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A música conecta

E os meus DJs preferidos?

Por Redação Alataj em Notes 09.07.2025

Texto por João Castro

A cada anúncio de lineup, a reação se repete. Parte do público celebra, outra parte reclama. Se por um lado isso faz parte da dinâmica natural entre oferta e demanda no entretenimento, por outro, levanta uma questão mais complexa: por que a insatisfação tornou-se tão recorrente e com volume tão alto nas redes sociais?

Mais do que uma crítica objetiva à qualidade de um lineup, o que se manifesta é uma disputa por atenção. Cada seleção carrega um sistema de desejos e o público reage a partir daquilo que esperava ver, do que considera legítimo ou representativo. Muitas vezes, a frustração não é tanto com quem está no cartaz, mas com quem não está. Não ver seus artistas preferidos numa festa é também sentir-se menos representado, menos incluído naquela experiência.

A curadoria de eventos, especialmente em contextos independentes, precisa lidar com variáveis complexas: negociações, orçamentos, logística internacional, calendário competitivo e riscos comerciais. Nomes consagrados costumam ser prioridade porque representam mais do que boa música, oferecem garantia de público, confiança na bilheteria e menor margem de erro. Isso não significa falta de visão, mas sim resposta a um ecossistema que raramente tolera fracassos.

Ao mesmo tempo, é verdade que muitos eventos repetem estéticas e padrões, girando em torno das mesmas referências. Isso pode ser sintoma de um mercado saturado, mas também de um público que busca novidades sem estar disposto a abandonar a familiaridade. Queremos algo novo, mas que remeta àquilo que já conhecemos. Um paradoxo comum em qualquer ciclo cultural de massa.

É aí que entra o papel da comunicação. Mais do que anunciar nomes, eventos que conseguem apresentar suas escolhas com clareza, explicando o porquê de cada presença, contextualizando sonoramente e conectando artista e público, ampliam as chances de engajamento real. Boas curadorias não são só sobre quem toca, mas sobre como essa presença se articula com o imaginário do evento. E isso inclui preparar o público para escutar o que ainda não conhece.

É nesse ponto que também vale reforçar: a festa precisa ser, ela mesma, um headliner. A construção de uma identidade sólida — visual, experiência, curadoria — é o que permite que o público confie no evento para além da escalação. Quando o club ou festival é desejado por sua atmosfera, pela coerência das edições anteriores ou pela forma como se insere na cena, o lineup deixa de ser o único fator de atração. E isso é estratégico: reduz a dependência de grandes nomes, fortalece o senso de comunidade e sustenta uma narrativa de longo prazo.

A crítica, portanto, também deve olhar para si. O cenário atual oferece mais acesso, informação e possibilidades do que nunca. Mas talvez o ponto seja outro: será que sabemos o que fazer com tudo isso? Entre o desejo por experiências únicas e a ansiedade por representatividade total, o que está em jogo é a relação entre arte e expectativa, curadoria e projeção, ultra presente no imaginário coletivo clubber em época de hiperconectividade. 

No fim, todo lineup é uma narrativa. Nem sempre ela vai coincidir com a nossa, mas talvez a pergunta mais honesta não seja “por que meu artista não está?”, e sim “o que essa curadoria está tentando dizer. Eu estou disposto a ouvir?”.

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