Se há uma característica que admiramos em artistas e iniciativas conectadas à música eletrônica, essa característica é a consistência, porque sabemos que nada se constrói de uma hora para outra. O Alataj está em atividade desde 2012, quase o mesmo tempo que a Plano B Records, gravadora de Vicente Amadeo aka Art In Motion, idealizada um pouco antes, em 2011. Nossos caminhos já haviam se cruzado em algumas oportunidades, como em 2017, quando fizemos o review do seu EP Desert, e em 2019, oportunidade em que entrevistamos Art In Motion; porém, o momento atual talvez seja o mais significativo até o momento, já que sua label acaba de chegar ao lançamento de número #100 através do EP Arado, revelado no último dia 18.
+++ Alataj entrevista Art In Motion
A sua história com a música eletrônica, porém, é ainda mais antiga. Aos 16, Vicente já estava pelas pistas de dança do Rio de Janeiro, sua cidade natal. Mas antes mesmo de atuar como DJ, sua primeira colaboração com a cena underground foi mesmo através da produção musical, por volta de 2010, quando assinava apenas como Amadeo, alter ego não usado mais pelo produtor. Vicente cursou Engenharia de Som no S.A.E. na Austrália entre 2007 e 2009, e ao voltar para o Brasil, em 2010, foi quando começou a organizar os primeiros eventos e a tocar como DJ.
“Começar a fazer eventos ocorreu de uma forma bem natural, eu já produzia mas não tocava e nem conhecia muitas pessoas da cena do Rio de Janeiro. Alugamos uma casa em Santa Teresa no Rio e na primeira festa lotamos a casa com mais de 500 pessoas. A maioria amigos, ou amigos de amigos.O line up também era só de amigos, tocamos Tech House na época. Então em 2010 nasceu a House it. Uns anos depois nos juntamos a outros núcleos do Rio e produzimos as festas QUADRA e INcomum”, compartilha o artista.
Com uma certa experiência em ambas frentes do mercado, a ideia de criar uma label para dar vazão aos seus próprios lançamentos e também de alguns amigos que tocavam em suas festas parecia atraente. Em maio de 2011, então, chegava o release de estreia da Plano B, Everyday, com uma original sua e remixes de Angelo Ferreri e Matt McLarrie; na sequência, o espaço foi sendo preenchido por nomes como Eclectic (Nicolau Marinho e Douglas Castro), Toucan (Olliver Mach e Bernardo Campos), Leonardo Torha, Luthier, Glitter, Simple Jack e Nytron, para citar alguns.
O crescimento foi natural e o reconhecimento a nível nacional não demorou para acontecer. Inclusive, a label foi responsável por acreditar e apoiar o trabalho de muitos artistas em fase inicial de carreira que hoje estão estabelecidos, a exemplo de Lauro Viotti, Alex Stein, André Guarda, Beep Dee, Coppola, Benjamin Sallum, Waltervelt, Maz, Mila Journée, Gabriel Moraes, Hopper & Carlos Pires, Sonic Future, Althoff e mais.
“O primeiro showcase da gravadora foi no club cave, club onde fui residente e toquei o meu primeiro live com Lauro Viott, Nytron e Bruce Leroy em 2014. Uns anos depois, também no Rio de Janeiro, no Comuna, fizemos o nosso segundo showcase para celebrar o aniversário da label, com o Maz, quando ele estava começando a tocar. Também fizemos uma festa bem legal na Fosfobox com Sonic Future para comemorar os 7 anos da label. Para a festa de 9 anos trouxemos o live do L_cio e também os DJs Sanio & Steve Menta, artistas que participam ativamente da gravadora. Para o aniversário de 10 anos da gravadora, fizemos nossa primeira festa fora do Brasil, em Berlim, foi bem legal e no lineup tivemos Martin Tanner, Sanio, Zarth e eu”, recorda sobre alguns momentos importantes da trajetória da marca, destacando também seu álbum, Llankay, de 2015, que foi um “divisor de águas” para a sonoridade que a label tomaria dali em diante.
Em um certo momento, Vicente apostou muito na parte de remixes e trouxe para o catálogo nomes de fora bastante expressivos, como Coeus, Nordfold, Florian Kruse, Tony Casanova, Rancido, Tal Fussman, KEENE, Pysh, M.E.M.O., Few Nolder e Boy Next Door; apesar disso, o EP mais vendido da história é seu, Rising, lançado através do projeto paralelo com Pedro Cruz, Akken (já descontinuado), cuja faixa principal recebeu suporte até mesmo de Tiësto em seu radioshow. “Foi bem inesperado. Ele até mencionou a gente na locução. Fora isso, a faixa foi usada como trilha sonora do aftermovie de um grande festival no Egito, Sandbox”, relembra a situação, que aconteceu em 2017. Nos anos seguintes, os suportes não pararam. Laurent Garnier, Maceo Plex, TALE OF US, Mano Le Tough, Joris Voorn e mais recentemente Innellea, Frankey & Sandrino e Sam Sure, este último tocou uma faixa sua, Salar, no Burning Man.
A linha melódica sempre esteve presente na sua identidade, mas como seu próprio nome já diz, sua arte está sempre em movimento. O som atual de Art In Motion é uma mescla de tudo o que o artista escuta, fugindo de padrões e focando na sua própria personalidade. “Busco por um groove progressivo e hipnótico quase sempre usando melodias repetitivas e simples, mas cada faixa é diferente. O meu processo de produção mudou muito ao longo dos anos. De uns 4 anos pra cá tenho escutado muitos artistas que produzem com modular e hardwares no geral, ferramentas que se tornaram peças centrais na criação das minhas músicas atualmente”, detalha.
Entre algumas práticas de yoga e momentos de meditação, a música ambient também tem participado bastante da rotina de Vicente, que tem absorvido muito bem esse sentimento de plenitude e traduzido para suas criações. “Acho que tudo que fazemos fora do estúdio influencia diretamente em como nos expressamos na música”, comenta, e de fato podemos notar isso no release de número #100, Arado, um trabalho que justamente une linhas melódicas e profundas com tons mais leves e progressões sutis.
Atualmente morando em Portugal e finalizando seu mestrado em Música e Tecnologia na cidade de Lisboa, Art In Motion tem experimentado outras linhas de som e não descarta a chance de criar um novo projeto para dar vazão a essas ideias. Enquanto isso, estuda configurar um setup de live act para voltar a tocar no ano que vem, tem planejado novidades para a sublabel living like birds, recrutando uma nova crew de sócios, e ainda estuda a possibilidade de criar uma terceira gravadora para o próximo ano, portanto, veremos mais novidades muito em breve enquanto a arte estiver em movimento. Para a Plano B, a ideia é “lançar menos coisas, mas que representem bem a nossa visão”, portanto, devemos ver muitas novidades em breve enquanto a arte se manter em movimento.
A música conecta.