Lembro-me a primeira vez que vi o D-Nox & Beckers em uma festa. Faz anos (risos de nervoso). A apresentação foi realmente marcante pois era uma das primeiras vezes que escutava sons mais progressivos e um Techno dançante. Uma, duas, três… não posso afirmar com precisão quantas vezes já presenciei apresentações de ambos os artistas, como dupla e também solo, mas posso dizer que eles fazem parte do meu desenvolvimento musical e do desenvolvimento do cenário da música eletrônica brasileira, com quem eles têm uma relação de muito carinho.
Quase 20 anos de projeto, um passeio longo por muitos estilos sonoros e um constante aprendizado mútuo entre um grande conhecedor de instrumentos orgânicos com um especialista da música eletrônica, D-Nox & Beckers solidificaram seu trabalho através de lançamentos de qualidade e sets carismáticos, como os que eu escutei ao longo dos anos e como o apresentado no videoset gravado no topo do Bode Museum, em Berlim, em parceria com o projeto SPOT Berlin Art. e incentivado pelo Ministério da Cultura Alemão.
D-Nox também acaba de lançar a faixa Silence, co-produzida com a dupla brasileira Baya, através da Armada Electronics, e tem muitas outras novidades vindas do seu estúdio para os próximos meses. Conversamos com ele sobre o projeto com Beckers, lançamentos, opiniões sobre o cenário da música e outros assuntos. Acompanhe!
Alataj: Olá pessoal, tudo bem? Obrigada por falar com a gente! Mais de 15 anos de projeto rodando o mundo entre clubs e festivais renomados. Como vocês avaliam a evolução do projeto desde o seu surgimento até hoje?
D-Nox & Beckers: Olá. Bem, acreditamos que a principal razão é que sempre estivemos fazendo música pelo amor pela música e o que está dentro dela. Dinheiro ou fama nunca foram nosso interesse. Nós nos unimos há muitos anos porque tínhamos a ideia de criar nossa visão da música eletrônica, de dança e de compartilhar isso com o mundo e mover pistas de dança ao redor do mundo. Não tínhamos ideia naquela época que o caminho que escolhemos nos levaria a um passeio tão maravilhoso por tantos países, festivais e clubes, mas estamos mais do que felizes com isso porque mostra que nosso som faz as pessoas dançarem.
Cada um de vocês trilhou uma história diferente até a formação do projeto. Vocês conseguem enxergar os traços das bases musicais de cada um na hora de tocar ou produzir suas músicas?
Sim, é muito claro de se ver e é isso também que diferencia o nosso som. Nosso som é a fusão de dois mundos em confrontos. De um lado está o Beckers e sua história e conhecimento muito profundos de tocar música em bandas e com instrumentos reais e do outro lado estou eu (D-Nox) que sou apenas DJ. Já que um sabe tudo sobre música e harmonias, o outro sabe tudo do que é preciso para fazer uma faixa se tornar a peça certa para a pista de dança.
Cada um de vocês mantém seus projetos individuais e, com o passar dos anos, a percepção musical e experiências vividas refletem na maneira de enxergar a música e o trabalho. Como vocês lidam com essas evoluções na hora de trabalharem juntos, já que o projeto segue uma linha sonora relativamente específica?
Esta é uma pergunta muito boa. Para quem acompanha o nosso som desde o início, saiba que nunca ficamos presos no mesmo estilo e que sempre envolvemos nossas produções. Já que nós dois também somos DJs e ouvimos todo tipo de música de outros produtores e com todas as viagens e toda a inspiração que coletamos, sempre tivemos o desejo de melhorar e experimentar estilos diferentes. Mas no final do dia temos algo dentro da nossa música que pode ser algo como uma marca registrada. Nosso som!
No final de novembro você lançou a faixa Silence, da Armada Electronics, que foi co-produzida com a dupla brasileira Baya. Como surgiu a ideia deste projeto? Como o fluxo de trabalho do estúdio aconteceu entre vocês?
Baya e eu nos tornamos amigos no processo para reunir minhas compilações de paixão. Eles executam outro projeto conhecido como luthier, mas as demos que eles me enviaram eram muito mais profundas e melódicas do que seu som normal e eu recomendei que encontrassem outro nome de projeto para esse tipo de som. A resposta à música deles na pista de dança foi muito boa e também o feedback de outros DJs. Foi quando decidimos criar música juntos. E com a incrível voz de Lenn V, pensamos que seria melhor lançar nossa música em uma grande gravadora e é assim que chegamos à Armada.
