Qualquer artista pode e consegue alcançar a marca de duas décadas de carreira no mundo da música eletrônica, mas poucos são os que chegam nesse patamar com conquistas tão relevantes, como é o caso de Joyce Muniz. Quando ela tira um momento para relembrar alguns acontecimentos históricos de sua jornada, até ela mesma fica surpresa com alguns feitos — como quando conseguiu a permissão do próprio Ralf Hütter, do Kraftwerk, para usar um de seus samples numa música, em 2014.
Joyce começou como DJ e MC no icônico Flex Club, em Viena, e recentemente se tornou a primeira mulher a integrar o projeto Synth Live na Alemanha. Nesses 20 anos, ela viu seu nome estampado em gravadoras como Exploited, Kompakt, Get Physical, Permanent Vacation, International DJ Gigolo e Pets Recordings, colecionando diversas colaborações com artistas nacionais e internacionais e cativando uma legião de fãs espalhados pelo globo — até porque ela já tocou em todos os continentes, com exceção da Antártida.
A verdade é que Joyce Muniz pode olhar para trás com orgulho do caminho que trilhou, mas temos certeza que ela ainda continuará andando em frente apoiada por seus três pilares principais: resiliência, talento e transformação.
Resiliência
Resiliência porque se disséssemos que foi fácil para Joyce Muniz chegar onde ela está hoje seria uma grande inverdade. Desde o início de sua carreira, ela enfrentou desafios pessoais e profissionais consideráveis, incluindo um diagnóstico de câncer aos 30 anos, por volta de 2013. Esse momento crítico a levou a uma jornada espiritual de volta às suas raízes no Brasil, onde se reconectou com medicinas naturais e o xamanismo, um “renascimento” que transformou sua atitude em relação à criatividade e à vida. Além disso, sua capacidade de se adaptar a diferentes cenários musicais e de continuar produzindo música de alta qualidade, apesar das mudanças no mercado e de seus próprios gostos, é impressionante. Afinal, ela já se aventurou por diferentes estilos, do Drum n’ Bass ao House, do Electro ao Techno, do Deep ao Indie Dance, do Acid ao Downtempo, tudo isso enquanto se manteve uma figura de destaque em um ambiente predominantemente masculino.
Talento
Talento porque se disséssemos que ela contou com a sorte ou que cortou caminhos, também não seria verdade. Sua dedicação é evidente tanto na diversidade de estilos que ela abraçou, demonstrando sua habilidade em ir além do óbvio, como também nas parcerias realizadas ao longo dos anos, incluindo collabs e remixes para e com artistas como DJ Hell, Bushwacka!, Gorge, Claptone, Wehbba, Renato Cohen e tantos outros. Mas para mostrar que seu talento não se resume apenas ao trabalho de estúdio e ao DJing, ela resolveu levar sua música para a estrada, apresentando-se ao vivo com diferentes orquestras pela Alemanha como parte do projeto Synth Live, sendo a primeira mulher a se juntar a eles.
Transformação
Transformação porque ela nunca se acomodou na zona de conforto. Iniciou como DJ e MC, ganhou fama como vocalista, alcançou o prestígio internacional como produtora musical, surpreendeu com suas performances de live act e seguiu impressionando com sua destreza nas mixagens pelos quatro cantos do mundo. No meio desse turbilhão de atividades, ainda encontrou tempo para completar um bacharelado em apresentação de rádio, o que lhe permitiu criar e manter seu próprio programa na estação de rádio nacional FM4, na Áustria, além de ser curadora de outro programa na Rinse FM, no Reino Unido.
Como em palavras é difícil resumir e transcrever tudo o que ela já fez como artista, nada melhor do que finalizar esse artigo com uma seleção musical feita por ela mesma, que escolheu a dedo algumas faixas que foram fundamentais na sua evolução ao longo dessas duas décadas de carreira. Confira:
Blaze – Lovelee Dae (Joyce Muniz Remix) [Defected, 2011]
Este foi meu primeiro remix oficial como produtora, lançado pela Defected. A música original é um hit de Deep House dos anos 90. Para mim, foi um momento muito especial poder remixar essa canção lendária como uma jovem produtora na época.
Joyce Muniz – Back In The Days feat. Bam (Jungle Brothers) [Exploited, 2014]
Back In The Days foi uma das faixas mais importantes da minha carreira. Desde que tive a permissão do próprio Kraftwerk para usar um de seus samples, isso realmente me fortaleceu como produtora. Além disso, a combinação com um dos meus rappers favoritos dos anos 90, MC Bam, dos Jungle Brothers, tornou essa faixa tão especial que ainda não acredito que a produzi.
Joyce Muniz – Glass Mistress [Pets Recordings, 2020]
Glass Mistress foi meu primeiro lançamento na Pets Recordings, selo do Catz ‘n Dogz. Este EP foi uma mudança de estilo pessoal para mim. Foi o começo da minha fase de Indie Dance eletrônico. A faixa foi lançada durante a pandemia e, mesmo com os clubes fechados, recebeu muito apoio nas transmissões ao vivo dos DJs. Quatro anos depois, os DJs ainda estão tocando.
Bebel Gilberto – Deixa (Joyce Muniz Remix) [Pias, 2021]
Bebel tem sido minha musa da bossa nova desde os anos 90. Ela foi a primeira artista de bossa nova a combinar música eletrônica com bossa nova na época. Sempre sonhei em remixar uma de suas músicas. Nos conhecemos em 2017 em uma situação muito aleatória na Sicília e nos tornamos amigas. Em dezembro de 2020, recebi uma ligação dela e ela me perguntou se eu queria remixar uma de suas músicas. Eu disse sim e decidi fazer um remix que respeitasse a canção original dela. Então, essa música se tornou um groove downtempo que ela adorou.
Joyce Muniz – Arrivederci Bella [Joyce Muniz Music, 2023]
Arrivederci Bella é uma escolha do meu segundo álbum, “Zeitkapsel”, lançado pelo meu novo selo Joyce Muniz Music. Esta faixa é especial para mim porque foi a primeira vez que consegui cantar em uma produção minha. Canto a música na minha língua materna, o português. Esta canção me aproximou das minhas raízes brasileiras. Sempre quis fazer uma faixa percussiva de Electro.
Joyce Muniz & Sara Bluma – Beats & Lines [Kompakt, 2024]
Este é um dos meus lançamentos mais recentes pela Kompakt, um selo que acompanho desde o início da minha carreira. Quando Michael Mayer a assinou, realmente me senti respeitada como produtora e artista. Além disso, a faixa alcançou o primeiro lugar no chart de Indie Dance do Beatport. Adoro esta colaboração com minha amiga Sara Bluma.
Como escolher apenas 6 foi difícil, ela ainda fez questão de deixar mais 6 faixas que possuem um significado especial:
Joyce Muniz – Toxic People [Gigolo Records, 2015]
Maya Jane Coles – Burning Bright (Joyce Muniz Remix) [IAMME, 2013]
Joyce Muniz – Sleepless (Wehbba Remix) [Warung Recordings, 2014]
Joyce Muniz – Crystalline [Exploited, 2020]
Paul Simon – Gumboots (Joyce Muniz Remix) [Sony Music, 2018]
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