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A música conecta

Alataj entrevista Dub Recycle

Três anos de estudo em Berlim, duas turnês pela Índia, releases assinados com Steyoyoke, DNC Limited, Us & Them Records, e suporte de ninguém menos que Øostil — projeto “pupilo” da renomada Afterlife — no seu EP Stairs To Heaven, que saiu pela Awen Records no início de 2020. A trajetória do paulistano Dub Recycle vem sendo escrita há pouco mais de 10 anos, mas seus grandes triunfos são mais recentes e a tendência é crescer mais e mais. Seu trabalho de estúdio também se mostra mais sólido, como podemos ver no seu novo remix para o duo Ark of Mind, que saiu no último dia 30 pela Prototype Music. Tudo isso e mais um pouco você confere em detalhes nesta entrevista exclusiva que fizemos com o artista:

Alataj: Para os leitores te conhecerem melhor: quem é, de onde vem, onde vive, do que se alimenta Dub Recycle?

Dub Recycle: Primeiramente obrigado pelo convite Alataj e é um enorme prazer estar novamente aqui com vocês compartilhando meu trabalho. 

Sou natural do interior de SP, Franca. No final de 2010 me mudei para Berlim na Alemanha e fiquei por lá até 2013 estudando e conhecendo mais sobre o berço da música eletrônica no mundo. No retorno ao Brasil, escolhi morar em SC, Balneário Camboriú, cidade que me apaixonei desde o primeiro momento. Fiz muitos amigos e hoje me considero um catarinense de coração. 

Em 2018 resolvi me mudar para Barcelona, Espanha, após convites para tocar pela Europa e também uma turnê na Índia pela primeira vez. Depois de duas turnês no país asiático (2018, 2019), retornei ao Brasil no momento da pandemia e preferi ficar mais reservado com a família.

Você segue alternando moradia entre Brasil e Espanha? Como tem sido esse processo? Considera-se um nome mais conhecido/celebrado internacionalmente?

Sempre que posso estou na Europa tocando e buscando mais conhecimento. Tenho certeza que após a pandemia estarei alternando lá e cá entre as temporadas de cada continente. Após vários suportes de artistas grandes tocando minhas músicas pelo mundo, cresceu muito meu nome internacionalmente, principalmente depois da turnê na Índia em 2018. O Brasil está amadurecendo no cenário underground e isso tem fortalecido muito nosso nome lá fora.

E você também tem uma história de bastante aprendizado em Berlim, onde viveu por três anos, certo? Como foi a experiência?

Berlim foi algo incrível, principalmente por ter sido a primeira cidade que vivi após sair do berço da mamãe, digamos assim [risos]. A cidade é muito diferente do restante da Alemanha, Berlim é única e com personalidade forte. A presença nos clubs e com os maiores artistas do mundo expandiu minha consciência absurdamente. A visão de mundo, cultura, trabalho, política, tudo muda quando você conhece e vive em Berlim.   

Você é DJ desde os 12 anos e tem seu projeto atual desde 2008. Foi nos últimos anos que seu trabalho começou a ganhar mais holofotes. Como foi essa longa trajetória até aqui? O que te levou tão cedo a se interessar pelas picapes? Você considera que demorou para começar a bombar?

Irei contar minha trajetória completa que tenho certeza que poucos sabem. Fui convidado por um amigo para colocar músicas em uma festa de garagem, na época usávamos CD players e um mixer da “KEP” com apenas 2 canais e somente o fader de volume, não havia nem knobs de equalização, me diverti muito. Continuei acompanhando ele por algumas vezes, mas foi somente quando estive num club itinerante com a minha irmã e amigos que vi de fato um DJ tocando com os toca discos, e foi alí que tive certeza que era aquilo que iria me dedicar. 

Comecei a buscar conhecimento em revistas e jornais (na época a internet era para poucos), comprava CD’s da Jovem Pan Hits, Gigi Diagostino e etc. Foi em 2001 que conheci o Drum’n’Bass e toquei por sete anos. Cheguei a tocar com Marky e Patife (DJ’s consagrados da época), e somente em 2008 que surgiu o Dub Recycle. Migrei do Drum’n’Bass para o Deep House e Techno (daí vem o “Recycle” no nome). Na época eu já produzia com o Reason (plataforma de produção) e em 2009 comecei a usar o Logic após ver uma entrevista com o Gui Boratto falando sobre. 

De fato tudo começou a acontecer quando me mudei para Berlim, porém ser conhecido internacionalmente, foi de 2018 para cá. Não vejo isso negativamente, encaro mais como maturidade, tanto pessoal, quanto emocional e profissional. O artista precisa ter um alicerce gigante para manter algo que cresceu e vejo hoje que se tivesse acontecido antecipadamente eu não teria como manter isso. Estar nos holofotes te responsabiliza com cada detalhe que faça ou deixe de fazer e se você não souber lidar, acaba caindo rápido como subiu.

