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A música conecta

Alataj entrevista K.E.E.N.E.

É quase que uma constante vislumbrar artistas que não se limitam apenas à arte da discotecagem e produção musical. A maioria das figuras que surgem dentro da cultura eletrônica dá ou já deu sua contribuição para o cenário realizando eventos, administrando clubs e, principalmente, comandando gravadoras. Mas não é muito comum encontrarmos artistas que participam com grande intensidade de diversos movimentos e os mantém ativos mesmo com a intensa rotina entre tours e estúdio. 

A dupla panamenha Lloyd e Kevin, mais conhecida como K.E.E.N.E., faz parte desse time e, mesmo sediados em Berlim atualmente, são muito ativos no cenário de seu país natal. Eles têm seus nomes atrelados desde a label parties que difundiram a música eletrônica no Panamá, clubs ainda ativos e a gravadora Cacao Records, onde lançam suas faixas e de outros artistas que admiram. É através dela que eles trarão seu novo release, no dia 26 de julho, o EP intitulado Why Do You Worry, com boas colaborações junto a uma boa dose de percussão, como lhes são característicos.

Nós tivemos o prazer de entrevistar a dupla e o resultado foi um bate-papo super descontraído onde eles contam sobre sua história, sobre o cenário do Panamá, novos projetos e outros assuntos bem interessantes. Vale a leitura!

Alataj: Olá, Lloyd e Kevin, tudo bem? Primeiramente obrigada por esta oportunidade. Vamos ao começo da jornada. Como foi o encontro de vocês com a música eletrônica? Foi algo que aconteceu em sincronia ou alguém foi na frente? E como perceberam que isso passaria a ser a profissão de vocês?

K.E.E.N.E.: Ei pessoal! Estamos muito felizes e animados em fazer esta entrevista. Vocês estão fazendo um trabalho incrível. Na verdade, houve alguns anos no meio. Kevin costumava ir a clubes e festas de música eletrônica muito antes, desde muito jovem. Em 2010, depois que Lloyd voltou ao Panamá, estudando na Argentina e tocando por lá, decidimos fazer algo juntos. Claro que tocar era uma coisa, mas queríamos principalmente começar a fazer música o mais rápido possível. Não sabemos dizer exatamente quando percebemos que seria essa nossa profissão. Em nosso segundo ano tocando juntos fomos convidados a participar do RBMA Bass Camp na Guatemala. Estivemos lá nos conectando com todos esses artistas incríveis de toda a região (América Central). Pode ter sido o primeiro passo para acreditar que havia uma maneira, então achamos que a partir daí levamos tudo mais a sério.

Hoje a base de vocês é Berlim, indiscutivelmente um núcleo da música eletrônica no mundo, tudo acontece por lá e estar lá é também um facilitador para fazer acontecer. O que levou vocês até essa cidade? Qual é a percepção de vocês sobre Berlim e a sua cultura musical?

É exatamente como vocês disseram. Existem outras grandes cidades como Londres, Paris ou Amsterdã. Mas Berlim nos parece o que está constantemente levando as coisas para o próximo nível. Isso não é exclusivo por causa da música eletrônica. Na verdade é uma ótima cidade para ser criativa e conhecer pessoas com ideias semelhantes em outras disciplinas artísticas. Poderíamos dizer que enganamos um pouco, porque costumávamos passar alguns verões antes de conseguirmos nos mudarmos completamente. Já conhecíamos a maioria dos locais e pessoas que chamamos de amigos agora. Mudamos muito a maneira como fazemos as coisas, mas também por causa do tempo e da experiência.

E o Panamá? Como é a cena de música eletrônica no seu país? Existem projetos que fomentem os talentos locais?

Ainda temos que ver como as coisas se desenrolam após essa pandemia. Neste momento é bastante incerto, mas o palpite é assim em qualquer outro lugar. Agora podemos dizer que o Panamá já estava em uma recessão que dificultava a sobrevivência dos promotores e dos locais. Quando começamos a tocar juntos haviam eventos e clubes que só tinham música eletrônica quando eles bookavam um DJ internacional. Em termos de produtores também houve um grande avanço. No momento há muitas pessoas fazendo música e abrindo gravadoras. Precisou de um pouco mais de tempo para continuar crescendo nesta direção, mas as primeiras pedras já foram colocadas.

Aproveitando vamos falar sobre Flashmob e Late Night Music, movimentos que levaram grandes nomes ao seu país como Seth Troxler, Radio Slave, Benoit & Sergio, Dixon, Soul Clap, Nicholas Jaar. Vocês poderiam nos contar o que são esses projetos e os objetivos de ambos e o que os difere?

Quando começamos a fazer festas por conta própria, em 2010, o padrão para um evento era: você contratava um DJ internacional ou ninguém iria. No início seguimos esse caminho, mas também queríamos fazê-lo de maneira diferente e iniciamos o Flashmob Music Movement como uma alternativa. Para nós a multidão desempenha um papel muito importante em uma noite; portanto, damos a eles tarefas ou presentes que os ajudariam a interagir. Toda a experiência foi mais importante do que apenas trazer um nome ao Panamá.

