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A música conecta

Alataj entrevista Kureb

Por Alan Medeiros em Entrevistas 13.03.2019

Se há algo que impressiona na nova safra de DJs oriundos do estado de Minas Gerais é o caráter old school que todos eles possuem em cima do palco e frente ao público. Técnica apurada, repertório fora dos padrões e postura profissional são características que constantemente podemos observar nos artistas que formam essa nova geração mineira dos decks.

Cléber Kureb Horta ou apenas Kureb não é exatamente um jovem, já que o hábito de pesquisar, salvar e discotecar música está presente em sua vida há mais de uma década. Entretanto, foi há poucos meses que seu trabalho apareceu no nosso radar e, desde então, cada nova oportunidade que temos de observá-lo resulta em uma ótima experiência. A última delas, no Xama 2019, em Algodões/BA, foi certamente uma das key performances da temporada e o fator propulsivo para recebê-lo por aqui.

Na ocasião, Cléber mostrou seu arsenal de possibilidades obscuras e até certo ponto freak em um festival marcado pela alegria e vibração de ritmos como disco e house music. Surpreendente? Sim, mas longe de estar fora de contexto. Logo após as nossas férias baianas, o convidamos para responder a entrevista que acompanha um mix exclusivo logo abaixo. Aumente o volume e sinta a vibração deste poderoso digger de Juiz de Fora:

Alataj: Olá, Cléber! Tudo bem? Obrigado por falar conosco. Quais acontecimentos foram decisivos para que sua pesquisa musical tomasse o caminho que ela possui hoje?

Kureb: Olá amigos do Alataj! Bom, sempre trabalhei em áreas criativas e tive desde os tempos da faculdade um enorme fascínio por descobrir coisas novas. A minha pesquisa musical evoluiu das discussões e conversas que eram comuns com as pessoas que convivo e mantenho contato; a maioria nem sempre do mundo das “pistas”, e isso expandiu muito a minha visão sobre como a música eletrônica é e foi feita ao longo do tempo.

Você é baseado em Juiz de Fora, uma cidade com boas iniciativas na música eletrônica, mas que não pode ser considerada um polo nacional para o estilo. Pensando na sua carreira, quais são os prós e contras de estar residindo aí?

Morar em Juiz de Fora é interessante. Aqui é um retrato menor do caos político-urbano que passam as grandes cidades do país, com uma diferença que eu considero positiva: a escala influencia diretamente na troca de experiências entre os vários núcleos criativos da cidade. Temos bandas, artistas e produtores audiovisuais, e diversos polos que exportam filmes, música, moda e conhecimento pra todo país. Em contrapartida, vejo uma dificuldade muito grande do poder público, da Universidade e dos empresários em transformar todo o potencial criativo da nossa urbe para criar movimentos consistentes ao redor de um cenário que pudesse atrair mais pessoas dos grandes centros. Temos uma universidade pública enorme e várias outras que a orbitam na vocação local para o ensino, e claro, estamos geograficamente perto das maiores capitais do país. Potencial não falta.

Confesso que seu set na última das três grandes festas do Xama me surpreendeu bastante, principalmente por conta da construção hipnótica. Qual ideia/sentimento você buscou transmitir com aquele mix?

Olha, eu comecei aquele set com uma missão complicada. Era uma noite repleta de expectativas, a começar pelo nome: “Encerrando em Xamas”. A responsabilidade enorme de abrir para dois grandes DJs que tenho uma enorme admiração: Cashu e Márcio Vermelho. A minha ideia, desde o começo, era fazer uma abertura singela e sem muito peso, mas que ainda tivesse a minha identidade. Gosto muito de fazer warm ups e tocar com o BPM mais baixo, entre 90 e 110 BPM, onde posso flertar com texturas e sons mais espessos sem uma expectativa muito cristalizada de quem está ali se “aquecendo” para a noite. À medida que as pessoas foram chegando, eu fui ajustando a dinâmica para dar fluxo ao movimento de uma noite que foi se tornando memorável, tanto em diversidade de sonoridades, quanto na resposta do público.

Cada DJ possui um perfil artístico diferente. Alguns se destacam por uma pesquisa contemporânea, outros pelos clássicos. Há também aqueles que discotecam 100% em vinil ou ainda os que buscam misturar diversos movimentos musicais em seus sets. Como tem sido sua busca em relação a construção desse perfil sonoro que é tão importante a longo prazo?

Eu adoro misturar digital e analógico, mas acho importante que haja conexão entre o que se toca. Como eu tenho muita facilidade pra me perder no meio dos gigabytes, tento ao máximo evitar os excessos… Gosto de ter os discos que considero importantes, de vários gêneros, não só pela música em si, mas pelas capas ou impacto que tiveram na época que eu ouvi, ou ainda, associado a algo que acontecia na época em que foram lançados. Para mim, cada disco tem uma história e é muito bom poder sentir parte dela toda vez que tiro alguns deles da prateleira.

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Como DJ e produtor ativo há mais de uma década, certamente você possui uma visão privilegiada sobre o crescimento da dance music em Minas Gerais nos últimos anos. Pra você, como foi analisar o movimento que tirou house/techno do profundo underground e o colocou a disposição de milhares de pessoas em eventos com nomes como Bufiman, Helena Hauff e Dekmantel Soundsystem?

Olha, a cena eletrônica underground de MG hoje é específica de BH e da enorme capacidade de realização que os novos coletivos possuem, motivados por uma energia criativa efervescente e por um cenário composto de pessoas com vários backgrounds, que trazem a sua simplicidade e essência pra dentro da cena. Inclusivos, carinhosos e curiosos, eles acabam se tornando um “must go” na agenda de qualquer DJ que gosta de emoção e loucura. Tudo isso ajuda a compor o cenário de uma capital com décadas de cena alternativa e que se mantém renovando sempre com novos agentes, e junto disso, novas visões de cena e de mundo. Um lugar de onde sempre se sai com uma sensação boa de ter aprendido algo novo.

Como você avalia o atual momento da eletrônica nacional enquanto business? Estamos nos aproximando de uma cena mais sustentável ou ainda há muito a ser feito?

Hoje as coisas estão muito mais equilibradas do que anos atrás, temos ótimos DJs, uma nova geração super conectada e inventiva, mas os eventos ainda são muito limitados pela situação econômica e burocrática do país, que tira dos produtores a capacidade de investir em formatos maiores ou ainda, que tem custos em moeda estrangeira. Ainda há muito a ser feito, e o importante é valorizar o caminho e melhorar sempre.

7 – Para finalizar, uma pergunta pessoal. O que a música representa em sua vida?

Música é minha vida. Minha inspiração no trabalho e na relação com as pessoas. Ela faz meu cotidiano menos caótico e suportável.

A música conecta.

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