Alguns creditam o suporte de Øostil, sobretudo no set do Cercle, o principal motivo desses holofotes se acenderam sobre você, trazendo luz ao seu trabalho para um público mais amplo. Você também enxerga desta forma? Foi, de fato, um ponto de virada na sua carreira?

De fato o suporte de alguém do núcleo Afterlife tocando meu som e ainda em um dos maiores streamings do mundo é algo gigante, porém o suporte dele vinha desde 2018 com meu EP The Benign, que saiu pela Qilla Records. Ele tocou abrindo para o duo Tale Of Us para mais de 8 mil pessoas em Tulum, no México. Na minha opinião foi uma série de fatores que ajudaram no meu engajamento internacional, mas de fato, o principal foi o suporte do Øostil com a música 33 na Cercle de abertura para Mathame no México.

Em 2016, você chegou a deixar o Alataj sem palavras. Mas de lá pra cá, houve uma mudança importante na sua sonoridade. Como foi o processo de migração do Deep House para o Techno Melódico?

Com certeza, a evolução é constante. Cinco anos é uma vida no meio artístico. A mudança do Deep para Techno Melódico foi repentina e logo em 2017 lancei o EP Garden pela Nin92wo e foi o pontapé para a mudança. De cara, a música teve o suporte de D-Nox tocando ela na Kubik, em Curitiba. Eva teve suporte também de Soul Button (Steyoyoke), em seguida ele me convidou para fazer uma nova versão para lançar pelo selo, e em 2018 lançamos Eva (2018 Rework) pela Steyoyoke. 

Techno melódico é um estilo que normalmente está atrelado a sentimento. Você enxerga o gênero como mais sentimental que outros? Como produtores como você traduzem esse sentimento nas produções?

A melodia nos remete sempre a algo mais reflexivo dependendo dos acordes que você usa. Unindo isso ao lado hipnótico do Techno, temos com certeza algo bem profundo. A expressão sentimental nos sons vem espontaneamente no meu caso, deixo fluir de acordo com a evolução da música no momento da criação. Na minha opinião expressamos nossos sentimentos reprimidos através da arte, essa repressão se manifesta involuntariamente e faz com que o artista nem saiba de fato como saiu aquela música, pintura e etc. 

Por ser algo advindo do inconsciente (limbo da psique humana), não conseguimos detectar conscientemente, daí vem a surpresa na conclusão do trabalho. Acho isso fantástico, pois através da arte podemos trabalhar nosso intelecto e também do público que ouve na pista de dança e se sentem tocados pelo som internamente. O trabalho musical vai muito além de dançar no club ou balada, é a expressão de sentimentos guardados e isso te ajuda muito a se conhecer.

Você recentemente foi convidado para uma turnê na Turquia, certo? Como foi a experiência em um momento em que praticamente o mundo inteiro está paralizado em relação a eventos do tipo?

A turnê da Turquia veio com um convite para o lançamento de um EP pela Vision and Illusion, que foi lançado há poucos dias. Ainda não fechamos as datas, estamos esperando amenizar mais um pouco as coisas para termos certeza de tudo. O plano é unir uma turnê na Turquia e Índia. A distância é pequena entre os dois países, portanto, fica bem fácil agilizarmos isso. Creio que as turnês devam começar em outubro. Tive também o convite para uma turnê no México (Tulum) no Réveillon, com duas datas, e estamos viabilizando algo também para Miami talvez. Estamos em fase de negociação.

A seleção de gravadoras com as quais você já assinou é bem interessante, e inclui algumas das principais labels de Techno do Brasil. Contudo, agora foi a primeira vez na Prototype. Como que rolou o convite para participar de Momentum?

Alguns convites foram feitos para remixar lançamentos da label, porém estava com muitos trabalhos e não pude aceitar na época. O remix para o EP do Ark Of Mind veio no timing perfeito que havia finalizado outros remixes e o meu EP Interstellar, recém-lançado. Escolhi a track Solaris para o remix. Gostei muito de fazer parte desse trabalho, pois tenho um carinho enorme pelo público brasileiro e pelas pessoas envolvidas no selo. A Prototype vem se destacando com lançamentos incríveis e vejo isso com a maior alegria possível. Precisamos cada vez mais de labels nacionais para mostrar o trabalho brilhante que temos no país.

Por fim, uma clássica do Alataj: o que a música representa em sua vida?

A música é a expressão de mim mesmo sem rótulos e paradigmas, e sem ela seria depressiva e melancólica. A representatividade da vida são as cores e a dos sentimentos são a música!

A música conecta.

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