideia de personalização extrema e conexão íntima com as tendências sonoras. Esse ritual anual também evidencia a centralidade do Spotify como maior plataforma global de streaming musical — uma empresa que ultrapassou receitas de €10 bilhões recentemente, embora opere em um modelo econômico mais frágil do que aparenta. Por trás da aparência de fluidez algorítmica e expansão global, há uma realidade estrutural, financeira e ética que levanta questões sérias sobre a sustentabilidade do ecossistema que sustenta artistas, selos e usuários.

Basicamente, o crescimento do Spotify depende da conversão do público gratuito em assinantes premium, responsáveis pela maior parcela de receita. Mas, historicamente, esse aumento de receita veio acompanhado de despesas ainda maiores. O resultado é uma empresa que, mesmo gigante, acumulou prejuízos em boa parte de sua trajetória — em grande parte devido ao alto custo de licenciamento de catálogos. Essa estrutura pesada levou o Spotify a adotar medidas drásticas, como reestruturações internas e mudanças em políticas de pagamento, num esforço para equilibrar custos e manter a competitividade.

Além das questões econômicas, o modelo de remuneração pro-rata continua sendo alvo de críticas por sua distribuição desigual, enquanto o sistema de recomendação, sustentado por coleta massiva de dados, levanta debates sobre privacidade e autonomia cultural. A seguir, separamos alguns dos pontos mais críticos que compõem a face menos celebrada do mundinho verde do Spotify:

Personalização agressiva baseada em dados

A personalização — vista como uma das mais sofisticadas da indústria — depende de um monitoramento contínuo do comportamento do usuário: histórico de escuta, padrões diários, preferências contextuais. O Discover Weekly é frequentemente citado como exemplo de precisão algorítmica. No entanto, essa eficácia parte de um volume de dados pessoais que transforma a experiência musical em um processo calculado, redesenhando o papel da escuta como algo profundamente mediado por algoritmos.

Dependência crítica das gravadoras Majors

Como não produz conteúdo original em escala significativa, o Spotify depende de acordos constantes com grandes players como Universal, Sony e Warner. Essa dependência estrutural concentra grande parte das despesas em royalties, reduzindo margens operacionais e aumentando a vulnerabilidade em renegociações. A plataforma permanece, portanto, presa a um ecossistema em que ela não controla o principal ativo que comercializa: a música.

Risco e custo da não produção de conteúdo próprio

A ausência de catálogos próprios implica a necessidade contínua de compra de direitos autorais — um processo caro e incerto, que também compromete grande parte da receita. Analistas sugerem que uma estratégia de mitigação poderia envolver a criação de um selo próprio, inspirado no modelo de conteúdo original adotado por plataformas de vídeo. Essa alternativa, porém, exigiria investimento pesado e alteraria profundamente o posicionamento atual da empresa.

Fraude e streams inflados artificialmente

O aumento de gravações funcionais (como white noise) e a manipulação de streams levou o Spotify a implementar novas regras. Desde de 2024, apenas faixas com mais de 1.000 streams anuais entram na fórmula de pagamento — mudança justificada pelo combate a fraudes, mas também pelo objetivo de reduzir custos administrativos. O impacto real dessa medida recai especialmente sobre artistas pequenos e gêneros de nicho, que dependem desses micro ganhos.

Instabilidade corporativa e demissões em massa

Apesar da receita bilionária, os altos custos operacionais — sobretudo ligado a royalties — comprimem a capacidade de investimento. Em 2023, a empresa reduziu significativamente sua força de trabalho global como forma de reequilibrar despesas e liberar capital para inovação, revelando a tensão constante entre expansão e contenção de custos.

Mudança na relação de posse e coleção

O streaming substituiu a noção de posse musical pela lógica do acesso temporário. A coleção física — antes marcador cultural, social e afetivo — foi substituída por playlists, que funcionam como formas de auto expressão, mas sem materialidade e sem garantia de permanência. Essa mudança altera o modo como a memória musical é construída e preservada, segundo muitos críticos, para pior. 

Limitações de inovação e dependência de um modelo único

O modelo de receita centrado quase exclusivamente em assinaturas e anúncios limita a capacidade de diversificação. A desaceleração no crescimento desde 2019 expõe fragilidades dessa dependência. No campo da inovação, o Spotify frequentemente reage a movimentos do mercado em vez de liderá-los, o que enfraquece seu papel como agente transformador dentro da indústria.

Spotify como tecnologia de vigilância

O sistema não apenas distribui música; ele monitora padrões precisos de consumo. Esse rastreamento granular — essencial para a personalização — funciona, na prática, como uma tecnologia de vigilância. O modelo de plataforma pressupõe que cada ação do usuário seja coletada, interpretada e utilizada para moldar experiências futuras, criando uma relação assimétrica entre quem ouve e quem controla os fluxos de informação.

Viés algorítmico e remuneração em desarmonia

O modelo pro-rata já privilegia artistas com audiências massivas e ouvintes hiperativos. Propostas recentes, como o modelo centrado no artista, buscam corrigir esse desequilíbrio reduzindo a remuneração de streams gerados por algoritmos — o que, paradoxalmente, penaliza ainda mais quem depende de playlists editoriais para ter visibilidade. Simulações indicam perdas significativas para faixas não escolhidas diretamente pelo usuário, evidenciando uma tensão crescente entre lógica algorítmica e critérios de pagamento.

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