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A música conecta

Alataj entrevista Frontinn

Aqueles que já tiveram o prazer de imergir na proposta sonora obscura e dançante de Frontinn na pista conhecem sua perspicácia como seletora. Numa pesquisa que traz desde traços do Synthwave, Industrial, passando pelo Techno Lo-Fi e Electro, quem está na pista pode acabar-se tanto no headbanging quanto suar e balançar seus corpos com movimentos involuntários.

Frontinn na ODD

A carioca de 29 anos começou a carreira de forma despretensiosa no Rio tocando na festa Tilt que rolou na Fosfobox, quando tinha apenas 16 anos. Entrou pela porta dos fundos, se virou na hora com as CDJs e desde então passou a cultivar uma relação íntima com a discotecagem. Mudou-se para São Paulo, conheceu a trupe da ODD, ganhou espaço como residente, lançou logo no primeiro EP da ODDiscos e então passou a ser um nome muito conhecido no cenário underground paulista, inclusive estrelando o lineup do DGTL em 2019.

Agora, batemos de frente com Juliana Frontin para trocar uma ideia sobre seu primeiro álbum autoral, Underlying Problems. O disco, que chega oficialmente nesta sexta (29), contém oito faixas originais e é assinado pela ODDiscos. Abaixo você pode ouvir duas premieres que saíram recentemente pela Ramson Note e Connect enquanto aguardamos o trabalho completo.

Alataj: Frontinn, tudo bem? Obrigado por topar essa conversa. Vamos começar com (talvez) a pergunta mais difícil: o que esse álbum significa pra você? É uma representação artística de Frontinn em sua melhor forma?

Frontinn: Esse é meu primeiro álbum, ele tem uma importância enorme. Não sei dizer se é a minha melhor forma, mas ele é a tradução de um momento crucial. Não é uma compilação de faixas independentes, mas uma coisa só que eu fui compondo conforme a sensação de cada dia e quando eu fui colocar os títulos, eu percebi que tinha uma narrativa, ainda que quebrada, como num roteiro. Tinha introdução, acontecimentos, momentos mais dramáticos, existe o desenvolvimento de certos sentimentos que foram ficando mais intensos. 

Como foi o processo criativo desse álbum? Digo, foi algo planejado desde o início? O que te inspirou a dar vida nesse trampo?

Desde que a ODDiscos me incentivou a pensar na produção de um álbum no ano passado, eu passei a me organizar para compor mais, testar mais, coletar pensamentos dispersos reunindo diferentes tipos de equipamentos, tudo isso que eu já fazia, mais sistematicamente. Passei alguns meses no estúdio compondo e entrando numa espécie de “clima” e aos poucos a coisa foi se configurando até me surpreender em como o caminho já estava traçado.

Como um todo ele possui uma vibe bem misteriosa… Graves abafados, acentuados, beats quebrados e lentos, ambiências e texturas bem construídas… Existe alguma história específica por trás dele?

Seria bom a gente falar um pouco sobre materialidade: eu sempre coleto essas “texturas” de alguma forma, trazendo à tona as especificidades dos equipamentos, os ruídos, a compressão. É um processo constante de trabalhar com essas camadas ligadas aos equipamentos analógicos. Nesse sentido, não é uma história específica, é uma história contínua. Isso que você chama de “vibe misteriosa” na verdade é o que eu gosto de ouvir e o que gosto de fazer.

Você nunca foi de se encaixar nos moldes tradicionais se tratando de música, a gente vê isso como uma característica muito positiva, claro. Experimentações, tentativa e erro, dar a cara a tapa… essa coragem te ajudou a conhecer e entender a música de forma diferente?

Eu acho que todos nós estamos numa cena experimental e é esse o sentido do que estamos fazendo, buscar uma linguagem própria. É super bonito ver como cada um de nós produz de um jeito e como essas particularidades ficam evidentes nas sonoridades. Fica difícil imaginar alguém se encaixando, não vejo isso em mim, nos meus colegas ou nos lugares ao meu redor. Pra mim o som sempre foi um lugar de invenção, um lugar pra ir aonde ninguém foi e isso não tem modelo.

No início da sua carreira, quando você tocava com a galera do Radio Lixo, instrumentos baratos faziam sua diversão: fitas, vinis, sequenciadores, pedais e o que mais encontrasse pela frente. Imagino que isso tenha pesado bastante na identidade que você adota hoje em dia…

Música você faz com qualquer coisa, e naquela época eu estava interessada em coletar instrumentos descartados ou obsoletos e continuo usando todo tipo de equipamento que cruza meu caminho até hoje. Mas acho que com a Rádio Lixo, mais importante do que os equipamentos em si, era o hábito que a gente tinha de sempre questionar como usá-los e corromper a própria estrutura musical. Isso eu tenho sempre comigo. 

E quais são os principais projetos que fazem parte do seu background? Vimos que Gary Numan, Human League e Front 242 são alguns. O que mais você adicionaria?

Kraftwerk e Throbbing Gristle são fundamentais. Eu adicionaria também Pan Sonic, Douglas Gordon, Christian Marclay… 

Imagino que se juntar e aproximar da turma da ODD também estimulou ainda mais sua liberdade criativa. Quais os melhores presentes que essa união te proporcionou?

Quando acontece de juntar profissionalismo, técnica e afeto, é perfeito. E nosso encontro acabou indo muito além das festas, nos tornamos amigos. As trocas são sempre importantes, em todos os níveis… as muitas horas que passei com o Pedro no estúdio enquanto ele mixava o disco; as infindáveis conversas com o Davis, os back to back com o Marcio… Tudo isso é muito bom. 

Por fim, uma clássica do Alataj: o que a música representa na sua vida? 

O som é meu trabalho, meu interesse principal, e vai além da discotecagem ou da produção. Me interessa como esse fenômeno existe e como ocupa espaço, como se propaga, e como cria climas, conduz estados, como ele ocupa e como se desfaz.

A música conecta.

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