Um “projeto de poesia eletrônica para dançar”: é assim que Liana Padilha e Lucas Freire definem o trabalho conjunto através do Noporn; duo que, em nova formação desde 2018, demonstra uma singularidade interessante ao misturar música, poesia e sexo. O projeto, na verdade, é longevo e surgiu na cena paulistana em meados dos anos 2000, caminhando para completar os 20 anos de atividades.
O duo se prepara para apresentar o quarto álbum, Contra Dança, que será apresentado para o público em setembro, seguido de tour de lançamento na Europa. Em antecipação, Nome Sujo e Estranha e Louca já estão disponíveis nas plataformas, contrastando sensualidade, provocação e romantismo. A tour de lançamento do álbum começa no dia 10 de setembro na Espanha e no dia 18, o Noporn apresenta as músicas do novo álbum no lendário Berghain. Confira o que eles têm a nos contar sobre essa distinta assinatura musical.
Noporn
Liana Padilha: O Noporn surgiu num momento de virada de vida, entre uma mudança de rumo profissional, algumas tristezas, e muita vontade de continuar me divertindo. As letras falam sobre poesia e sexualidades num país ambíguo, que coloca tudo que é ligado ao sexo como errado e sujo, mas tem calor, corpos semi-nus e carnaval. E ao mesmo tempo que não ensina educação sexual, sexualiza as crianças. Sem poesia, o sexo fica num lugar de desejo e culpa. Encontrei desde cedo, a cura para várias dores, nas pistas de dança. Primeiro como frequentadora das discotecas para crianças e adolescentes nos anos 80 no Rio de Janeiro e mais tarde aos 12 anos, como DJ nas noites de São Paulo e outros lugares do mundo.
Sempre percebi no público que sai de casa pra dançar, uma necessidade de algum lirismo no meio da crueza das batidas eletrônicas. A inspiração para as letras, vem de fragmentos de histórias pessoais, outras capturadas nas pistas, pequenos momentos de loucura e gozo no meio das noites mais alucinadas. Tem a ver com se expressar livremente, se vestir e ser o que quiser, dentro de um espaço livre de festas e clubes. E se passaram 20 anos e as histórias do nosso mundinho, são histórias que cabem em outros mundinhos. São flash, insights e sopros de estados alterados.
Lucas Freire: Fazemos nossas músicas em casa, num grande ato contínuo. Estamos sempre criando e procurando formas de chegar a uma música que nos envolva, estimule e comova. O que se comunica com o som é algo abstrato, e isso é parte da nossa intencionalidade. Mas em determinados momentos, nos declaramos alguns objetivos… por exemplo, se uma música é mais ‘para dançar’, ou se outra vamos abordar ‘como canção’. Estamos nos comunicando com o público… dentro dessa troca existem signos de linguagem aos quais aderimos, ora mais, ora menos. Acho que isso ficou mais claro agora, no nosso segundo álbum juntos.
Estamos aqui para criar músicas e histórias com toda a liberdade que um artista independente pode ter, mas existimos dentro de um contexto. Criamos graças a essa retroalimentação do mundo; às possibilidades e limites. Podemos fazer qualquer coisa, mas só estamos aqui hoje porque existe uma relação com o público. Quando tocamos as músicas ao vivo, sentimos a reação das pessoas, conversamos, ouvimos e isso acaba levando a uma leitura das situações, de grandes-assuntos poéticos e também musicais.
É interessante perceber isto e trabalhamos com este contraste de forças dentro de nós: o desejo e o momento. Dessa fricção saem músicas, letras, ideias. Algumas vêm prontas, outras demandam mais lapidação… no estúdio, trabalhamos intensamente, mas sem pressa. Temos nossos instrumentos, como teclados e baterias eletrônicas, mas sempre acabamos trazendo alguma coisa que orbita o sonho criativo. No álbum presente, Contra Dança, temos guitarras gravadas por nós, sendo que nenhum de nós é guitarrista, por exemplo. Gosto de trabalhar com encaixes e desencaixes. Não temos script, temos ouvidos, olhos, bocas, um estúdio e muitas festas para tocar.
A música conecta.