Havia também um CD na entrada com mixes de talentos locais para os primeiros participantes. Alguns desses CDs acabaram tocando em outras cidades ou lugares incomuns como táxis, o que de alguma forma ajudou a propagar o som em lugares que nunca teríamos imaginado antes. Late Night Music é uma história diferente, focamos em promover uma noite com artistas locais todas as semanas. Isso era algo novo na época em 2011. Conseguimos fazer festas toda sexta-feira primeiro e depois toda quinta-feira com talentos locais por quase cinco anos, sem parar. Nessa época, já tínhamos vendido nosso local anterior, Teatro Amador e Late Night Music, com nosso parceiro Gio Vellojin, evoluindo para uma marca que produzia festas em todo o país e nos locais mais exclusivos até os dias de hoje. Festas de barco, festivais boutique, showcases na ilha de NYE e assim por diante.

Seu próximo lançamento acontecerá no dia 26 de julho em seu próprio selo. o EP Why Do You Worry é composto por duas faixas com uma atmosfera profunda e percussão proeminente. Uma também apresenta os vocais suaves e marcantes de Jackie Plummer. Conte-nos sobre o processo criativo das faixas e o encontro com o artista?

Essa colaboração é um projeto bonito e especial para nós. Temos no Panamá um clube chamado Silo em parceria com Selina. Assim, a parte de trás do clube se conecta a um restaurante / bar onde costumavam convidar artistas para se apresentarem durante a semana. Uma noite, Jackie estava tocando no Selina Casco Viejo e nos impressionou com sua voz. Assim que voltamos a Berlim enviamos um esboço com algumas ideias e ela gravou os vocais com suas próprias letras com a ajuda de nosso bom amigo Kike, de Kimao, na Cidade do Panamá. Depois, levamos poucos dias para juntar tudo, porque o que ela fez foi incrível. Estamos super felizes e animados com este!

A ideia de ter o próprio selo possibilita os artistas a lançarem mais livremente. Foi assim para vocês quando lançaram a Cacao Records? Como funciona essa curadoria? O que vocês buscam? Essa presença de sonoridades étnicas é um dos pontos ou isso não é uma regra? 

O projeto evoluiu ao longo dos anos, mas de maneira bastante orgânica. No começo começamos como uma plataforma da América Central com sede em Berlim com nosso irmão Gonzo-Gonzo da Guatemala. Estávamos focados em lançar músicas para a pista de dança. E também poder fazê-lo à nossa maneira e termos como parte de nossa expressão artística.

Atualmente, a gravadora continua próxima da ideia original, mas também procura abraçar uma ampla gama de conceitos e ideias. Gostamos de ter este espaço onde podemos colaborar com artistas que amamos e admiramos. Os sons étnicos que podemos dizer são consequentes da nossa identidade como negros caribenhos do Panamá, mas também temos uma boa dose de Disco e House Music saindo na gravadora também. Queremos estar abertos para encontrar “Cacau in Exotic Places” (Cacau em lugares exóticos).

Como vocês equalizam a relação enquanto família e trabalho?  Afinal, relações são sempre desafiadoras, ainda mais quando o convívio é intenso. Como é o workflow entre irmãos, vocês se dividem em funções ou rola mais intuitivamente?

É bastante desafiador, como você diz. Mas deve-se manter os lados bons disso. Mesmo morando no outro lado do mundo temos sorte de ver nossos pais, familiares e amigos várias vezes durante o ano. Também em casa tentamos nos concentrar e aproveitar ao máximo cada momento. E quanto ao trabalho entre nós, distribuímos papeis tentando ser o mais eficazes possível. Um sistema que leva de A a B não necessariamente o leva de B a C.

Bom, não podemos fugir do que tem acontecido ao nosso redor. Esse reboot mental que vivemos está trazendo reflexões a todos nós. Como tem sido esse momento para vocês enquanto artistas acostumados com agendas intensas? Alguma lição aprendida até aqui?

Sim, claro. Como a maioria das pessoas, passamos pelo processo de medo e estresse por não sabermos o que virá a seguir por um período tão longo. Mas conseguimos aproveitar esta oportunidade para redefinir a energia, aprender novas habilidades e fazer o máximo de música possível. Podemos concluir que nos sentimos em paz com a situação.

Vocês seguiram ativos lançando seus projetos em 2020, como por exemplo Guadeloupe, Mama Negra, Missing Point e agora Why Do You Worry. Existem planos futuros já traçados, como vocês têm aproveitado esse isolamento?

Sim, na verdade muitas novas músicas. Estamos terminando um EP de colaboração com a incrível Cee ElAssaad. Também um remix para Satoshi Fumi lançado na Unknown Season, um remix para o lendário Kerri Chandler no King Street Sound e alguns outros originais que ainda não têm um lugar a ser lançado.

Para finalizar, uma pergunta pessoal. O que a música representa em sua vida? 

Neste ponto de nossas vidas isso representa tudo para nós. Nos deu tudo o que temos e é o nosso futuro. Ela nos une a todos.

A música conecta.

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