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A música conecta

Alataj entrevista Cri Du Coeur

Por Laura Marcon em Entrevistas 23.09.2020

Nada melhor do que imergir em uma pista de dança onde o DJ entende muito bem o feeling de estar ali dançando e vivendo aqueles momentos entre amigos e tantas outras pessoas. Isso frequentemente acontece quando quem comanda a cabine já dançou, e muito, em pistas de dança por aí ou até mesmo participou do cenário de outras formas que não apenas enquanto artista. Este é o caso de Jerome D., mais conhecido como Cri Du Coeur, que antes de utilizar esse pseudônimo já atendia por The G e G-Rome.

O francês atua no cenário há muitos anos como público, produtor de eventos, label boss e DJ, mas apenas agora, quando se sentiu preparado e seguro, ele decidiu se dedicar ao mundo da produção e à sua segunda gravadora, Arkham, fundada em março deste ano e focada em sonoridades dentro do Techno. O projeto já deu seus primeiros passos com bons lançamentos e ainda apresentará mais novidades até o final de 2020.

Conversamos com Jerome em um papo bem descontraído sobre sua vida, carreira, produção e outros temas que envolvem nosso cenário. 

Alataj: Olá, Jerome! Tudo bem com você? Muito obrigado por bater esse papo conosco. Você está na indústria de música eletrônica há mais de 20 anos e já experimentou diferentes papéis na cena, mas começou a produzir somente este ano. Houve algum evento em particular que motivou você a lançar as próprias faixas? Se nos permite, por que agora?

Cri du Coeur: Olááááááá. Sim, já faz um tempo que estou em movimento. Não gosto da palavra “indústria” para o nosso cenário, pois representa principalmente a parte comercial dela. E para mim nunca foi um negócio, mas uma paixão que custa muito dinheiro.

Então para responder à sua pergunta, comecei a produzir este ano, mas há 20 anos já coloquei meus dedos em máquinas em estúdios de vários amigos. Nunca tive o som final que queria, então me concentrei em ser DJ e organizar festas. Agora finalmente planejei ter meu próprio som, graças ao cara do label Cyrk, que me ajudou na produção das minhas faixas e me direcionou no caminho certo sem perder tempo e encontrar as técnicas certas. A motivação veio no ano passado com a morte repentina de minha mãe. Eu me diverti muito e pensei que só viveríamos uma vez e se não o fizer agora viverei o resto da minha vida com arrependimentos.

Você se envolveu em diferentes projetos como produtor de festas e DJ durante sua carreira, mas também viveu longos intervalos distanciado do universo musical. Imaginamos que a paixão pela música seja o principal fator que faça você retornar, mas existe algum outro motivo? Como é a experiência de retornar para a indústria depois de alguns anos afastado? Você acha que o fato de ser conhecido torna isso mais ou menos difícil?

Sim, é tudo uma questão de paixão, é claro. Tive longos intervalos sem atuar na cena, mas eu sempre estive lá, nas festas e nos festivais, ouvindo e aprendendo tudo que vejo. A cena estava mudando tanto alguns anos atrás que eu não me reconheci nela. O Techno estava morto naquela época (no meu país) e a música que eu tocava me entediava (estilo Electro Clash), então preferi me afastar um pouco. Mas meus amigos sempre me disseram que eu voltaria, pois não consigo parar. Eu vou parar quando eu morrer. O fato de meu primeiro amor musical (Techno) ter voltado muito nos últimos anos me motivou a voltar às minhas raízes. Tanto Techno e amor à rave, era hora de eu fazer o que eu queria. Sempre há uma diferença nessa cena com o passar dos anos, mas aprendi a conviver com isso – a vida é assim.

The G, G-Rome e, agora, Cri Du Coeur. Cada um dos seus alter egos reflete um período específico de sua carreira, desdobrados em diferentes estéticas sonoras. Quais foram as principais influências que você teve que o ajudaram a construir cada um desses perfis? O quanto você acha que sua vida pessoal contribuiu para esses transições?

Eu nunca tive personalidades específicas para G-Rom e The G na minha carreira de DJ. Aconteceu porque eu só queria mudar meu nome para caber melhor nos panfletos [risos]. Mas com Cri du Coeur, é outra coisa. A imagem agora é mais importante e você precisa pensar corretamente sobre o que deseja fazer. Eu vi o que estava sendo feito em todos os lugares e desenvolvi minha própria opinião sobre isso. Mas é claro que minha vida pessoal me deu esse apelido.

Cri Du Coeur (choro do coração, em Português) é um nome que carrega forte apelo emocional e imaginamos que ele fale muito sobre quem é Jerome D. Pode compartilhar conosco um pouco sobre a escolha do nome e o que revela sobre você para o público?

