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A música conecta

Uma reflexão sobre o papel da imprensa na música eletrônica alternativa

Por Isabela Junqueira em Editorial 15.07.2022

Você já parou para refletir sobre a função social do jornalismo? Ou melhor, e ainda mais específico: você já parou para analisar o papel da imprensa na música eletrônica alternativa? Independentemente da resposta, te convidamos para uma análise que vai buscar passar bem longe do auto-jabá, mas tentará entender afinal de contas: de que forma podemos colaborar para o avanço e estabelecimento do que chamamos de cena?

Acima, biografia de Sonia Abreu, a primeira DJ do Brasil, escrita pela jornalista, pesquisadora musical e também DJ Claudia Assef

E claro, antes de qualquer maior contextualização, vamos à uma contextualização histórica sobre o jornalismo? A invenção de Johannes Gutenberg, em 1447, é considerada o “marco zero” da função que posteriormente seria batizada de jornalismo. O alemão inventou uma prensa que permitiu popularização da impressão em massa de materiais escritos — que antes eram escritos à mão. Essa foi considerada a primeira grande revolução da comunicação.

A primeira publicação periódica aconteceu na Europa Ocidental em meados do século XVII. Os primeiros jornais concentravam suas coberturas em fatos negativos ocorridos, sendo que os assuntos locais passaram a ser mais abordados na primeira metade do mesmo século, mas a censura era uma prática comum já que a insatisfação popular e suas possíveis revoltas eram evitadas pelo governo. Em 1920, a invenção do rádio impulsionou latentemente o jornalismo, o que voltou a acontecer a partir de 1940, com o surgimento da televisão.

O jornalismo se desenvolveu globalmente, mas com caraterísticas de acordo com a cultura que permeia sua prática em cada localidade, mas alguns fundamentos são horizontais. A principal função de um jornalista é atuar como um mediador entre a sociedade e os acontecimentos relevantes para o conhecimento público. Entre alguns dos valores do jornalismo, estão a liberdade, a objetividade e a credibilidade. E caso você esteja se perguntando sobre a isenção, como jornalista formada te garanto: a isenção jornalística é uma fábula — e não é possível que ela seja praticada, seja em uma notícia ou um editorial, como esse.

Eu poderia me estender sobre a função do jornalismo, mas ainda temos alguns assuntos pertinentes e tal qual a importância da função social do jornalismo, é a sua função na cultura. Em síntese, o jornalismo cultural é fundamental para a difusão desses produtos. Afinal, não adianta a produção de algo, se possíveis consumidores não souberem dele. A reverberação da cultura é não só fundamental para que ela seja entregue aos consumidores, mas para que aconteça a sua manutenção.

Entrevista de Camilo Rocha, jornalista, DJ e pesquisador musical sobre sua trajetória na música eletrônica nacional

Além claro, da divulgação, existe também uma preocupação com a documentação. É através do jornalismo que acontecimentos e agentes importantes, bem como suas atuações, podem ficar documentadas. Por exemplo, se a invenção dos sintetizadores não fosse divulgada e documentada, o seu avanço e desenvolvimento certamente seriam prejudicados. A documentação também evita erros e apropriações históricas, principalmente aos pioneiros de cada assunto.

E se você está se questionando se isso soa distante da música eletrônica, é importante reforçar que não. Na verdade, para esferas que são muito nichadas, como é o caso da música eletrônica, a necessidade de mão de obra especializada e que entenda de fato o nicho é ainda maior. Eu não sei vocês, mas eu já cansei de ver a mídia tradicional patinando ao abordar diversos aspectos inerentes à música eletrônica alternativa — o que certamente não aconteceria se o jornalista fosse especializado. E esses são só alguns exemplos que reforçam a importância do jornalismo nos mais diversos âmbitos da sociedade.

Alan Medeiros e Larissa Zimmermann, sócios do Alataj, selecionam e dissertam sobre faixas que ajudam a entender o boom do Deep House em 2013

A especialização gera também um fator muito importante: a responsabilidade necessária para documentar e reverberar histórias. Claro, incontáveis nichos geram histórias para serem contadas, mas já parou para imaginar que se hoje temos a referência necessária para entender o que funciona e o que não, o que é válido e o que não, é porque lá atrás, alguém estava documentando isso e ajudando a solidificar o que hoje é uma enorme potência que chamamos de cena. Inclusive, Claudia Assef, Camilo Rocha e Erika Palomino são alguns jornalistas que foram fundamentais no desenvolvimento do jornalismo na música eletrônica alternativa — o que certamente renderia outro editorial.

Além das histórias que precisam ser contadas, existem também debates que precisam ser estabelecidos — mais uma responsabilidade do jornalismo. Equilibrar esse debate a partir de opiniões contrastantes e sempre com a veia da boa apuração de informações é uma prática que é inerente ao exercício do jornalismo. Essa prática de levantar questionamentos e propor debates é necessária para o avanço a partir de discussões que interferem diretamente na evolução de qualquer aspecto que seja.

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E aí vai mais uma verdade que precisa ser dita: o jornalismo nem sempre vai agradar. Inclusive, existe uma frase bem popular de autor desconhecido que afirma: “jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. Todo o resto é publicidade”. E não deixa de ser verdade. É claro que a função está sujeita ao erro e inclusive à contradições históricas, mas ainda é muito necessária para a garantia que a sociedade saiba fatos de seu interesse, por mais desagradáveis que sejam.

Através de erros e acertos, o jornalismo é mais uma ferramenta aliada para o avanço e evolução da cultura da música eletrônica. A cena nacional é fruto de uma diversidade gigantesca que continua se reinventando cotidianamente e movendo-se a todo instante. O jornalismo especializado é uma forma de cobrir esse legado, sua marca de existência, registrando a cultura e perpetuando ela seja entre amantes ou pelas novas gerações. Ao longo da matéria, selecionamos uma série de indicações de conteúdos jornalísticos (autorais ou não) sobre a cena eletrônica alternativa nacional.

DJ Marky em entrevista para o programa Todo Mundo É DJ, de Claudia Assef

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