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A música conecta

Alataj entrevista Forró RED Light

Por Alan Medeiros em Entrevistas 15.10.2019

O ser humano tem como comportamento natural se interessar pelo novo, pelo diferente. Talvez isso explique um pouco a grande aceitação que o duo Forró RED Light teve ao longo de 2019. Após surgir como uma grande revelação de 2019, Geninho Nacanoa e Ramiro Galas pisaram no acelerador e chegaram a diferentes regiões do país apresentando o DNA único do Jegue, como carinhosamente eles chamam o projeto. 

O background musical de cada um dos membros nos ajuda a entender o sucesso da dupla até aqui. Geninho é músico e produtor, fez parte do grupo HaONO e através do Unos Coletivo promove intercâmbios Brasil-África com integração de arte urbana. Na Iandé Radiola dos Povos, Geninho trabalha com o rádio poste em eventos indígenas e paralelamente a isso, desenvolve arte-educação em projetos sociais ligados ao meio ambiente e a música. 

Já Ramiro é um jovem produtor formado em Letras e mestre pelo programa Música em Contexto da Universidade de Brasília. Galas possui estudos publicados sobre a cultura do DJ, uso do sample e o papel das redes sociais na circulação musical. Seu currículo nos estúdios conta com a participação na criação de trilhas sonoras para espetáculos cênicos, curtas e longa-metragens. 

A nosso convite, eles participaram do bate-papo abaixo, que traz um novo panorama sobre a carreira e perfil do Forró RED Light: 

Alataj: Olá, Geninho e Ramiro! Muito obrigado por falar conosco. Pra começar, uma dúvida básica que me vem a cabeça: forró ou música eletrônica, qual destes dois estilos surgiu primeiro na vida de vocês?

Forró RED Light: O Forró RED Light é um encontro de gerações. Geninho é músico, compositor e atuante da cena musical do DF desde os Anos 1990, muitas bandas e rolês nas costas. Lá pelos anos 2000, pareceu natural se tornar um DJ e trazer as influências regionais, do mundo e da vida de músico pras pistas de dança. Já imaginaram aí a carta na manga que é um bom forró numa pista?

Ramiro vem da cena techno. Desde 2008 produz música eletrônica e faz live. Tocou com alguns projetos nos festivais de música eletrônica pelo Brasil. Na busca de entrar mais ainda na música, foi fazer mestrado, topou produzir diferentes estilos, trabalhou com trilhas para cinema e teatro, música experimental e por aí vai. 

O encontro do RED Light vem dessa busca dos dois. Geninho tinha tido a visão de misturar loops eletrônicos e instrumentos orgânicos numa pegada bem forró e Ramiro comprou a ideia e entrou com esse arcabouço eletrônico, para começarem a experimentar, juntos, por uns 2 anos, antes da primeira apresentação, o que viria a ser o Forró RED Light.   

Sempre fui muito curioso sobre o workflow de duplas e trios de música eletrônica. Como isso funciona exatamente pra vocês?

Primeiro vem a música, independentemente de ser música eletrônica ou forró, existe sempre uma essência, que é gene da história. Depois vão sendo trabalhadas as batidas, os arranjos, os samples e efeitos. Numa outra etapa, levamos tudo isso para o projeto do live act, quando remontamos as composições em tempo real.

Vamos citar alguns processos pra vocês sacarem. Tem umas 3 músicas fruto de uma única jam que o Geninho improvisou na guitarra e o Ramiro gravou tudo, depois a gente selecionou os trechos e fechou as tracks. Já teve música que o Geninho fez com outros parceiros, mas botou no RED Light, Ramiro também. Uns projetos Ramiro começa, outros o Geninho… assim vamos criando, de forma livre e coletiva, mas sempre terminando juntos essas músicas que nascem de diferentes maneiras.

Dentro do projeto existe uma certa estética musical, que vem dessa mistura da música brasileira, da música percussiva, música nordestina e junta com isso essa cara moderna de música eletrônica, então já existe um ciclo de tradição e inovação; as músicas são trabalhadas nesse contexto e estamos atento a isso com os laboratórios que são feitos dentro dos nossos home-studios e, a partir disso, vão surgindo as formas, os testes, os arranjos. Muito do que é criado vem da reação da pista e, nas apresentações, vamos sacando o que está ou não funcionando, sentimos o impacto no público, que dá o feedback para acertos finais.

Mirai No, EP lançado pela Massa Records, ganhou um belo remix do britânico Hammer. Como foi pra vocês ter uma das faixas do FRL revisitada por um artista deste porte?

