O brasileiro é reconhecidamente um povo passional, que ama prover e receber afeto. Quando isso cai para a esfera do relacionamento com seus ídolos na música, tudo é exponenciado. É tiro e quedo, você pode conversar com grandes DJs e muitos deles vão se referir ao Brasil como uma audiência quente, emocional e intensa. Quando entregamos isso, queremos o mesmo em troca, certo? Mas será que é assim mesmo?
Nos últimos anos, um debate bastante acalorado se estabeleceu em redes sociais como o Twitter, em torno da seguinte questão: as grandes estrelas da música realmente gostam de vir ao Brasil? Se, por um lado, temos essa audiência engajada, um mercado lucrativo e uma cultura atraente, capaz de entregar grandes experiências, por outro, há uma complexidade logística incomparável com outros grandes mercados, um alto nível de exigência e um clima de caos em algumas apresentações. Como encontrar o balanço dessa relação?
Fato é que, como já diriam os pensadores contemporâneos, o Brasil não é para amadores. E, no showbusiness da música eletrônica, há algo particular no que diz respeito a essa relação entre público e artistas. Se, para grandes bandas, é praticamente impensável fazer turnês regulares por aqui, às vezes com duas ou mais dentro do mesmo ano, para os DJs isso é algo bastante plausível. Isso faz com que a intensidade dessa troca seja ainda maior, justamente pela frequência com que acontece.
Um DJ que conhece bem todo esse contexto é Seth Troxler. Desde que estreou no Brasil, foram dezenas de turnês pelo país. Seth é certamente um dos artistas internacionais de primeira prateleira que mais tocou e se identificou com o Brasil. Muito além de publicações bonitinhas com declarações nas redes sociais, percebe-se que o DJ e produtor americano realmente se conectou com a cultura brasileira e com o conjunto de experiências que o cercam. Artistas como ele estão em um patamar em que há oportunidades de trabalho nos quatro cantos do mundo. Voltar regularmente ao Brasil, acredite, é uma opção pessoal.
Nos últimos 10 anos, um currículo de apresentações de peso em solo nacional foi consolidado. Seth tocou e tem tocado regularmente nos principais clubs e festivais do Brasil, mas, nos anos recentes, foi no Rio de Janeiro e com a RARA que ele desenvolveu uma relação mais profunda e intensa. A parceria, que surgiu em 2019 com algumas reuniões, evoluiu para iniciar oficialmente no Carnaval de 2020. Este foi o primeiro ano de CarnaRARA, já tendo Seth como atração principal.
Inspirado pela experiência que teve como folião no Brasil, ele voltou a falar com o time da festa carioca no ano seguinte, tendo um plano em mente: Seth queria organizar um evento de música eletrônica gratuito no Carnaval. A RARA abraçou a ideia e, juntos, oficialmente como co-organizadores do evento, realizaram novas edições em 2023 e 2024, sempre levando em consideração a acessibilidade e a qualidade artística e estrutural.
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A edição deste ano é, novamente, um dos destaques do calendário anual da RARA e de Seth Troxler. A festa, que acontece no dia 4 de março, contará com um projeto de cenografia avançado, e o lineup desta vez inclui Mochakk, Adam Ten, Chloé Caillet, que retorna pelo terceiro ano, Eli Iwasa, RARA DJs, Bernardo Campos, Carrot Green, DPR, Marta Supernova, Ratier e outros nomes que cultivam um relacionamento próximo com a festa e o DJ anfitrião.
Ludwig Wittgenstein, em sua obra Investigações Filosóficas, sugere que há coisas que as palavras não conseguem capturar completamente. O afeto é um desses elementos. Não é a simples enunciação de um “Brasil, I Love You” que prova essa conexão, mas sim a forma como essa relação se constrói ao longo do tempo. Embora estrangeiro, Seth Troxler tem traços importantes de conexão com a nossa cultura – e que bom que ele pode encontrar sentido nisso e materializar essa afinidade em um formato de trabalho, nessa parceria tão interessante que construiu com a RARA através do Carnaval.