Literalmente, Cri du Coeur significa mais “grito do coração”. E sim, é claro, isso invoca emoções fortes. Em Francês, essa expressão significa que seu corpo e sua alma fazem um forte apelo à todos com uma mensagem do coração. É a ideia de ter vivido um momento trágico em sua vida e seu coração grita para você mexer seu traseiro e deixar todos saberem que sua música é A resposta. É o meu leitmotiv (força condutora).

Você já teve outra gravadora há cerca de uma década, a extinta Kombo Muzik, focada principalmente em Minimal Techno, e agora está de volta a esse mercado com a Arkham, voltada a um Techno mais puro. Além do gênero musical, quais são as principais diferenças que você percebe entre esses dois projetos? Sua postura enquanto label head mudou muito?

A aventura Kombo Muzik foi a primeira chance no mundo das gravadoras. Eu sabia que era uma coisa difícil de administrar, mas nunca soube que precisava de tanto tempo e energia. Por isso, pensando nisso, criei o Arkham Audio e dediquei mais tempo a ele, pois é minha reconversão. Eu realmente quero que esse projeto funcione. Não quero mais fazer trabalhos chatos. Se o label crescer, abrirá portas para outras oportunidades. É claro que agora minha postura como gerente de gravadora mudou. Abri os olhos e vi que é um trabalho de tempo integral e você não pode executá-lo sozinho. Tenho uma boa equipe e parceiros.

Ainda sobre a Arkham, como você avalia o mercado de música eletrônica atual? Você acha que as barreiras que foram quebradas pela internet e, em especial, pelas redes sociais facilitaram o estabelecimento de um novo selo ou deixaram o mercado mais competitivo e desafiador? Onde você imagina ver sua label nos próximos anos? Pretende começar a assinar produções originais de outros artistas no futuro?

Podemos falar sobre isso por horas a fio. É um grande ponto no momento, muitos artistas fizeram sua identidade dentro das redes sociais. Isso não é uma coisa que eu quero fazer. Quero usá-las para crescer mais rápido, mas não só assim. É por isso que trabalho duro na minha música e gravadora. É obrigatório ter um bom conteúdo para oferecer aos amantes da música, não apenas uma imagem. O mercado está mais desafiador, é claro, é assim que o Techno é agora, como um GRANDE negócio com muito dinheiro para algumas pessoas. Não faço isso com isso em mente. Faço isso para compartilhar minha paixão com os amantes da música. A pandemia do Covid-19 abriu olhos e mentalidades, mas não tenho certeza se depois de toda essa merda tudo vai mudar, mas existe um lugar para todos, lugar para Techno underground e Techno mainstream. Eu não odeio o fato de que DJs de Techno mainstream e suas ideias de negócios colocaram o Techno em destaque. Também não odeio o fato de que o digital e o mp3 popularizaram nossa música.

No que diz respeito à direção do selo, a lenda francesa Electric Rescue assina o quarto lançamento do selo e o quinto lançamento será um remix de vários artistas de uma faixa rave lendária e com grandes nomes para este. Sim, estou aberto a outros artistas da minha gravadora, é claro.

A pandemia causada pela covid-19 teve um forte impacto na cena eletrônica mundial e atingiu o pico na Europa justamente quando você tinha recém-lançado o primeiro single. Como esse acontecimento refletiu no desenvolvimento dos seus atuais projetos e como você se visualiza na cena atualmente, com a retomada gradual que tem acontecido por aí?

No momento não mudei minha agenda. Lancei minha gravadora e meu novo perfil de artista em março de 2020. Nunca pensei que tal pandemia chegaria na mesma data. É muito estranho, mas vejo isso como uma mensagem para continuar, não parar e esperar a tempestade passar. Vou demorar mais para ouvir minha música em clubs de verdade, mas a ideia de tocar na frente de clubbers de verdade me motiva a continuar.

O seu lançamento mais recente, Erickson/Erickson on Acid, possui o reforço de uma série de remixers, todos franceses. A collab com artistas exclusivamente da França aconteceu naturalmente ou foi algo que você planejou e, em caso afirmativo para este, qual foi o principal motivador para essa escolha?

Eu acho que foi uma boa ideia ter apenas remixers franceses neste lançamento já que eu amo a França e há muitos artistas Techno incríveis no momento. A cena francesa também é muito grande. Como sou da parte francesa da Bélgica foi muito mais fácil entrar em contato e explicar o projeto aos produtores franceses. Acho que vou continuar a trabalhar assim para versões posteriores. Fazendo, por exemplo, um lançamento de remixers apenas belgas e, em seguida, um lançamento de remixers espanhóis. Eu quero colocar o foco em territórios específicos, pois cada país tem sua própria cena. A música não tem território nem fronteiras com certeza, mas cada país tem sua identidade.

Para finalizar, uma pergunta pessoal. O que a música representa na sua vida?

Música é tudo para mim. Está sempre disponível quando você precisa. Quando você está triste ou feliz, isso me motiva ou me ajuda. Também faz parte da minha família. Não podemos viver sem música e não entendo como algumas pessoas podem viver sem música.

A música conecta.

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