Skip to content
A música conecta

O DNA musical do Primavera Sound

Por Ágatha Prado em Editorial 16.12.2021

Para um festival de música conquistar o disputado ranking de um dos melhores do mundo, ele precisa promover uma experiência única. Uma experiência que advém de um conjunto de fatores que vai além da própria proposta musical, conectando espaço, estrutura, clima, qualidade, cultura e todo um complexo coerente que faça do evento, uma tradição histórica, inovadora e sempre surpreendente. 

É exatamente por isso que o festival catalão Primavera Sound está entre os maiores do mundo inteiro. Fundado em 2001, o foco do projeto sempre foi integrar a alta cultura musical, sem se limitar a gêneros, vertentes ou tendências, mantendo o foco principal no tempo presente, e no que faz sentido para cada edição se tornar única e profundamente especial. 

Ao longo de suas quase 20 edições, o Primavera Sound mostrou que  é muito mais do que um festival de música, e sim uma verdadeira ocupação cultural e democrática, feito por fãs reais de música e não somente por grandes empresários. 

Quando digo ocupação, pense em uma cidade como Barcelona que dias antes, durante e após o festival, fica tomada – por todos os cantos – de apresentações que visam conectar o público geral da cidade ao ambiente do Primavera Sound. É como uma celebração coletiva, que festeja a chegada da estação sabendo que por lá encontrarão artistas que há anos desejavam vê-los, bandas desconhecidas que se tornarão suas favoritas, e artistas que surpreenderão as expectativas. E essa é a maior beleza do Primavera Sound, saber que o line-up estará lá para te surpreender, sem previsibilidades como ocorrem nos demais festivais de grande porte.

Musicalmente falando, o Primavera Sound é uma química de múltiplas variáveis complexas de serem sintetizadas ou decifradas. Num mesmo line, podemos encontrar ícones do Indie Rock como Strokes e Interpol, a grande musa do Punk Rock Patti Smith, bem como o Post Rock de Death From Above 1979, o Pop de James Blake, o psicodelismo de Chet Faker, além do Techno Peak Time de Richie Hawtin, o House do brasileiro de Gui Boratto e os experimentalismos ácidos de Roman Flügel. Consegue flagrar o dinamismo e amplitude da proposta?

É possível comparar o Primavera com os grandes festivais mundiais de Rock e Pop como Rock in Rio e Lollapalooza? E com os big eventos de música eletrônica como o Dekmantel? Bom, a resposta é sim e ao mesmo tempo não. 

Primeiro porque quando pensamos em Rock in Rio, pensamos em grandes marcas e patrocínios, e quando falamos sobre Lollapalooza falamos sobre grandes bandas. E não é que o Primavera também não traga big bands, ou não esteja vinculado à marcas para o patrocínio de seus eventos, mas esses aspectos não são as peças-chaves que influenciam a curadoria de seus line-ups. O Primavera Sound se baseia em especial, nas temporadas de cada artista, no momento de carreira em que eles se encontram e especialmente, o que eles representam para o contexto da edição do festival. Essa proposta central faz sentido não somente através de grandes nomes que estão nos topos das paradas musicais, ou que movimentam legião de fãs pelo mundo, mas também de novos projetos que possuem um potencial intrinsecamente ligado ao propósito de capturar o espírito de um tempo, ou de uma geração.

Na última edição de 2019, em Barcelona, o festival ousou em consagrar um line up majoritariamente feminino, e sua campanha de promoção foi um verdadeiro manifesto contra a ditadura do correto, evocando o poder da mulher de ponta a ponta durante a edição. Protagonizado por estrelas como Solange, Charli XCX, Janelle Monáe, Erykah Badu, Robyn, FKA Twigs, Rosália, Miley Cyrus, Peggy Gou,  Nina Kraviz, Róisín Murphy que dividiram os palcos com Interpol, Tame Impala, Modeselektor, Mac Demarco, Cybotron, Apparat e James Blake, ficou claro o propósito do Primavera Sound: desafiar algoritmos.

O próprio nome que batiza o festival já relembra, a estação das flores. E não é por acaso, que as datas escolhidas para todas as edições, coincide com a chegada da estação. Por isso, nada mais natural do que um clima leve, espirituoso, artístico, colorido, psicodélico e virtuoso. E essa identidade, os produtores do projeto fazem questão de incorporar não somente em Barcelona que é a sede do festival, como também em suas edições em Porto, e suas futuras agendas no continente americano. Segundo os realizadores, não é a intenção do Primavera exportar seu conceito de forma exatamente igual à sede catalã, como os moldes Mcdonald’s ou Starbucks, mas sim fazer um misto de nuances com as propostas da cidade escolhida, valorizando a cultura local e as características que ela tem a oferecer. 

E o público brasileiro já pode preparar o look, que o Primavera Sound já anunciou a data de estreia em terras tupiniquins. A primeira edição na América Latina, acontecerá em São Paulo entre os dias 31 de outubro a 6 de novembro, e será realizado em parceria com a Beck’s. O local escolhido, será o sambódromo do Anhembi, considerado pela equipe um lugar onde é sensorialmente próximo ao clima de Barcelona, e o mais interessante, é que pela primeira vez o espaço será usado em sua plenitude de 400 mil metros quadrados. Além disso, o festival também vai contar com atrações gratuitas espalhadas pela cidade, em paralelo ao evento, tornando a capital paulista uma verdadeira ocupação cultural. 

Além do Brasil, a Argentina e o Chile também entram para o rota do Primavera em 2022, e podemos esperar uma sinergia entre os eventos que acontecerão em datas bem próximas. Sobre o que esperar do line-up? Bom, só temos uma certeza: será surpreendente. 

A música conecta.

A MÚSICA CONECTA 2012 2024