Uma das revelações da coletânea Cocada, compilada pelo DJ e produtor Leo Janeiro, é Hauy, brasileiro radicado em Toronto. Sua música é uma forma de representação de sua paixão por melodias e sons quentes, com ritmos que misturam diferentes gêneros e culturas. No novo VA da Get Physical, Hauy assina a faixa Redpath, um progressive house que foi lançado no primeiro EP de antecipação a coletânea.
Um dos destaques da carreira desse talentoso brasileiro é o seu catálogo de lançamentos. Alguns dos selos que Hauy já lançou incluem D-EDGE Records, Magician On Duty, Get Weird e futuramente Warung Records – onde remixará Boghosian – e Tale and Tone, nova gravadora do gigante Lee Burridge. Embora seu nome não esteja totalmente fixado no cenário nacional, a força de suas produções o credenciam para um futuro de sucesso e 2018 se apresenta como um ano bastante promissor.
Às vésperas de alguns dos lançamentos mais importantes da carreira de Hauy, o encontramos para um bate-papo exclusivo sobre experiência no Burning Man, dia-a-dia em Toronto, relacionamento com gravadoras e mais. Confira:
Alataj: Olá, Hauy! Tudo bem? Você é parte da compilação Cocada, selecionada pelo Leo Janeiro para Get Physical. O que representa lançar por um label dessa importância no cenário global? Como surgiu o convite para participar?
Hauy: Olá, Alan! Obrigado pelo convite, é um prazer conversar com o Alataj. Ter meu trabalho lançado pela Get Physical é a realização de um sonho e é uma honra estar em uma compilação como a Cocada, representando o Brasil com tantos outros artistas que admiro muito.
A primeira vez que ouvi falar da Get Physical foi há mais de 10 anos. Eu estava apenas começando a me interessar por house e techno, e bem nessa época, a label lançou um álbum do Booka Shade, chamado Movements. Lembro que esse álbum foi fundamental para que eu começasse a seguir esse caminho. Durante todos esses anos, sempre acompanhei de perto o trabalho do label e muitos de seus lançamentos estão em minha case.
O convite rolou há alguns meses quando enviei minhas faixas para o André Salata masterizar, ele mostrou para o Leo Janeiro que então se interessou pela Redpath. Foi tudo bem natural.
Seu lançamento pela Get Weird certamente é um dos highlights de sua carreira. Conta pra gente como exatamente isso aconteceu.
Há muito tempo acompanho o trabalho do Lee Burridge e dos artistas que lançam em suas gravadoras. Ao mesmo tempo, sempre fui fanático pelo Burning Man. Quando ouvi o set do Lee Burridge no Robot Heart – Burning Man de 2015, percebi que minha sonoridade se encaixava muito com o que ele vinha tocando e enviei as faixas diretamente para ele. Uma semana depois do Burning Man 2016, pesquisei Lee Burridge Robot Heart e o único vídeo que apareceu daquele ano foi ele tocando minha faixa Your Way to Paradise em um sunrise espetacular. A sensação foi inexplicável – e não parou por ai. Depois de algum tempo, ele me retornou dizendo que iria assiná-la. A princípio eram apenas duas faixas, Your Way To Paradise e Amanita, porém foi também incluída nesse EP minha faixa Blue Moon, lançada anteriormente pela Tiles, label do Andre Salata. Com certeza isso foi um dos gatilhos para que eu me mudasse para o Canadá para ficar mais próximo dessa cena, que é muito forte aqui.
Sobre sua experiência no Burning Man do ano passado. Quais foram os principais ensinamentos que a cidade te trouxe?
O principal foi o que eles chamam de Serendipity, que significa que tudo que tiver que acontecer, acontecerá ao acaso, da melhor maneira e no momento certo. Passar uma semana no deserto requer muito planejamento e é bem difícil conseguir um ticket, as pessoas ficam o ano todo se preparando. No meu caso, eu tinha acabado de mudar de país, não tive chances de me planejar e estava adiando para o ano seguinte. Aconteceu que, 2 semanas antes da última edição, um amigo me presenteou com um ticket, e alguns dias depois, o mesmo aconteceu com minha namorada e ficou claro que era a nossa hora de ir.
Chegando em Black Rock City, foi tudo muito intenso e bem diferente do que eu esperava. A cidade é cercada por inspirações – são mais de 500 instalações de arte espalhadas e mais de 400 art cars. Fora isso, as condições extremas e os princípios da comunidade como o de inclusão radical, liberdade de expressão e o de presentear sem querer nada em troca (como o que aconteceu comigo no caso dos tickets) faz com que as pessoas se unam e se sintam em casa. Foi com esse sentimento que tive o prazer de presenteá-los com a minha música, tocando em alguns palcos e art cars. Outro ensinamento, foi que na verdade, não precisamos de muitas coisas que no “mundo real” pensamos ser indispensáveis, como não tivemos tempo para nos planejar, levamos apenas o básico em uma mochila nas costas e apesar das dificuldades, hoje não mudaríamos nada.
Uma das coisas mais legais da música eletrônica é a possibilidade que ela oferece de misturar diferentes referências em um trabalho só. Você costuma fazer isso? Quais são suas principais referências de fora da dance music?
Sim, com certeza, principalmente em meus sets quando misturo sonoridades eletrônicas com orgânicas de diferentes estilos. Na produção isso acontece de uma maneira mais inconsciente. Minhas principais referências fora da dance music são os trabalhos dos produtores Tom Capone (principalmente em um dos meus álbuns favoritos – O Silencio Que Precede O Esporro de O Rappa) e Rick Rubin. Além de produtores do cinema como Antonio Pinto e Hans Zimmer. Outros que não podem ficar de fora são Massive Attack e o mestre Nicolas Jaar que também abusam do equilíbrio entre o orgânico e sintetizadores.
Atualmente vivendo em Toronto, qual a visão que você tem sobre a dance music no Canada?
Vejo a cena no Canada muito semelhante a do Brasil. Um país muito grande, com muitos estilos em foco, e a cena com uma curva de crescimento absurda. Ambos com uma cena sólida no tech-house, techno e olhando para o progressive. Se eu pudesse citar uma diferença, acredito que no Brasil não se vê tanto esse deep bem leve e melódico, muitas vezes com influências do oriente médio que rola muito por aqui, e ao mesmo tempo, aqui ainda não tem muito o minimal e dub techno que está ficando forte no Brasil. De alguma forma sinto que o underground no Brasil está conectado mais com a cena Europeia, e o Canadá mais ligado a America do Norte, como por exemplo, a cena do Burning Man.
Para finalizar, uma pergunta pessoal. O que a música representa em sua vida?
A música é como eu me relaciono com o mundo, é minha forma de expressão, e está totalmente ligada ao auto-conhecimento. Para mim, seja criando uma música, tocando um instrumento ou apenas pesquisando sobre novos estilos, a música é uma maneira incrível de me conectar com os outros e comigo mesmo, expressar emoções e dar som as minhas experiências!
A música conecta as pessoas!