Para gente foi uma surpresa, não tínhamos a dimensão do trabalho dele e ficamos muito felizes com a ponte feita pelo Renato Cohen! Foi uma ótima experiência para gente ver o resultado do remix, ele criou o universo musical bem diferenciado do nosso, foi uma grande honra ver nossa música transformada. Esse remix tem trazido ótimos frutos! Essa parceria foi massa demais!

Gonzagueando, também presente neste EP da Massa Records, é uma das faixas mais belas que já ouvi nos últimos tempos. Pessoalmente, o que representa pra vocês trazer o mestre Gonzaguinha para a música eletrônica?

A música do Gonzaga sempre foi base para o nosso repertório, então, para a gente foi um processo bem natural, ele era referência na concepção do projeto desde sempre. Tentamos trazer a essência do ritmo e das batidas do que ele ajudou a criar nos anos 40. Então atualizar uma coisa que já existe há muito tempo e que sempre foi extremamente moderna e inovadora foi para a gente um mamão com açúcar, uma sopa no mel!

Essa música, como muitas outras, foi feita dentro do show, a gente já executava ela no live e depois tivemos que adaptar para poder montar a faixa. Sabe os trechos de guitarra gravados numa única jam? Então, essa é uma delas. Escolhemos os trechos e fechamos o arranjo! Aí, revisitando vinis antigos do Geninho achamos esse sample do mestre Gonzagão. No final achamos que ficou bem a nossa cara Forró RED Light, um baião “mudernizado”.

Depois da participação de vocês no Xama, percebo que algumas portas se abriram no circuito eletrônico brasileiro. Como vocês resumem este novo momento para o projeto?

Portas não, portais! Que ano está sendo 2019 pra gente. Esse festival marcou o projeto! Lá tem muita gente ativa e antenada na cena. Quer lugar melhor pra tocar? Estamos muito animados, indo e conhecendo vários Brasis abertos para essa mistura. Sem contar que ainda estamos com uma agência bem maneira, a Coral.

Nesse momento, as coisas estão muito grandiosas para a gente. A possibilidade de levar o show para um público diferenciado, que a gente não esperava chegar tão rápido e com o show que a gente montou com grande carinho, é muito massa! A gente via que tinha uma coisa legal e mostrar para mais gente sempre foi nosso sonho! Chegar a mais pessoas, despertar sentimentos, ver na cara do público a expressão de alegria vendo o que a gente está tocando. Isso é o que vale para um músico, para um projeto que se faz com carinho.

Foto: reprodução [Gop Tun]

Do ponto de vista técnico, como é estruturado o live do Forró RED Light?

Então, lembra daqueles 2 anos antes da gente começar a tocar valendo? Foi daí que montamos essa estrutura. Ramiro, com o background do live de techno, sugeriu a estrutura de “cenas” do Ableton Live e Geninho desenhou o setup múltiplo que ele tem hoje. Aí fica mais ou menos assim: Ramiro segura a base “aberta” no Ableton, podendo mutar e solar canais, fazer break, virada e loops a qualquer momento. Geninho, em outro computador, segura os samples e os instrumentos virtuais diversos disparados em tempo real, além de comandar o microfone, com as percussões, apitos e mandando aquele alô pra galera! 

Lançamentos: o que podemos esperar do projeto ainda para 2019?

Cara, além dessa super nova novidade que é trabalhar com essa agência, temos muito material quase pronto pra soltar! Há pouco lançamos um single muito legal, fruto desse workflow de criação que a gente comentou: Geninho começa a composição, Ramiro programa uns beats e uns synths em cima, gravamos uns solos do Ken Pontes, amigo e parceiro, e depois somos agraciados com um poema do mestre Renato Matos (procure saber). Assim nasceu o Eixão Surregional! Escutem aí galera!

Estamos trabalhando parcerias, depois do lançamento do single Eixão Surregional, vai sair o EP e mais uma coletânea com 10 artistas de Brasília, fazendo um recorte da nossa cidade e nosso momento cultural. Então tem bastante som novo sendo trabalhado, trazendo um pouco desse leque, desse caleidoscópio, dessas possibilidades infinitas que a música propicia.

Para finalizar, uma pergunta pessoal. O que a música representa na vida de vocês?

Ramiro: Faço música porque não consigo não fazer, é um trabalho cotidiano, uma vivência, envolve amigos, lembranças, sonhos.

Geninho: A música funciona para mim como uma espécie de entrar no campo de batalha e ao mesmo tempo uma fuga. Então você cria coisas que ainda não são, que quase não conseguimos expressar dentro das relações com a sociedade. Então aí você está fora e ao mesmo dentro do jogo. A música também trabalha nessa dialética de alinhamento do corpo, do espírito, do coração e da mente. Ela ocupa espaços vazios e chega com copo cheio. Ela trabalha dessa forma, dentro do meu coração e por aí afora.

A música conecta.

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