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A música conecta

Música Periférica Popular Brasileira: como Kenan e Kel estão impulsionando a cena

Por Elena Beatriz em Trend 19.05.2025

Durante muito tempo, a ideia de música eletrônica no Brasil foi condicionada por referências externas. Mas enquanto se olhava para fora, uma outra cena já se organizava internamente, mesmo que, para alguns, ela não siga a cartilha daquilo que é “convencional”. Não podemos ignorar o fato de que estamos diante de um país continental — mais de 212 milhões de habitantes, 27 unidades federativas e uma pluralidade cultural imensa. 

O que queremos dizer com isso — e é fundamental lembrar — é que estamos falando de diversidade. Neste sentido, não cabe a ninguém tentar invalidar uma cultura ou uma forma de expressão só porque ela não faz parte de uma realidade individual. A arte produzida aqui carrega saberes, estéticas e contextos históricos com inúmeros recortes, que merecem ser compreendidos em sua complexidade e legitimidade.

A Música Popular Periférica Brasileira, por exemplo, é fruto de um modo de produção singular e uma potência criativa que não apenas reflete realidades diversas, mas também aponta para o futuro da música brasileira em escala global. Nesse horizonte, a dupla Kenan e Kel, que utilizou o termo MPPB para nomear seu estilo — uma fusão entre Funk, Hip Hop e Música Eletrônica — se destaca como uma das forças mais criativas da DJ culture. 

Eles são responsáveis por abrir portas para novos públicos, referências e descentralizar a ideia de underground, que costuma ser associada à uma estética europeia ou americana. Kenan e Kel estão na linha de frente do reconhecimento técnico e estético de gêneros marginalizados, sendo um dos grandes responsáveis desse movimento que está conectando a cena brasileira à movimentos internacionais. Nos sets e produções da dupla se inserem vocais, pancadão, noise, glitch, breaks, coreografias… enquanto o discurso institucional ainda insiste em certos códigos de sobriedade, Kenan & Kel partem de outras referências. Estão interessados em narrar novas possibilidades de pista: mais caóticas, mais híbridas — e mais nossas.

Esse processo não é isolado. Kenan & Kel estão em rede com artistas como Mu540, Clementaum, Maffalda, Larinhx, Badsista, entre outros que têm articulado a ideia de música eletrônica brasileira para além do filtro do gosto atrelado às referências do exterior. Não é mais uma questão de “ser aceito lá fora”. Na verdade, isso já vem acontecendo e com muita força. Trata-se de questionar o quanto algumas camadas da nossa cena ainda operam sob um filtro limitado, que ignora a relevância do que está fora do próprio radar.

Com milhares de ouvintes e seguidores, uma apresentação registrada no Boiler Room, além de passagens por diversos países como França, Itália e Espanha, a dupla insere a MPPB em um circuito internacional sem abrir mão de suas raízes. Pelo contrário: é justamente por manterem suas raízes vivas que conseguem gerar impacto. Eles não se adaptam ao que o mercado espera ouvir; abrem caminho ao que antes não tinha possibilidade de escuta.

A recente inclusão do Funk Brasileiro como categoria oficial no Beatport e o sucesso global de gêneros como o Amapiano, por exemplo, são indicativos claros de que as estruturas globais começam — ainda que tardiamente — a reconhecer o valor de sonoridades que nasceram longe dos grandes centros e foram por muito tempo ignoradas. Mas é importante lembrar que isso aconteceu pela persistência do público, da comunidade e, principalmente, de artistas como Kenan e Kel, que são contundentes sobre suas próprias narrativas e não apagam suas referências para se adaptarem. Um movimento que ou se ama, ou se resiste. Mas, sem sombra de dúvidas, não se ignora.

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