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A música conecta

Vintage Culture é um movimento

Por Isabela Junqueira em Storytelling 26.09.2025

O sucesso costuma ser visto como algo distante, inalcançável… por vezes até como uma recompensa que chega de forma abrupta. Mas, na essência, ele é um movimento silencioso — uma construção diária de jornadas íntimas e que podem ser invisíveis aos olhos de quem observa de fora. Nesse caminho, o sucesso não é tratado como uma espécie de pódio a ser conquistado, mas a continuidade de ações que permanecem: uma soma de detalhes, de pequenas vitórias e de sonhos alimentados com amor. Porque, no fundo, toda verdadeira conquista nasce de uma vontade sincera de criar algo que seja maior que si mesmo; e aí somente intenções genuínas são capazes de dar sustentação ao longo dessa rota que, pode ser (e na maioria das vezes é) bastante sinuosa. Quando se analisa artistas que transcendem o próprio som e moldam uma cena de forma definitiva, especialmente no espectro da música eletrônica, são poucos os nomes que despertam tanta atenção quanto Vintage Culture.

O caminho percorrido pelo DJ, produtor e empresário não foi otimizado apenas por faixas que dominaram e dominam playlists, pistas, trends e até as rádios — ele representa uma construção intencional de um ecossistema completo, que nasce a partir de uma teia de conexões consolidadas pelo despertar do sentimento de pertencimento e no estabelecimento de uma narrativa de alguém que, mesmo em constante ascensão, parece estar sempre de olho no que vem a seguir. Desde os primeiros passos como um garoto do interior que se posicionou no coração da cena nacional, Lukas Ruiz desenvolveu uma ligação visceral com a sua própria arte, seus ouvintes e fãs, o que gerou uma fidelidade que desafia a lógica efêmera do sucesso imediato na sociedade dos algoritmos. Mas o quê, de verdade, faz dessa história uma referência tão impactante? Aliás, como um artista que transita com naturalidade entre o influente e o acessível consegue moldar sua própria trajetória, de forma que ela ressoa muito além da própria música?

No centro dessa peripécia está um produtor que compreendeu cedo o valor de transformar sua música em um convite ao pertencimento. Essa conexão também se revela como uma estratégia pontual na fidelização de uma base robusta e aventureira, que se mostra sempre ávida por novas experiências musicais e um contato mais próximo com o artista. Inclusive é válido lembrar que essa dinâmica não demorou para engrenar. Os primeiros remixes e originais significativos, como Another Brick In The Wall e Everyday, de 2013 e 2014, respectivamente, antecipavam o caráter musical de Lukas Ruiz já como Vintage Culture. Com faixas que misturavam vocais marcantes e deep house já constituindo parte desse alicerce, nos primórdios ele já deu corpo a assinatura que abriu os seus caminhos. Neste período já era nítido que o projeto tinha uma personalidade forte, marcada pela capacidade de transitar entre ritmos do underground e/ou mainstream, sem perder a característica central que integra suas particularidades.

Após esse período de estabelecimento musical entre 2013 e 2014, Lukas deu passos decisivos em 2015 ao ampliar sua atuação para além do estúdio e pistas. A entrada como sócio do Só Track Boa naquele ano foi de fato um marco: não mais apenas produtor, foi ali que ele se tornou um agente ativo, interessado em fortalecer a cena e criar uma plataforma de conexão direta com o público. Foi igualmente neste período que sua relação com os fãs ganhou profundidade já que o STB se tornou o palco perfeito para convertê-lo de artista para símbolo, abrindo também a brecha para que ele se transformasse em um novo articulador de experiências. Essa movimentação consolidou sua presença e abriu as portas para o diálogo mais íntimo que viria a ser o alicerce do seu trabalho — é exatamente neste cenário que o público deixou de ser apenas audiência e passou a fazer parte do próprio movimento criado por ele, para ele e junto dele, adquirindo de fato o caráter de comunidade.

O estrelato nacional, especialmente entre 2017 e 2018, foi especialmente impulsionado por I Will Find — faixa símbolo dessa virada que se tornou um fenômeno absoluto no verão e refletiu a capacidade do produtor de unir diferentes universos musicais. Alguns anos depois e frente a uma pandemia longeva, o ritmo de lançamentos musicais que já era acentuado, se intensificou ainda mais. O próprio Lukas conta em sua segunda participação no Flow Podcast que foi justamente neste período que seus sons começaram a ganhar notoriedade concisa no exterior. Estes grandes acertos ampliaram seu prestígio e abriram portas para colaborações com produtores como Tiësto, e também para apresentar releituras de outros grandes nomes como Moby — movimentos que validaram ainda mais sua posição no exterior.

Com relações próximas a outros ícones do universo eletrônico e pop, incluindo Jorja Smith, é imprescindível destacar que seu trabalho com cantores e compositores aos poucos se transformou em uma peça-chave na sua evolução, permitindo que as suas produções refletissem uma narrativa mais completa. Grandes sucessos como Weak (trilha sonora do EAFC 25) e Slow Down, a título de exemplo, compartilham vocais de Maverick Sabre, reforçando o potencial dessas parcerias ao elevar a qualidade e o impacto das suas faixas. Essas colaborações estratégicas evidenciaram o olhar atento para o conteúdo e a preferência por artistas que trazem além de talento, uma alma compartilhada.