Vocês acabam de lançar um gravado em Berlim no topo do Bode Museum pelo projeto SPOT Berlin Art. Como aconteceu esse convite? Vocês escolheram o lugar em conjunto? Como foi a gravação?
Fomos convidados por uma produtora berlinense especializada na criação de eventos em locais especiais. Eles e o ministro da Cultura da cidade de Berlim escolheram alguns locais e decidimos que o telhado do mundialmente conhecido Museu Bode poderia ser o lugar certo para este vídeo. Foi um projeto muito empolgante, já que normalmente ninguém tem acesso ao telhado deste museu. A vista lá de cima é simplesmente incrível e representa a beleza do centro histórico de Berlim de um ângulo que ninguém viu antes. Antes da gravação, Beckers e eu decidimos quais faixas iríamos tocar e preparamos um conjunto híbrido que é uma mistura de eu no djing e Beckers tocando sintetizador ao vivo em cima dele.
Esta série de apresentações é uma iniciativa do próprio Ministério da Cultura Alemão e a valorização da cultura eletrônica no país é uma realidade bem distinta no Brasil e em outros países, mesmo em um período onde a música eletrônica é mais forte que nunca. Como vocês enxergam essa relação ainda conturbada entre políticas, governos e a música eletrônica em alguns países?
Sim, a ideia da cidade de Berlim era mostrar imagens do que há dentro do museu ligado à música eletrônica. Quase ninguém mais jovem vai a um museu e como você pode ver o resultado é magnífico e combina muito bem a arte clássica com a música moderna. A relação entre a política e todo esse povo conservador e a cultura jovem sempre foi ruim e, como podemos ver agora, nesta pandemia é ainda pior como pensávamos, já que os governos parecem dar a mínima para artistas, músicos, produtores, donos de clubs , produtores de eventos, atores e todas as pessoas envolvidas desde que haja apoio ZERO. Os políticos também no Brasil precisam agir muito em breve e mostrar algum apoio para que todas essas pessoas que dedicaram sua vida à arte e à cultura sobrevivam. Na Alemanha não é muito melhor e acho que isso vale para todos os países do mundo. Parece que arte/cultura não tem valor e nós parece esquecido.
Falando em Brasil, vocês possuem uma relação muito estreita com nosso país enquanto projeto, sendo autores de sets memoráveis em eventos por todo o Brasil. A que vocês devem essa conexão tão bonita? Algum momento em especial gravado em suas memórias?
Acredito que seja porque somos autênticos e nunca tivemos problema em mostrar nosso amor por este lindo país. Mas o que nos coloca nessa situação é o fato de que quando fomos bookados para o Brasil pela primeira vez, não havia nada que representássemos, nosso som, nosso estilo e groove. Isso era inédito e trouxemos esse ritmo mais lento para o Brasil. Sem nós talvez tenha havido uma evolução diferente da música eletrônica no Brasil. Havia Psy Trance, Techno e Drum & Bass, mas ninguém ouviu falar de House Progressivo como fazemos antes. E chegamos às pistas brasileiras na hora certa, quando as pessoas estavam precisando de outra coisa e poderíamos dar para elas, até hoje.
Não podemos deixar de comentar sobre a situação que o mundo do entretenimento está vivendo. Como estão passando por este período de reclusão? Acreditam que haverá muitas mudanças quando retornarmos completamente às atividades?
Não sabemos por quanto tempo isso vai durar, mas parece que uma vez acabado nada mais será como antes. Muitos donos de clubs vão fechar, muitos promotores vão à falência e muitos artistas terão que encontrar uma renda diferente para pagar suas contas. No nosso caso, temos a sorte de ter uma base de fãs que ainda compra nossa música. Agora estamos remixando muito e trabalhamos em um grande projeto de masterclass que queremos expandir e continuar com módulos extras. Mas é um momento muito difícil para se estar vivo. Isso mudará definitivamente nosso mundo e sociedade. Quanto mais tempo for preciso, maiores serão as mudanças.
Esse ano vocês lançaram o EP Bitter Rain e agora o vídeo set. Teremos ainda mais alguma novidade vindo de vocês em 2020?
Em 2020 não haverá nenhum lançamento de singles novos do projeto, mas como eu disse acima, alguns dos remixes em que estivemos trabalhando serão lançados. Mas a maior parte do que produzimos sairá apenas em 2021. Eu, como D-Nox, tive muitos lançamentos que criei com amigos de todo o mundo como Kalil, Baya, Gai Barone, Stan Kolev e outros. Nosso próximo EP, Reception, sairá em 15 de janeiro de 2021 e será lançado pelo meu selo Sprout.
A música conecta.