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A música conecta

A beleza insustentável de não existir o melhor

Por Júlia Arenhart em Notes 07.11.2025

Viver a cena eletrônica me ensinou que existe uma busca insustentável, por parte de alguns DJs e produtores, em querer estar sempre à frente dos outros. Muitas vezes, essa busca se perde na pressa e na ilusão de querer ser “o melhor”. A visão ideal seria compreendermos, de fato, que cada artista carrega um universo próprio, uma pesquisa moldada por experiências que ninguém mais viveu. E que a pista, quando é verdadeira, não premia a disputa: ela acolhe o que é autêntico.

E é aí que mora a beleza: na vulnerabilidade de quem se permite errar, acertar, experimentar, construir histórias em forma de som. Ultimamente, isso se torna distante pela pressão pré-moldada do momento ou do público presente. Falta, na cena de hoje, coragem? Coragem de experimentar a pista, de não dar de bandeja o que se acha que esperam, de testar sem medo, de “educar” o público com algo novo. Ousado, mas seria a realidade perfeita no meu mundo.

Se houvesse também mais respeito por quem ousa ser diferente, saber ouvir, sem julgamento. Penso nos artistas que se afastam justamente por esse “modus operandi” da cena. Pessoas com muito talento, que cansam e, em algum momento, se negam a continuar participando do meio. Não há mérito em querer estar acima, porque a música não é escada, é espiral. Ela gira, se transforma e volta diferente, igual, depois de anos. Se repete, é tudo cíclico. Cíclico. Um sentimento impagável também para quem já pertence há muito tempo respirando música. 

Reviver algo… “os tempos de ouro”. O artista que entende isso não toca para provar nada, toca para sentir. E quem sente de verdade não precisa derrotar o outro. A cena se perde quando confunde ego com entrega. O que me fascina são os que tocam como quem conversa, os que conduzem como quem respira. Os que constroem sem pressa, que sabem esperar o silêncio, que entendem que a pista também precisa de espaço para existir, absorver e entender — mesmo que isso seja um “risco”. É sobre isso. 

Já vi noites em que a surpresa venceu o nome. Em que o comando de pista veio de quem só queria fazer sentido, e não explosões. Esses são os momentos que ficam — quando o som se torna experiência, e não mera performance. No fim, o que me move é isso: saber que nunca haverá “o melhor”, porque esse ideal não existe. 

O que existe é o instante em que tudo se alinha e saber ser parte desse processo já é o suficiente. É admirar e ser gratificante receber a surpresa do desconhecido vindo de quem você não espera. É isso que torna tudo especial: o sentimento e a sabedoria de saber que nunca se está pronto para o que o outro tem a oferecer e que esse algo pode ser tão bom quanto o seu. 

Dedicação, talento e pesquisa são coisas que jamais serão zeradas. É insustentável saber tudo de tudo. E é justamente isso que torna único o amor constante pela música e por nossos artistas.

A MÚSICA CONECTA 2012 2025