A pandemia trouxe essa transformação profunda na carreira de Vintage Culture e o retorno antecipado das festas na América do Norte e Europa também ajudaram a despontar sua presença no cenário internacional, conduzindo o artista a se consolidar de vez no panorama global. E o mais curioso é que mesmo alçando voos cada vez mais altos e adentrando nos principais circuitos da música eletrônica no mundo inteiro, Lukas nunca deixou de valorizar sua base local. Pelo contrário: sempre que retorna, o faz com novidades, reforçando sua conexão originária enquanto mantém a ambição de crescer. E foi justamente essa expansão que abriu um leque de possibilidades para projetos mais ousados, internacionalmente sim, mas principalmente nacionalmente…

O fortalecimento e constante ampliação do Só Track Boa — uma plataforma que virou símbolo de resistência e inovação —; além de outras iniciativas que também retornam à cena, como o compartilhamento de espaço com uma boa leva de brasileiros em sua residência em Ibiza, aprofundaram esse caráter. Sem contar a série de festivais em cinco capitais com o Vintage Is a Festival que misturou música, arte e inovação (e que inclusive reuniu cerca de 20 mil pessoas na edição de São Paulo); e o mais recente DNA ART CAR, uma festa itinerante que busca ampliar o conceito de movimento e liberdade.

A mais recente prova dessa inquietação criativa é a Affairs, gravadora lançada oficialmente por Lukas neste mês de setembro como um espaço que vai além de um selo musical: uma plataforma que une som, moda e estilo de vida. Estreando com Upon Your Skin, a label nasce como ponto de encontro entre sua visão global e suas raízes brasileiras, abrindo terreno para novas colaborações, descobertas de talentos e a consolidação de um movimento cultural que reflete sua identidade artística.

Essa energia incansável, aliada à coragem de experimentar e inovar, fazem de Vintage um artista que nunca para e que está sempre propondo alguma novidade. Seus projetos — estratégicos e muitas vezes em ritmo frenético — reforçam essa ideia de movimento contínuo onde o artista se coloca como protagonista de uma jornada de evolução perene; ao mesmo tempo em que nutre uma percepção de que ele é alguém que vive e respira música: sempre buscando o próximo passo, o próximo sucesso, o próximo relacionamento ou projeto musical de impacto.

A essência que move Lukas vai além dos palcos, hits e holofotes… a inserção de detalhes estritamente pessoais (como por exemplo a recusa de um comportamento milimetricamente calculado na sua imagem e até seus próprios cães), representam a sua conexão com o cotidiano e uma busca inquietante por autenticidade — e que no final das contas serve como um lembrete de que, por trás do criador incessante, existe um lado humano que ele nunca escondeu. Outro ponto que se destaca na sua natureza é a capacidade de ser uma presença acessível, mas que ao mesmo tempo possui uma influência direta e notável sobre a cena, redirecionando até o modo como muitos DJs passaram a se portar e a criar suas próprias identidades profissionais. Vintage representa a figura de um artista que, embora consolidado no mainstream, transita nele preservando sua individualidade. A história do menino do interior que conquistou o mundo traz um senso de identificação forte com artistas e fãs que veem nele um exemplo de que é possível chegar lá sem perder a personalidade — algo crucial para a fidelização de uma audiência que se vê representada nesse universo.

De colaborações com figuras renomadas até projetos independentes, Vintage tem se mostrado um artista que compreende o valor da conexão vertical — com seu público, projetos inovadores, outros nomes da cena, marcas… ao longo dos anos, o ritmo de Lukas nunca desacelerou. Cada evento, projetos, lançamentos e performances se acumulam numa velocidade quase impossível de acompanhar, uma estratégia que reflete seu compromisso com a inovação contínua e evidencia a recusa de fórmulas prontas que a indústria do entretenimento tenta empurrar em outros DJs. Seus passos reforçam a imagem de um artista que não aceita limites, que busca constantemente expandir os horizontes do próprio universo, surpreendendo seu público com propostas ousadas; desde festivais em que ele é o único headliner até experiências que vem ampliando a presença da música eletrônica para camadas de público originalmente distantes dela.

Indo além de suas ações profissionais, Lukas consolidou uma persona acessível para sua base de fãs, construída na simplicidade de suas origens e na honestidade do seu discurso. Sua narrativa de ascensão revela que autenticidade e perseverança ainda são características perenes em quem almeja o sucesso — independente do significado individual que a palavra carrega. O que diferencia Lukas, de fato, é sua busca incessante por legado, por deixar marcas que resistem ao tempo. Seu álbum de estreia, Promise Land, lançado em maio de 2024, simbolizou um amadurecimento, mas também é um bom retrato de um artista que quer mais do que fama efêmera — quer construir algo de valor, feito de disciplina, amor pelo que faz e um profundo respeito por sua própria identidade.

No final das contas, a força de Lukas reside na sua capacidade de viver intensamente cada fase, e porquê não de transformar a própria rotina em um estilo de vida? Sua história mostra que o verdadeiro sucesso nasce de um propósito genuíno, de uma conexão que não se prende em cifras ou em reconhecimento instantâneo, mas que floresce na autenticidade e no amor intenso por uma arte que nasce do coração. Assim, ele mostra que é possível caminhar por um longo percurso sem abrir mão da alma — porque o maior movimento, afinal, é aquele que nasce de dentro, e não de fora.

A música conecta.

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