A história do D-EDGE não começa com uma multidão dançando — começa com uma ideia que foi totalmente contra o fluxo normal das coisas. No ano 2000, quando a música eletrônica brasileira ainda buscava por espaços fora do eixo Rio-São Paulo, um jovem DJ e empresário chamado Renato Ratier, movido por sua visão inovadora, teve a ousadia de erguer um club disruptivo no coração do país, em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul. Plantar no deserto: é assim que o próprio Ratier define aquele primeiro passo. E não é exagero.
Nascido longe das grandes capitais, o D-EDGE nunca foi apenas mais uma casa noturna. Foi resistência. Isso porque estava numa cidade dominada por outros ritmos, mas que tinha o intuito de trazer a música eletrônica para o centro da conversa. Essa primeira sede durou cinco anos, até dar lugar a um hospital. Mas até ali, já deixava claro que não se tratava de uma “balada”: era um espaço cultural diferente de praticamente tudo o que existia, arquitetado para provocar. E isso não mudou.
Em 2003, o D-EDGE desembarcou na Barra Funda, em São Paulo, uma região industrial que, com o tempo, se transformou num polo de vida noturna, em grande parte também por causa dele. O club carregava consigo não só a alma de sua versão original, mas uma ambição artística que redesenharia os contornos da noite paulistana. Luzes que não piscavam aleatoriamente, mas sim em sincronia com o som. Paredes revestidas com LED quando isso ainda era tecnologia inalcançável no país. Um som Funktion One que preenchia o corpo antes mesmo de chegar aos ouvidos. Tudo projetado com precisão quase científica por Muti Randolph.
Manter um club por mais de duas décadas no Brasil é um feito e tanto. Fazer isso com relevância até hoje, sendo sinônimo de inovação e curadoria, é histórico. Nessa trajetória, o D-EDGE foi porta de entrada para artistas como Solomun, Jamie Jones e tantos outros que ainda estão entre a elite da cena eletrônica. Foi incubadora de carreiras nacionais e bastidor de encontros inesquecíveis — e não apenas entre artistas e público, mas entre pessoas comuns que viraram casais, amigos… e na cabine, foram mais de 30 mil artistas que passaram por lá. De Richie Hawtin a Miss Kittin, de Jeff Mills a Villalobos, das madrugadas da Nave às manhãs do Superafter.

Mas o D-EDGE não parou na pista. Expandiu-se como selo, como escola, como agência, como filosofia. Criou a DJ College, a D-Agency, os selos D-Edge Records, D-Edge Black e OLGA. E recentemente, escreveu um novo capítulo no Rio de Janeiro com o CCD — Centro Cultural D-EDGE — uma obra que ultrapassa o conceito de club e se posiciona como um verdadeiro complexo artístico, com galeria, restaurante, loja, terraço e múltiplas pistas em um prédio de cinco andares na zona portuária da cidade.
Num cenário em que festivais se expandem com a força de algoritmos, marcas e interesses comerciais, o D-EDGE segue sendo um espaço de proximidade e impacto real. Onde o artista está a poucos metros, o som chega com nitidez milimétrica e a pista se torna uma experiência compartilhada. É verdade que o número de clubs vem diminuindo no Brasil e no mundo. Mas talvez o segredo do D-EDGE seja justamente esse: nunca ser ‘só’ um club. É um espaço de vanguarda, de troca, de persistência criativa. Uma cápsula do tempo que nunca parou de se atualizar.
E agora, em 2025, era preciso uma festa à altura de toda essa história. A comemoração dos 25 anos acontecerá nesta quinta-feira, 17, no Komplexo Tempo. Nomes como a lenda do house Armand Van Helden, o melódico Sébastien Léger, Gui Boratto, ícone brasileiro que sempre esteve conectado com a história do club, e o próprio Ratier, dividem espaço com Bora Uzer, Facundo Mohrr e Moblack, que trazem o melhor das pistas globais para o território brasileiro, além, é claro, de um time de brasileiros composto por mais de 20 nomes.
Portanto, a celebração não é apenas pelos anos que passaram, mas por toda a coragem de continuar seguindo em frente, explorando e atravessando momentos delicados da indústria. Fica claro também que o que move Renato Ratier, no fim das contas, não é apenas a música, mas o desejo incansável de continuar fazendo história — e de sempre convidar o público para dançar junto com ele.
